Leia a crônica de Cris Guerra em março: ‘O que eu não esperava’

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    Foto: PixabayO que esperar quando você está esperando. É esse o título do livro que me acompanhou durante a gravi­dez – muito aguardada, embora não planejada. Depois de perder duas gestações em meu primeiro casamento, “decidi” não mais fazer planos, a fim de me blindar de uma nova decepção. Com a surpresa de ter Francisco a caminho, o guia foi uma espécie de troféu – que eu alisava e lia diariamente, curiosa sobre a nova vida que crescia em mim. Com ele adquiri uma lista de outros livros, empenhada em caprichar no papel de mãe. 

    Coerente com a promessa de seu título, o livro não previu o inesperado: uma viuvez em plena gestação. Nos últimos meses, embora me houvesse sobrado tem­po, faltou fôlego. Francisco trouxe o oxigênio, mas tive de aprender a maternidade em pleno luto, como quem se aventura a mergulhar com cilindro. Troquei páginas impressas por folhas em branco. Escrevi mais do que li – foi minha forma de respirar. 

    À minha espera ficou a pilha de livros, aguardando tempos mais serenos. Fiel, me acompanhou nas mu­danças de casa, como um membro da família. Outro dia tropecei num exemplar de Limites sem trauma, de Tania Zagury. O marcador jazia no capítulo “Entre 1 e 4 anos”. No alto da página já amarelada, o item “Tarefas dos pais” falou por si: ali eu interrompera a leitura. 

    Se a mim coube ser ambos os pais, mal fiz o papel de um só. Enquanto Francisco crescia, tateei no escuro tentando impor autoridade. A solidão gritava, a inse­gurança tapava os ouvidos e uma certeza me cegava: o resultado seria um desastre. Francisco tinha acesso ao raio X da minha fragilidade: testava insistente a minha capacidade de acreditar nos limites que eu impunha. Eu era uma motorista recém-licenciada, rodando a Grande BH sem GPS. “Isso só tende a piorar”, eu ima­ginava. O tempo parece passar mais rápido quando es­tamos correndo contra ele. 

    E passou. Francisco já beira os 10 anos. Ainda há tempo para o capítulo “Dos 8 aos 11” do livro sobre limites (embora não sem trauma). Talvez seja cedo para dizer se errei ou acertei. Talvez em vão: não há chance de tentar de novo. Olho para o menino e me alumbro. Quantas vezes duvidei de mim

    A adolescência já faz sombra em meu quarto, as broncas são mais frequentes, mas, não me pergunte como, Francisco teme a mãe. Longe de ser um exem­plo, reviso a matéria atrasada e descubro: caminhando, aprendi. Construímos nossas regras, lapidamos confli­tos e, ao que tudo indica, demos conta do recado. Seu quarto nunca está arrumado, livros não são o seu forte, nem sempre somos amigos. Mas ele vai bem na escola e, o mais importante: conhece o valor do afeto. 

    A tormenta passou. Aproveito pra tomar fôlego. Tenho em casa um pré-adolescente. Vem mais emoção por aí.

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