Pânico de dentista: como evitar a ‘odontofobia’ na infância e garantir a saúde bucal

Segundo especialistas, a primeira consulta da criança deve acontecer ainda antes do nascimento, para que os pais sejam informados sobre cuidados com a higiene bucal do bebê; na infância, pais e profissionais podem ajudar a lidar com a fobia de ir ao dentista

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Criança com medo de dentista no consultório
Iniciar o acompanhamento com o dentista de forma preventiva ajuda tanto na manutenção da saúde bucal quanto na hora de evitar a odontofobia, defendem odontopediatras
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Realizar um acompanhamento odontológico é parte importante da manutenção da saúde bucal e do bem-estar do indivíduo. Assim como no caso dos adultos, bons hábitos de higiene bucal e visitas periódicas ao dentista possuem um papel importante na prevenção de doenças dentárias das crianças. Segundo especialistas, o acompanhamento profissional pode ser realizado desde antes do nascimento dos dentes. “A criança deve realizar a primeira consulta ainda antes do nascimento do primeiro dentinho. Assim, os responsáveis já recebem orientações importantes sobre como cuidar da saúde bucal do seu bebê antes que os problemas apareçam”, explica Juliana Giraldi, cirurgiã-dentista e especialista em Odontopediatria. 

Apesar da necessidade de se estabelecer bons hábitos desde cedo, o cenário da saúde bucal na prática enfrenta desafios. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde, realizada pelo IBGE e divulgada em 2020, 34 milhões de brasileiros, acima dos 18 anos de idade, perderam 13 dentes ou mais. A ansiedade para ir ao dentista por medo dos procedimentos tem se tornado cada vez mais comum, o que dificulta o acompanhamento odontológico correto. Nos Estados Unidos, por exemplo, uma pesquisa realizada pela British Dental Health Foundation estima que 9 a 15% da população do país deixa de ir ao dentista devido à odontofobia, ou seja, a fobia de passar por uma consulta com o odontologista.

Segundo Larissa Miyata, cirurgiã-dentista especialista em Odontopediatria e em Odontologia para pacientes com necessidades especiais, construir bons hábitos de higiene bucal desde a infância pode tornar esses cuidados muito mais fáceis na adolescência e na fase adulta, evitando complicações na saúde dos dentes e experiências desagradáveis para as crianças.

“Tudo o que a gente aprende quando pequeno, que a gente repete, a chance de replicarmos na adolescência e fase adulta é muito maior. Primeiro que a criança se acostuma, cria a rotina de fazer as escovações, logo não fica algo sofrido. Segundo que, quanto mais a gente cuidar, desde criança, e levar esse hábito para a vida adulta, isso minimiza demais as chances de ter um problema de saúde bucal”, pontua a dentista infantil.

Larissa Miyata, Cirurgiã Dentista Especialista em Odontopediatria e em Odontologia para Pacientes com Necessidades Especiais
Larissa Miyata, Cirurgiã Dentista Especialista em Odontopediatria e em Odontologia para Pacientes com Necessidades Especiais | Imagem: arquivo pessoal

Quando é hora de levar as crianças ao dentista?

Para Miyata, o ideal é que os pais levem as crianças a uma consulta odontológica ainda no primeiro ano de vida, mesmo que o filho ainda não possua nenhum dente. “O objetivo da consulta não é só avaliar o dente, é avaliar a boca como um todo, freio da língua do bebê, freio labial, estruturas bucais em geral. Essa consulta possui um caráter informativo muito forte, a respeito do uso de chupeta, mamadeira, creme dental, escova dental, como e quando escovar, quantas vezes ao dia, quanto de pasta colocar. Hoje em dia falamos muito em prevenção, e a prevenção só vem se a gente se antecipar à doença”, explica.

Mesmo se a criança já tiver mais de um ano de idade e ainda não tiver sido consultada por um profissional, a dentista destaca que, caso a criança não tenha apresentado nenhuma doença bucal, a consulta ainda terá um caráter preventivo. “Na minha opinião de consultório, eu falo que tarde é quando você traz uma criança que já tem cárie, já tem uma doença bucal. Se a criança tiver 2 ou 3 aninhos e ainda estiver vindo para uma primeira experiência, os pais já escovam os dentes em casa e você vê que não tem nada, continua sendo precoce.”

Odontofobia pode dificultar a higiene bucal

Ao longo do processo de acompanhamento preventivo da higiene bucal das crianças, situações traumáticas no dentista, comentários dos pais que as assustem sobre a consulta ou simplesmente o medo relacionado ao consultório e o barulho de seus aparelhos pode originar uma fobia de ir ao dentista. A odontofobia, esse medo intenso em relação ao consultório ou tratamentos odontológicos pode se tornar um desafio na hora de manter visitas periódicas das crianças ao dentista.

Karolaine Souza, psicóloga infantil, explica que, além das causas citadas, a forma com que os pais levam as crianças ao dentista e lidam com suas inseguranças em relação à consulta pode ser determinante para que a criança desenvolva – ou não – uma odontofobia. “Os pais precisam acolher esse sentimento de medo, amparar a criança e ser um apoio e segurança para ela. Muitas vezes, os pais desamparam ainda mais, pois a criança tem medo e eles criticam esse medo, falam ‘deixa de ser bobo’, ‘não vai nem sentir nada’. Mas é preciso ser sincero também. Falar que não vai doer pode passar uma desconfiança para a criança, porque depois que a criança viver aquilo, ela vai ver que doeu, e que os pais não foram verdadeiros. Então é importante ser sincero, talvez dizer ‘vai doer, mas vai ser rapidinho’ e ressaltar a importância disso, para acolher esse medo e não julgar ou criticar.”

Karolaine Souza, psicóloga infantil
Karolaine Souza, psicóloga infantil | Imagem: arquivo pessoal

Caso não seja tratada, a odontofobia pode se estender até a fase adulta, impactando ainda mais a saúde bucal do indivíduo. Segundo a odontopediatra Juliana Giraldi, isso prejudica o acompanhamento, pois sem supervisão profissional, não é possível diagnosticar, resolver ou prevenir problemas bucais com precisão. “Se a criança não consegue deixar o dentista cuidar de sua saúde bucal, ou não permite uma avaliação clínica/exame, não existe um controle sobre sua saúde, e as doenças bucais podem surgir muito rapidamente”, explica. 

Para que esse acompanhamento aconteça de forma tranquila e a criança, mesmo com odontofobia, retorne ao consultório, Juliana ressalta que realizar uma primeira consulta para a realização de um exame clínico pode ajudar para que a criança se acostume com o ambiente e se sinta mais segura. “É neste dia que iremos nos conhecer, entender os motivos dos traumas, a história odontológica, o que aconteceu com essa criança para ela ter essa fobia. Esta consulta precisa ser lúdica”, pontua.

“É preciso ter paciência, carinho, respeitar o tempo da criança, respeitar seus medos, construir um laço de confiança, E desta forma nós acabamos com a odontofobia”, diz Juliana Giraldi.

Dra Juliana Giraldi, cirurgiã-dentista especialista em odontopediatria
Dra Juliana Giraldi, cirurgiã-dentista especialista em odontopediatria | Imagem: arquivo pessoal

Pais e profissionais podem ajudar com a insegurança

Na psicologia, segundo Karolaine Souza, existem diversas técnicas que ajudam no enfrentamento de fobias, que também valem para a odontofobia. Desse modo, para que cada caso e história da criança seja avaliado, levá-las para um profissional é essencial para que ela receba ajuda caso apresente a odontofobia. “É importante que os pais busquem ajuda profissional, para ajudar a criança e auxiliar esses pais a lidarem com isso, para conduzirem isso melhor e poder ajudar a criança também. A forma como os pais lidam com isso, como eles acolhem esse medo, tudo isso pode ajudar ou intensificar essa fobia na criança também”, pontua a psicóloga infantil.

Além de buscar acompanhamento profissional e evitar a crítica ao medo das crianças em relação ao dentista, levar as crianças para uma consulta no dentista mesmo sem qualquer complicação odontológica pode ajudar tanto na hora de manter a higiene bucal correta, quanto para evitar o desenvolvimento de uma fobia.

“Levem as crianças de forma precoce, mesmo sem ter nada, para que elas conheçam o dentista, conheçam a cadeira, a situação odontológica, sem efetivamente precisar fazer um tratamento invasivo. Isso ajuda a diminuir muito a questão do medo em crianças”, ressalta Larissa Miyata.

Para tornar o ambiente do consultório mais agradável e evitar experiências traumáticas que desencadeiem uma odontofobia, Larissa Miyata destaca que o próprio profissional pode, na medida do possível, tornar a consulta mais tranquila e divertida.

“Isso é possível quando eu tenho uma criança que vem pra iniciar um acompanhamento, pra fazer uma limpeza, coisas mais simples de rotina. Quando você traz pra mim uma criança já com dor de dente, com cárie ou algum problema assim, não tem como a gente dizer que vai fazer uma coisa super legal, porque ali eu tenho um problema bucal para resolver”, explica, ressaltando a importância das consultas preventivas.

Em conjunto, a odontopediatra pontua que é importante que os pais, caso tenham suas próprias experiências negativas em relação ao odontologista, evitem alertar as crianças e descrever ocasiões traumáticas, pois isso pode colaborar para intensificar a insegurança dos filhos e desenvolver a odontofobia. “Não passe para as crianças os seus medos, pois os medos são seus, a criança é um ser novo, em construção, que vai ter uma experiência completamente diferente da sua. Então não passem isso pra criança de forma alguma.”


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