Quanto mais seguras as crianças se sentem, mais elas tendem a compartilhar seus sentimentos e pensamentos com os adultos. E ainda que tais sentimentos possam ser externalizados de maneiras inapropriadas, sendo vistos como práticas de mau comportamento, esse movimento de maior liberdade dos pequenos é saudável para o seu crescimento e amadurecimento, afirma a jornalista científica Melinda Wenner Moyer, autora de “Como criar crianças que não são idiotas”, em artigo para o caderno Parenting, do jornal The New York Times.
Ela lembra que o relacionamento que muitos pais hoje têm com seus filhos é bem diferente das relações de décadas atrás, sendo a imposição de ordens e punição dos filhos menos comum, principalmente, entre aqueles que praticam a parentalidade intensiva (superprotetora) e mais centrada na criança. Esses pais se mostram mais abertos, através da empatia e do diálogo. Por causa disso, muitas crianças se sentem mais à vontade e estão mais dispostas a desafiar os adultos e a falar, quando sentem o impulso.
Embora esse movimento às vezes pareça desagradável, a jornalista diz que para psicólogos infantis a mudança é positiva. “Pode se manifestar quando as crianças são um pouco mais assertivas e opinativas, e talvez até mais argumentativas, e acho que o desafio não é interpretar isso como uma coisa ruim, mas como um processo importante e necessário. Quando as crianças se sentem seguras e amadas, elas são mais capazes de “encontrar sua voz e descobrir o mundo por si mesmas”, explicou Emily Loeb, psicóloga da Universidade da Virgínia, especialista em desenvolvimento infantil, ao jornal americano.
As consequências da rigidez dos pais
Já filhos de pais conservadores e autoritários tendem a se comportar de maneira mais retraída, destaca Melinda. Ela diz que relacionamentos familiares baseados no medo – quando os pais são extremamente rigorosos, punindo seus filhos duramente e dizendo coisas como: “Porque eu disse!” – estão associados a uma série de resultados negativos em crianças. Esses menores correm um risco maior de ansiedade e depressão, exibem um comportamento mais perturbador e são mais propensos do que outras crianças a ter baixa auto-estima, apontam estudos.
Pais rígidos às vezes usam táticas específicas que são especialmente prejudiciais, segundo o artigo do New York Times. Uma delas é a consideração condicional: se as crianças têm um bom comportamento, os pais demonstram mais amor e carinho por elas, do que quando se comportam mal. “A ciência diz que, com o tempo, temer seus pais torna você menos confiante em si mesmo e mais dependente de validação externa”, diz Rebecca Schrag Hershberg, psicóloga clínica, especializada em desenvolvimento socioemocional e saúde mental na primeira infância, para a reportagem.
Um estudo descobriu que adolescentes, cujos pais usavam a consideração condicional, relataram sentir-se mais ressentidos com seus pais e eram menos engajados academicamente e emocionalmente, em comparação com adolescentes cujos pais os apoiavam incondicionalmente.
Outra abordagem utilizada pelos pais autoritários é o controle psicológico. Isso acontece quando brincam com o senso de identidade e valor intrínseco das crianças para obter o comportamento que desejam. É “um tipo de controle em que você pede ao seu filho que pense da mesma maneira que você ou se sinta da mesma maneira que você”, ressaltou Emily Loeb. Um pai que usa o controle psicológico pode dizer coisas como “Você não arrumou sua cama – você é uma garota tão má” ou “Se você realmente me amasse, você iria dormir”.
Um dos estudos recentes de Emily Loeb, que acompanhou crianças de 13 a 32 anos, descobriu que crianças cujos pais eram psicologicamente controladores eram menos bem-sucedidas academicamente e menos apreciadas por seus colegas na adolescência. Como adultos, eles também eram menos propensos a ter relacionamentos românticos saudáveis. Outra pesquisa vinculou o controle psicológico dos pais ao comportamento antissocial e à ansiedade em crianças.
Responsáveis que usam o controle psicológico geralmente têm boas intenções – eles acham que controlar seus filhos os tornará mais bem-sucedidos – mas “o tiro sai pela culatra”, disse Loeb. “Eles acabam lutando para pensar por si mesmos quando estão fora do controle da casa.”
E é isso que muitos adultos querem – que as crianças se tornem pensadoras independentes que às vezes questionam a autoridade e pensam fora da caixa. Em última análise, o que a pesquisa sugere é que uma parentalidade severa e rigorosa não planta sementes para um desenvolvimento saudável; faz o contrário. A curto prazo, com certeza, as crianças podem se comportar melhor. Porém, a longo prazo, as crianças sofrem.
“Nós realmente queremos que nossos filhos se conheçam e confiem em si mesmos e acreditem em si mesmos – e tudo isso será sacrificado se os pais forem os governantes de tudo”, disse Rebecca Hershberg. As crianças devem ser tratadas com respeito e devem sentir que suas opiniões e crenças têm valor.
Os problemas da paternidade ‘ permissiva’
Isso não quer dizer que as crianças não precisam de regras, limites ou consequências – elas certamente precisam. A chamada paternidade “permissiva” também pode causar problemas e tem sido associada ao egocentrismo infantil e ao controle deficiente dos impulsos. Emily Loeb distinguiu o controle psicológico inútil e o “controle comportamental” útil – quando os pais estabelecem limites e expectativas, como que as crianças tenham uma certa hora de dormir, precisem limpar o quarto todas as manhãs ou só tenham uma certa quantidade de tempo de tela a cada dia. Limites e regras são cruciais para o desenvolvimento saudável, disse ela.
A pesquisa sugere a adoção de um meio-termo, em que os pais têm grandes expectativas em relação aos filhos e estabelecem limites rígidos, mas também são calorosos e respeitosos com os filhos. Pesquisas mostram que ao serem educadas dessa forma, os menores têm melhor desempenho na escola do que seus colegas, são mais honestos com seus pais e também são gentis e compassivos.
No entanto, existem questões culturais a serem consideradas. A assertividade é interpretada de forma muito mais negativa, por exemplo, quando vem de uma criança negra do que de uma criança branca, enfatiza Dana E. Crawford, psicóloga clínica e pediátrica. Pesquisas mostram que crianças negras e latinas são mais propensas a serem disciplinadas na escola do que crianças brancas. Por causa disso, explicou Crawford, os pais de crianças não-brancas podem sentir que deveriam ser mais punitivos para proteger seus filhos dos efeitos do racismo, como expulsão ou violência policial. Eles também podem sentir que precisam ser pais duros para tornar seus filhos mais fortes.
Há um equilíbrio difícil de alcançar entre “ensinar com suavidade e empatia, mas também construir resiliência e fortaleza”, disse Crawford. Ainda assim, atualmente, entre os pais negros, existe um movimento em direção a um comportamento mais gentil, explicou.
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