Matemática nada antipática: como aproximar crianças da disciplina

Trabalhar a matemática de forma contextualizada e conectada à realidade dos alunos, e trazer o assunto para conversas fora da hora dos estudos, são formas de tornar a matemática mais interessante e divertida

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garota de costas escrevendo multiplicações no quadro negro
Para os especialistas, é preciso desconstruir a imagem de que a matemática é um conteúdo insuperável
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Theo não gostava de matemática, sentia calafrios só de ouvir falar no assunto. Estudava as outras matérias, mas essa não tinha jeito. Theo é o personagem principal do livro “A vizinha antipática que sabia matemática” (editora Melhoramentos, 2014), e assim como ele há muitas crianças que acham essa disciplina mais difícil que as demais. Há até quem desenvolva a “matofobia”, condição de ansiedade e nervosismo que pode surgir ao tentar resolver questões de matemática. Mas não deveria ser assim.

Segundo especialistas, há um mito injustificado em torno da matéria. Eduarda Alves, psicóloga responsável pela atenção pedagógica da Smartick Brasil,  método online de aprendizagem de matemática, explica que alguns comportamentos referentes ao ensino do tema desmotivam as crianças.

“Falta ligação entre a matemática ensinada na escola e o cotidiano dos alunos. Há experiências negativas da criança com a disciplina, ausência de conceitos básicos. Isso, além da crença de que o entendimento da matemática é algo inato, um talento natural, e não algo que se desenvolve com trabalho e esforço para aprender, são alguns dos fatores que provocam esse afastamento”, afirma a psicóloga.

Eduarda Alves defende que esses fatores negativos sejam combatidos e compensados por atitudes e formas de pensar positivas da família. “Em contrapartida, o apoio e estímulos dos pais, rompendo crenças limitadoras e utilizando de momentos cotidianos para estimular o pensamento matemático, podem influenciar de maneira muito positiva o aprendizado da matemática.”

De forma complementar, Javier Arroyo, cofundador da Smartick, diz que esse tipo de pensamento é necessário para a criança perseguir seu potencial. “O mais importante de tudo é ter uma mentalidade construtiva, estar ciente de que tem um potencial ilimitado e que o sucesso na matemática exige esforço e trabalho. Os alunos com mentalidade construtiva se saem muito melhor na escola e na vida em geral”, afirma Arroyo.

Mitos e pensamentos limitantes

Para os especialistas, é necessário desconstruir a imagem da matemática como um obstáculo possivelmente insuperável e evitar construir um ambiente ansioso ao redor da ciência. Alves adverte que comentários sobre o passado e comparações favorecem esse nervosismo nas crianças. “Muitas vezes as famílias contribuem para o estigma da matemática, gerando aquele lugar comum ‘meu filho é ruim em matemática… assim como eu era”, afirma a psicóloga.

Enquanto isso, Cristina Diaz, CEO do Canguru de Matemática, competição anual internacional destinada aos alunos do 3º ano do Ensino Fundamental até os da 3ª série do Ensino Médio, trata de estigmas que os pais podem acabar colocando na cabeça das crianças, que alimentam a ideia de que a aptidão para a matemática é algo predestinado. “Evitem falar em termos absolutos como, por exemplo, ‘ser bom em Matemática’ ou ‘não ser bom em Matemática’. Isso é algo que se constrói”, afirma Diaz.

Diaz ainda aponta para o problema de como a disciplina é apresentada para as crianças. Para a CEO, o ensino da matemática é feito sem dar atenção e reconhecimento ao processo de resolução dos problemas, o que atrapalha a ligação das crianças com essa ciência. “Outra coisa que costuma gerar aversão é a maneira como a Matemática é apresentada – de forma rápida, descontextualizada e focada no resultado que se obtém em resolver um determinado problema. E isso não é o mais relevante no processo. A matemática é algo que precisa ser descoberto com tempo, paciência, estratégias diferentes e de maneira divertida”, ressalta Diaz.

Maneiras alternativas de ensinar

Criar interesse em matemática nas crianças requer uma forma de pensamento própria e bem diferente da que aprendemos tradicionalmente. Diaz afirma se basear na autora e professora da Universidade de Stanford, Jo Boaler, reconhecida mundialmente pelas suas obras sobre maneiras alternativas e mais eficazes de se ensinar matemática. “Ela diz que é necessário adotar um ‘mindset de crescimento’, ou seja, acreditar que as dificuldades são inerentes, que é possível aprender coisas novas e que o erro faz parte do processo”, explica Diaz.

Sobre a forma de abordar as crianças com a disciplina, Diaz afirma que são necessárias a criatividade e a compreensão para introduzir a matemática para as crianças, bem como permitir que entendam sua real importância. “Uma abordagem investigativa, curiosa, que deixa o tempo a favor das construções e conquistas pode mudar completamente como as crianças aprendem. Compreender a Matemática, seus raciocínios, lógicas e padrões nos faz seres humanos mais completos e mais preparados para qualquer futuro ou profissão que quisermos construir”, diz a CEO.

“Compreender a Matemática, seus raciocínios, lógicas e padrões nos faz seres humanos mais completos e mais preparados para qualquer futuro ou profissão que quisermos construir”, diz a CEO da Canguru Matemática.

Ela dá como exemplo o trabalho realizado na competição em que buscam aproximar a Matemática da realidade dos estudantes a partir de uma linguagem solta, fluida e leve e, sempre que possível, fazendo conexões com atividades do cotidiano. “Também utilizamos muitas imagens e cores, tornando o material leve e colorido. Isso permite que os estudantes criem vínculos com a Matemática de maneira pessoal, utilizando suas experiências diárias como suporte na elaboração de estratégias de solução de problemas”, relata a especialista.

Já Alves traz a visão da necessidade de entender cada processo de aprendizado como individual de cada criança. “Independentemente da idade da criança/adolescente e do seu grau de conhecimento matemático, a realidade e forma de aprendizagem é subjetiva. Entendemos que cada criança adquire conhecimento e se desenvolve de forma distinta, tendo transtorno de aprendizagem ou não”, explica a psicóloga.

Matemática e diversão

Há algumas dicas que os especialistas e educadores recomendam que os pais sigam para tornar o ensino da matemática mais divertido, mais próximo e menos punitivo para as crianças. Javier Arroyo sugere que essa aproximação seja feita até fora da hora dos estudos, através de brincadeiras. “Incentive-os a jogar jogos relacionados à matemática. Qualquer jogo que tenha dados ajudará as crianças a apreciar a matemática e a desenvolver o senso numérico”, afirma o educador.

Alves, por outro lado, incentiva que os pais valorizem o processo de pensamento dos filhos e busquem entendê-lo. “Pedir que expliquem o processo de raciocínio e que reflitam sobre o que fizeram. Quer seja um problema ou uma operação aritmética, a metacognição nos ajuda a ser mais conscientes”, afirma a psicóloga.

Por fim, Diaz enumera algumas dicas que acredita fazerem a diferença nessa relação entre as crianças e a matemática: “Tragam o assunto para conversas informais onde estejam todos se divertindo, sem cobranças de performance e sem perguntas rápidas com respostas rápidas (por exemplo, não é necessário ‘tomar a tabuada’ das crianças). Incluam a Matemática no dia a dia, observando como ela está presente na arte, na culinária, nas notícias, nas construções dos pensamentos de todos nós. Reconheçam o esforço das crianças quando elas se aproximarem de alguma questão matemática, sendo essa questão compreendida ou não”.


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