Por Cris Guerra
Papai Noel, Coelhinho da Páscoa, Fada do Dente. Cedo ou tarde, toda criança empreende sua “Operação Lava Jato” para desmascarar, um a um, os personagens em que acreditou por algum tempo. Já os príncipes seguem ilesos, acordando as princesas com a velha promessa de viverem felizes para sempre. Incrível como ninguém pega os caras. Enquanto isso, seguimos dormindo até a idade adulta, acreditando no impossível.
Fazer do amor um ensino fundamental. Já pensou? Não seria tão ou mais importante que aprender logaritmo, decorar a tabela periódica ou saber quantos corações tem um minhocuçu? Aprender que um coração disparado é só o começo. Que a vida a dois é feita mais de cumplicidade que de sorte, mais de decisão que de estrelas.
Que tal atividades com bloquinhos de encaixar, ensinando que a construção de pontes pede o desmonte de egos? Lições que alertem desde cedo para o perigo de enxergar no outro apenas o reflexo dos seus desejos. Que ensinem que o amor começa justamente quando o espelho quebra e você é capaz de aceitar o outro assim, do jeitinho que ele é, tão diferente das suas expectativas.
E por falar em expectativa, está aí uma boa disciplina para ser extinta. Educar não para a obrigatoriedade da vida a dois, mas para todas as possibilidades, sem roteiros prontos.
Ensinar que a felicidade não é um lugar para onde nos mudamos um dia, para sempre. Que a vida é feita de instantes
Ensinar que a felicidade não é um lugar para onde nos mudamos um dia, para sempre. Que a vida é feita de instantes – alguns mágicos, que não nos visitam com tanta frequência; outros banais, como o recheio de pão de ló daquela torta de morango com chantilly.
Plantar adultos capazes de tecer almofadas de afeto, preenchidas de espuma boba e inútil – prontas para amaciar a vida mesmo nos momentos em que ela parece soprar a falta de sentido.
Treinar o estar presente no momento presente. Exercitar o crescer sem parar de brincar. Amassar os problemas com doçura e força, como quem prepara uma pizza.
Jogos que proponham trocar o feliz pelo contente, palavra cheia de si, capaz de fazer tudo com instantes de nada – mais esperta que alegre, mais sábia que feliz.
Desenhar cartazes com caveiras, alertando para os perigos de se formatar a vida para um final feliz. Escrever repetidas vezes que não é permitido fazer o início pensando no final.
Aulas sobre a beleza de se permitir mudar de opinião. Lições sobre ouvir mais do que falar. Longos textos sobre a permanência da mudança. Musiquinhas sobre o motor e o alento de acreditar em dúvidas. Provas orais sobre não se levar tão a sério. Noites do pijama domesticando monstros.
Talvez seja a memória que me esteja falhando – faz tanto tempo que saí da escola. Pode ser que tudo isso seja mesmo praticado ali, entre as crianças. E o erro esteja em pensar que saímos de lá sabendo tudo. Quanto mais adultos ficamos, mais precisamos voltar a aprender.