Dia do Pediatra: ‘a melhor remuneração é afetiva’, diz Daniel Becker

'A especialidade lida muito mais com a saúde do que com a doença e isso traz um atrativo extra, pelo menos para mim', diz o especialista

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Dia do Pediatra: 'remuneração dessa carreira é afetiva', diz Daniel Becker
Para Becker, o livre brincar e o contato com a natureza são fundamentais | Foto: Divulgação
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Hoje, 27 de julho, é o Dia do Pediatra. Para falar sobre essa especialidade – que chega a ter 40 mil médicos no Brasil e é a segunda carreira com mais profissionais atuantes, atrás apenas da clínica médica – entrevistamos Daniel Becker, um dos pediatras mais conhecidos do país. Formado há mais de 30 anos, ele é mestre em saúde pública pela Fiocruz e foi o primeiro médico brasileiro a trabalhar com a organização internacional “Médicos sem Fronteiras”, em 1988.

Natural do Rio de Janeiro, Becker é pioneiro na abordagem de Pediatria Integral no Brasil, uma prática que amplia o olhar e o cuidado para promover o desenvolvimento pleno e o bem-estar da criança e da sua família. Ele criou até o perfil @pediatriaintegralbr em que escreve sobre temas relacionados ao assunto.

Sobre a sua profissão, que é predominantemente feminina, Becker diz que a escolheu pelo apelo especial que ela apresenta. “Os homens costumam procurar carreiras mais bem remuneradas e a pediatria é das piores em termos financeiros. Mas a remuneração que o pediatra recebe é afetiva. É uma especialidade que lida muito mais com a saúde do que com a doença e isso traz um atrativo extra, pelo menos para mim”, contou o pediatra em entrevista exclusiva à Canguru News.

Para ele, o livre brincar e o contato com a natureza são suas fundamentais. “Minha paixão, como muitos sabem, é o resgate do ser criança, que se dá pelo retorno às suas essências fundamentais que são o brincar livre e a natureza. É o que vivo pregando nas consultas, redes sociais e todos os lugares onde falo para crianças e famílias”.

Autor de um currículo extenso, o pediatra já desenvolveu trabalhos de saúde comunitária em habitações populares, foi co-criador e pioneiro do modelo do Programa de Saúde da Família que viria a se tornar política pública no Ministério da Saúde e colaborou com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e a Organização Mundial de Saúde (OMS). Também foi convidado do programa Roda Viva, em 2013, e do TEDx em 2015, com a palestra “Crianças, já para fora”. Consultado com frequência pela mídia para temas como saúde e infância, Becker dá palestras e presta consultorias em fundações e empresas. Abaixo, leia os principais trechos da entrevista realizada com Daniel Becker neste Dia do Pediatra em 2020.

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Daniel Becker fala sobre a profissão, queixas mais frequentes no consultório e a preocupação pelo desenvolvimento integral da criança

1. A primeira infância é uma fase determinante para o desenvolvimento pleno de uma criança e deve ser rica em estímulos e interações que fortaleçam o vínculo com os cuidadores. Como o pediatra pode contribuir para que a criança se desenvolva a contento?

O pediatra tem como missão primaria promover a saúde da criança, no mais amplo entendimento, físico, mental psicológico e social, e também trabalhar as questões ligadas a um ser humano que não chegou ainda à sua maturidade. Isso implica em cuidar da alimentação, formação de hábitos saudáveis, tratamento de doenças, vacinas, vínculo com os pais, prevenção, questões da higiene, sono, estímulo ao desenvolvimento psicomotor e emocional. O pediatra também precisa fazer a família entender os fatores de maior impacto na saúde dessa criança, entre os quais, uma boa alimentação, livre de ultraprocessados; a importância das brincadeiras ao ar livre; e a questão da escola – se a criança vai se adaptar e se a escola é adequada para ela. Ainda, o pediatra trata dos estímulos culturais que a criança deve receber e do padrão de consumo dessa família. São inúmeras observações importantes para que a gente possa promover a saúde da criança juntamente com a família e a sociedade – já que a proteção da criança é uma tarefa da sociedade. O pediatra tem papel importantíssimo em todas essas questões.

2. Esse olhar mais amplo para a primeira infância vai de encontro  à proposta que você criou de “pediatria integral”? O que ela significa?

O olhar ampliado sobre a criança atua não só sob o ponto de vista físico, das doenças, mas com foco no bem-estar mental, social, emocional e espiritual. Olha para essa família como sendo o contexto essencial da criança. Procura entender essa família, entrar no mundo dela e dialogar com ela de forma horizontal e não de forma prescritiva e autoritária. E se serve de práticas que não são apenas convencionais, medicamentosas, mas do campo da medicina integrativa, homeopática, floral, da osteopatia, acupuntura e fitoterápica. Envolve também profissionais como fonoaudiólogo, psicólogo, psicopedagogo e outros que possam ajudar a criança no seu desenvolvimento integral, tentando evitar a medicalização excessiva.

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3. O pediatra pode atender desde um recém-nascido a uma criança em idade pré-escolar (4, 5 anos) e um adolescente. É um desafio lidar com essa diversidade de idade e mesmo de demandas dentro de cada faixa etária?

Realmente, é preciso uma expertise em todas essas áreas. Isso envolve experiência, estudo, dedicação e uma noção de até onde ir. Mais do que saber um pouco de tudo, precisa costurar tudo isso, envolve conhecimentos de psicanálise, sociologia e antropologia, por exemplo, para olhar para essa criança no seu contexto social também. O bom pediatra tem que saber o básico das doenças mais comuns a formas mais efetivas de promover o desenvolvimento da criança, desde que ela nasce até a adolescência. Não é fácil mas temos muitos bons pediatras nesse pais felizmente. Existe também o sub especialista que é a medicina do adolescente ou hebiatria que já está bem estruturada no país.

4. À medida que as crianças crescem e entram na adolescência é comum que os pais deixem de levá-las ao pediatra. Como você avalia esse afastamento?

O correto seria ter consultas anuais. Nos primeiros meses de vida as consultas são mensais, depois, bimestrais, trimestrais, semestrais e vai evoluindo à medida que o tempo passa. Mas é natural e aceitável que a criança saudável e feliz não precise ficar indo no médico a toda hora, embora vez ou outra, acabe indo, porque surge uma doença, uma gripe, uma febre mais forte e os pais acabam levando.

5. Pela sua experiência em consultório, é possível listar as queixas mais frequentes que levam pais e crianças para atendimento?

Sem dúvida nenhuma as mais frequentes são as doenças agudas, febris. Em segundo lugar, vêm as doenças respiratórias não infecciosas, alergia, rinite, asma, crianças com catarro e diarreia. No primeiro ano de vida, há também a questão do aleitamento, orientação à amamentação e cuidados com o recém-nascido. Ainda, queixas em relação ao sono, alimentação e questões de comportamento, birra, agitação e dúvidas sobre vacinação. A consulta pré-natal de pediatria é fundamental na minha opinião, todo casal deveria ir ao pediatra que escolheu para cuidar de seu filho antes dele nascer, para falar de um monte de coisas.

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6. Segundo a pesquisa Demografia Médica no Brasil, realizada pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), o país conta com aproximadamente 40 mil médicos pediatras, sendo essa a segunda especialidade com maior número de profissionais registrados, atrás apenas da Clínica Médica. Que motivos você vê para que essa área tenha tantos profissionais atuando?

A pediatria atrai especialmente as mulheres médicas. O perfil do pediatra é predominantemente feminino hoje em dia, pelo fato de ser uma especialidade que traz o afeto e o amor para dentro da prática como nenhuma outra eu diria, porque a criança desperta muito afeto e amorosidade. E como a mulher é uma figura associada ao cuidado e tem a experiência dos filhos, entre outras questões, ela tende a se interessar mais por esse universo. Os homens costumam procurar carreiras mais bem remuneradas e a pediatria é das piores em termos financeiros. Isso, inclusive, é uma constante em todos os países. Mas a remuneração que o pediatra recebe é afetiva. É uma especialidade que lida muito mais com a saúde do que com a doença e isso traz um atrativo extra, pelo menos para mim.

7. Dentro do universo da pediatria, existe alguma área em especial que lhe causa maior interesse ou paixão? Sem sim, qual é ela e porquê?

Minha paixão, como muitos sabem, é o resgate do ser criança, que se dá pelo retorno da criança às suas essências fundamentais que são o brincar livre e a natureza. É o que vivo pregando nas consultas, redes sociais e todos os lugares onde falo para crianças e famílias.

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