Ataques a escolas: por que as violências se repetem?

Especialistas falam sobre fenômenos e tendências que podem motivar atos violentos em instituições de ensino

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Fachada Colégio Estadual Helena Kolody, em Cambé, no Paraná
Fachada do Colégio Estadual Professora Helena Kolody, em Cambé, no Paraná, onde ocorreu mais um ataque trágico que levou à morte de dois alunos
Buscador de educadores parentais
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Cada vez que um novo ataque trágico ocorre em uma escola, surge a pergunta: por que será que esses atos violentos têm se repetido tanto? Embora os agressores tenham por trás uma história e perfil específicos, especialistas afirmam que fatores sociais e culturais existentes na sociedade brasileira podem ter relação com o aumento desse tipo de ocorrência no país.

Cinco estudiosos entrevistados pelo Estadão comentam sobre fenômenos e tendências que podem funcionar como potencializadores dos ataques nas escolas, como os ocorridos este ano em São Paulo e Blumenau (SC). A reportagem publicada em abril também traz sugestões do que a sociedade pode fazer para reduzir os riscos e diminuir a chance de novas tragédias.

1. Aumento da intolerância e da ‘cultura da violência’

O cenário social e político brasileiro, com o crescimento da intolerância e polarização, serve de incentivo para atos violentos de todos os tipos, em especial para pessoas que tenham algum histórico ou predisposição a esse tipo de conduta, segundo especialistas ouvidos pela reportagem. Esses reconhecem que, embora o País tenha historicamente altos índices de violência e ataques contra minorias, os últimos anos foram marcados por um movimento crescente, visto principalmente na política, de polarização, intolerância e extremismo.

Segundo o psiquiatra Daniel Martins de Barros, colunista do Estadão, o Brasil tem os maiores índices de violência no trânsito, contra mulheres, minorias e pessoas trans e vivemos uma cultura beligerante, de hostilidade e extermínio do inimigo que alimenta ainda mais violência.

Para Thiago Fernando da Silva, psiquiatra forense do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (IPq-HC) da USP, houve uma piora do cenário nos últimos anos devido a um número maior de discursos de intolerância, menos espaço para resolução de conflitos de forma amistosa e incentivo a políticas públicas de maior acesso a armas. Ele explicou que essa era uma cultura associada aos Estados Unidos, que passou a estar presente também no Brasil, criando um impacto muito grande em indivíduos vulneráveis que, por diversos motivos, têm um funcionamento mental mais frágil na questão da influência.

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2. Crescimento de grupos de ódio na internet

O avanço da intolerância e da polarização e a ampliação do acesso a ferramentas tecnológicas, até mesmo por parte de crianças e adolescentes, favoreceram grupos extremistas que se articulam sobretudo pelas redes sociais e ganham potência e escala graças a esse alcance dado pela internet. A pesquisadora Michele Prado, do grupo Monitor do Debate Político no Meio Digital da Universidade de São Paulo (USP) disse que o extremismo veio para o mainstream devido à normalização dos discursos nocivos, o que levou mais pessoas para o extremo. E o isolamento imposto pela pandemia da covid-19 fez com que as pessoas, principalmente, crianças e adolescentes se voltassem mais para as interações sociais virtuais, ficando portanto mais expostas a esses conteúdos extremistas. Silva complementa que como os jovens ainda não completaram seu desenvolvimento psíquico e emocional eles ficam mais suscetíveis à influência de pares. E no caso das comunidades de ódio, os participantes se influenciam reciprocamente.

Gustavo Estanislau, psiquiatra da infância e adolescência do Instituto Ame Sua Mente, relata que a imaturidade emocional faz com que o adolescente mude o seu comportamento ao entrar nesses grupos, em especial se já tiver transtornos mentais ou conflitos familiares, podendo se tornar mais hostil, impulsiva, reativa. Daí a importância dos pais e educadores manterem o diálogo e as relações saudáveis, monitorando o que os jovens fazem na internet, orienta o psiquiatra.

3. Relações mais distantes

O distanciamento e as relações mais superficiais, mesmo as familiares, podem ser o pano de fundo para o aumento de comportamentos violentos, do isolamento e da intolerância entre alguns jovens. O psicólogo Timoteo Madaleno Vieira, professor de psicologia e educação do Instituto Federal de Goiás (IFG), diz acreditar que estamos em um período de transição de uma sociedade mais tradicional para um cenário de maior liberdade e priorização das demandas e desejos individuais. Nesse contexto, o afeto e o cuidado estão em baixa, facilitando sentimentos como abandono, rejeição e solidão, num mundo adoecido que não consegue pensar no outro e no valor que ele tem. E com o desgaste nas relações sociais e familiares, as redes sociais acabam sendo um refúgio,  afirma o especialista.

4. Agravo da saúde mental

Os prejuízos trazidos pela pandemia e o empobrecimento das relações afetivas pioraram a saúde mental geral da população, com aumento de transtornos mentais e comportamentos problemáticos que podem levar a atos violentos. Além disso, o uso excessivo de redes sociais pode causar ansiedade e frustração pelos padrões de beleza e sucesso impostos, nem sempre alcançáveis. O psiquiatra da USP alerta os pais para que tomem cuidado com o conteúdo que os filhos acessam, visto que estão em processo de desenvolvimento e os pais precisam acompanhá-los nessa caminhada. Silva defende uma maior regulamentação por parte das plataformas tecnológicas quanto ao conteúdo disseminado nas redes.

Especialistas falam ainda do chamado “efeito contágio”. Saiba mais na reportagem do Estadão.
*Matéria atualizada em 22/06/2023.

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