O que esperar quando você está esperando. É esse o título do livro que me acompanhou durante a gravidez – muito aguardada, embora não planejada. Depois de perder duas gestações em meu primeiro casamento, “decidi” não mais fazer planos, a fim de me blindar de uma nova decepção. Com a surpresa de ter Francisco a caminho, o guia foi uma espécie de troféu – que eu alisava e lia diariamente, curiosa sobre a nova vida que crescia em mim. Com ele adquiri uma lista de outros livros, empenhada em caprichar no papel de mãe.
Coerente com a promessa de seu título, o livro não previu o inesperado: uma viuvez em plena gestação. Nos últimos meses, embora me houvesse sobrado tempo, faltou fôlego. Francisco trouxe o oxigênio, mas tive de aprender a maternidade em pleno luto, como quem se aventura a mergulhar com cilindro. Troquei páginas impressas por folhas em branco. Escrevi mais do que li – foi minha forma de respirar.
À minha espera ficou a pilha de livros, aguardando tempos mais serenos. Fiel, me acompanhou nas mudanças de casa, como um membro da família. Outro dia tropecei num exemplar de Limites sem trauma, de Tania Zagury. O marcador jazia no capítulo “Entre 1 e 4 anos”. No alto da página já amarelada, o item “Tarefas dos pais” falou por si: ali eu interrompera a leitura.
Se a mim coube ser ambos os pais, mal fiz o papel de um só. Enquanto Francisco crescia, tateei no escuro tentando impor autoridade. A solidão gritava, a insegurança tapava os ouvidos e uma certeza me cegava: o resultado seria um desastre. Francisco tinha acesso ao raio X da minha fragilidade: testava insistente a minha capacidade de acreditar nos limites que eu impunha. Eu era uma motorista recém-licenciada, rodando a Grande BH sem GPS. “Isso só tende a piorar”, eu imaginava. O tempo parece passar mais rápido quando estamos correndo contra ele.
E passou. Francisco já beira os 10 anos. Ainda há tempo para o capítulo “Dos 8 aos 11” do livro sobre limites (embora não sem trauma). Talvez seja cedo para dizer se errei ou acertei. Talvez em vão: não há chance de tentar de novo. Olho para o menino e me alumbro. Quantas vezes duvidei de mim.
A adolescência já faz sombra em meu quarto, as broncas são mais frequentes, mas, não me pergunte como, Francisco teme a mãe. Longe de ser um exemplo, reviso a matéria atrasada e descubro: caminhando, aprendi. Construímos nossas regras, lapidamos conflitos e, ao que tudo indica, demos conta do recado. Seu quarto nunca está arrumado, livros não são o seu forte, nem sempre somos amigos. Mas ele vai bem na escola e, o mais importante: conhece o valor do afeto.
A tormenta passou. Aproveito pra tomar fôlego. Tenho em casa um pré-adolescente. Vem mais emoção por aí.