O impacto de programas de parentalidade na primeira infância

Em palestra no 2° Congresso Internacional de Educação Parental, o economista e pesquisador aborda a relação entre o ambiente de linguagem da criança, condição de renda das famílias e qualidade das interações entre pais e filhos

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Economista e pesquisador Flavio Cunha
Flavio Cunha pesquisa o efeito da interação verbal dos pais com crianças desde os primeiros meses de vida e seu impacto no desenvolvimento da linguagem aos 2 ou 3 anos de idade
Buscador de educadores parentais
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“A taxa de retorno a longo prazo do investimento na primeira infância é muito alta. Mas, se é muito alta, por que os pais investem tão pouco?” questiona Flávio Cunha, professor de economia da Rice University, pesquisador associado do Population Studies Center da Universidade da Pensilvânia e PhD em Economia pela Universidade de Chicago.

Em sua palestra no 2° Congresso Internacional de Educação Parental, o profissional, que atua com ensino e pesquisa nas áreas da economia do trabalho e economia da educação, ressaltou o impacto positivo de políticas públicas e investimentos em programas de parentalidade no desenvolvimento infantil, sobretudo na linguagem da criança. A conscientização, disse, é fundamental para construção de conversas e interações de qualidade no desenvolvimento da linguagem da criança.

Interação verbal e desenvolvimento da linguagem da criança

Flávio Cunha contextualizou o debate a partir da questão da importância da interação verbal para o desenvolvimento da linguagem na primeira infância. Ele usou dados do Programa LENA Start, um estudo a respeito das expectativas parentais e desenvolvimento de linguagem que se dedica a engajar famílias de diferentes faixas sociais e ajudá-las a entender como intensificar as conversas com os filhos durante os primeiros anos de vida. O baixo investimento dos pais na primeira infância poderá influenciar em todo o desenvolvimento da criança a longo prazo e suas habilidades cognitivas.

“Essa interação verbal que as crianças têm desde os primeiros meses de vida é o fator mais importante para prevermos o desenvolvimento da linguagem aos 2 ou 3 anos de idade ”, explica o pesquisador.

Ele ressalta que, em ambientes de linguagem pobre, existe pouca interação entre os pais e as crianças. Especialmente na primeira infância, no caso de crianças que ainda não desenvolveram a fala, por exemplo, Flávio diz que existe uma grande quantidade de pais “que acham que a taxa de retorno é muito baixa, que interagir com as crianças nessa idade não vai levar a nada porque elas ainda não entendem”. Além disso, Cunha pontuou que essa taxa reduzida de interações não está necessariamente atrelada a famílias de baixa renda: nos estudos do LENA Start com famílias da Pensilvânia, números reduzidos de conversas e interações entre pais e filhos pequenos também são comuns em famílias de renda alta que não acreditam na taxa de retorno que as interações podem causar.

“A desigualdade no ambiente linguístico é muito maior dentro de cada classe do que entre classes, então se você for mensurar interação entre famílias pobres, você pode pensar que está mensurando uma família rica”, comenta Flávio. “Isso quer dizer que programas de parentalidade não podem ser pensados apenas em famílias de baixa renda.”

Qualidade e quantidade transformam

Para transformar esse cenário, é essencial que os pais repensem suas interações com os filhos e busquem cultivar interações não só quantitativas, mas também qualitativas, com significado. Ele exemplifica: “Muitos pais não sabem exatamente como ler para os filhos. A leitura não é nem tanto a leitura em si, é a interação verbal. Não é tão importante seguir a história, mas deixar a criança seguir esse processo, apontar para os personagens, entender o que é”. Esse tempo de qualidade e atenção dos pais a ela terá um significado para a criança e irá impactá-la futuramente, em seu desenvolvimento social, comportamental e linguístico.

“Interação vazia não leva ao desenvolvimento infantil da linguagem, pois a criança só consegue desenvolver a linguagem quando coloca significado. E para colocar significado, ela precisa da atenção conjunta” 

Incremento de políticas públicas

Para que isso se torne uma realidade, Flávio ressaltou a importância de difundir a informação para as famílias. Segundo ele, é somente com informação e conhecimento dos pais sobre a importância das interações na primeira infância que se tornará possível impactar diretamente as crianças a longo prazo. E os programas de parentalidade, enfatizou, são protagonistas nesse processo.

Com um bom investimento neles e em inovações nas políticas públicas, já observaríamos um impacto nas crianças, segundo Cunha. Entretanto, ele ressalta que muito pouco se investe nessa questão, pois não existe a expectativa de um retorno alto dos investimentos na primeira infância. “Se todo mundo começasse a investir, em 20, 25 anos, a melhora acumulada seria muito grande. Mas nós não temos essa paciência, a gente não pensa que o que nós podemos fazer é incrementar essas políticas e programas de fortalecimento de vínculo”

Contudo, a boa notícia é que transformar ambientes de linguagem menos favoráveis ainda é uma possibilidade viável: “É possível e não é caro modificar ambientes de linguagem pobres no Brasil. E a maneira de fazer isso é através de programas que comuniquem aos pais sobre a importância dessa interação”, completa o economista. Os impactos desse novo olhar, com mais interações com significado nos primeiros anos de vida, representam um melhor desenvolvimento de competências cognitivas essenciais no início da atividade escolar, a partir das quais a criança pode evoluir habilidades como a proficiência em leitura, por exemplo. Segundo Cunha, quanto menos interações e mais problemas a criança enfrentar nesse processo, menor será a probabilidade dela finalizar o ensino médio, ir para a faculdade e ter melhores desempenhos socioeconômicos na vida adulta.


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