O perigo da ‘suposta’ paternidade ativa

Para o educador parental Mauricio Maruo, a paternidade ativa pode ter seu lado ruim, quando o homem começa usar o título de pai ativo para exercer suas vontades e opiniões sobre anos de luta das mulheres por igualdade de gênero

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Mãe discute com o pai, que segura bebê no colo
Buscador de educadores parentais
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No começo de setembro, publiquei um artigo sobre as 6 atitudes que os pais podem adotar para aliviar a carga mental das mães, pois não é que esse conteúdo deu bastante repercussão?

Muitas mulheres e, incrivelmente, muitos homens elogiaram o conteúdo, porém, uma parcela desses homens me deixou bastante curioso – a maioria deles são homens/pais que “investem” em sua paternidade para produzir conteúdo direcionado à criação dos filhos(as). Ou seja, criam conteúdo baseado em suas experiências paternas, como foi com a paternidade criativa no início da sua formação. 

O que me deixou mesmo curioso foi que pelo menos cinco desses homens levantaram a seguinte questão:

“Nos dias de hoje não precisamos mais buscar a separação entre gêneros (no caso, pais e mães), pois os dois têm o mesmo papel na criação dos filhos. Conteúdos que precisam sugerir que os homens mudem seus comportamentos são conteúdos que vão contra a construção dessa igualdade.”

Antes de prosseguir gostaria imensamente de saber a opinião de vocês sobre essa questão, o que vocês acham?

Minha opinião 

É relativamente novo todo esse movimento de levantar a bandeira (por sinal, bem pesada) sobre a igualdade e equidade de gêneros. 

É claro que sou super a favor da igualdade e equidade, inclusive a  Paternidade Criativa nasceu com esse intuito, no entanto acredito também que devemos ter um mínimo de consciência sobre todas as questões históricas que influenciam as dificuldades para que esse movimento se torne cada vez mais frequente em nossa sociedade. 

Não é porque eu quero que o mundo seja igualitário que ele será, existem muitas questões históricas que criam barreiras enormes para a construção dessas pontes.

Por exemplo: 

Um desses homens reclamou que ele propôs a criação de uma roda de conversa para um grupo de mães para falarem sobre as novas formas de educação infantil, onde ele seria o mediador. Mas muitas das mães se sentiram incomodadas e não acharam que a iniciativa fosse uma boa ideia.

O ponto que ele levantou foi que ainda existe preconceito em relação ao pai que participa ativamente da criação dos filhos.

Pois bem, eu entendo (até certo ponto) o que ele está dizendo, porque, muito tempo atrás, eu também pensava da mesma forma. Porém tomei consciência de que era meu ego gritando sobre uma “suposta injustiça” que aconteceu comigo, e convenhamos que ouvir seu ego não é de longe o caminho mais assertivo para gerar a igualdade e equidade. 

Para entender melhor por que esse não é o melhor caminho, vamos a alguns fatos:

  • Somente a partir dos anos 90 que os homens começam a ter “um pouco mais” de consciência de que a figura paterna influencia positivamente no desenvolvimento de uma criança. E somente a partir de 2010 começaram os movimentos relacionados à paternidade ativa, ou seja, tudo isso é muito novo.
  • E antes disso, como era? Claro que todo papel de criação social, educacional e emocional ficava a cargo da mãe.
  • Segundo o site da Fiocruz, com dados do IBGE de 2019, as mulheres dedicavam cerca de 21 horas do seu dia aos cuidados de pessoas e afazeres domésticos, contra apenas 11 horas do homem.
  • Nas escolas de educação infantil, é raro encontrar educadores homens. Segundo matéria da Revista Educação, que traz dados do censo de educação básica de 2020, apenas 3,4% dos educadores infantis são homens, o que mostra que ainda temos muito o que caminhar para conquistarmos a igualdade que queremos.
  • Cito ainda pesquisa feita no documentário O Silêncio dos Homens, que revelou que somente 1 em cada 10 homens afirma ter conversado abertamente com o pai sobre o que é masculinidade.

Se queremos realmente construir as pontes de igualdade e equidade dentro da parentalidade, primeiro precisamos olhar além da nossa bolha e compreender que existe, sim, uma lacuna imensa que não vai se fechar apenas porque eu quero que ela se feche. Aliás, não é porque você é um pai presente que o mundo precisa saber que você é um pai presente. Ser pai presente nunca foi sobre ganhar uma medalha, na verdade, isso não é mais do que uma simples obrigação.

Praticar a empatia é um bom começo

Se realmente queremos construir um mundo mais igualitário, talvez o melhor caminho para começar seja utilizando mais a empatia. Mas, para muitos homens é difícil sentir empatia por situações que as mulheres passam e, na contrapartida, somos privilegiados em não passar.

Você, por acaso, já sentiu medo ao andar sozinho na rua por simplesmente ser homem? Você já se sentiu menor perto da mãe dos seus filhos por todos elogiarem a “maternidade ativa” dela e nada da sua paternidade? Você já sentiu o peso da carga mental por ter que gerenciar os mínimos detalhes que fazem muita diferença para os cuidados dos(as) filhos(as), como agendar o pediatra, agendar as vacinas, conversar sobre sexo ou sexualidade, entre muitas outras coisas?

A última consideração é apenas um pequeno aviso.

Eu sou educador parental e estudei bastante para me tornar que sou hoje. Somente depois de adquirir muita informação e consciência que comecei a criar conteúdos para internet. Tomem cuidado com influenciadores(as) parentais das redes sociais, pois uma boa parte deles trazem bagagens pessoais como conteúdo, algo que pode ser bom para a dinâmica de uns, mas não para outros. Pesquisem sobre as vivências e principalmente sobre os trabalhos sociais e ideológicos que esses influenciadores atuam.

*Este texto é de responsabilidade do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Canguru News.

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