Velha era a sua avó

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Aumento da expectativa de vida muda o perfil das mulheres com mais de 50 anos — e do relacionamento delas com os netos.
POR Sabrina Abreu
 
Roberta Zampetti e o pequeno Enzo
A apresentadora Roberta Zampetti e o pequeno Enzo, de 3 meses: “Quero ser uma realizadora de afeto, ler para ele, contar muitas histórias”.

Uma senhora de cabelos brancos, fala mansa, gestos delicados, coque no alto da cabeça e um par de óculos bem na ponta do nariz. Quando o assunto são as avós, não raro essa descrição salta à mente. A imagem, no entanto, está fadada a cair em desuso, no que depender de uma nova geração de mulheres — com mais de 50 anos — que mantém uma rotina com os netos, sim, mas sem se esquecer da ginástica, das viagens e do trabalho. É o caso da jornalista e apresentadora Roberta Zampetti. Prestes a virar sexagenária, ela se tornou avó em julho. A chegada do pequeno Enzo a levou a recordar os modelos de avós com quem conviveu. “Dona Maricota, minha avó materna, era uma senhorinha de cabelo branco”, conta. “Minha mãe, aos 60, só se vestia com tailleur, nunca colocou uma calça na vida, as duas eram completamente diferentes de como sou hoje.” Quase sempre de calça jeans e tênis, Roberta é vista por aí a bordo de um Smart verde-limão, um simpático carrinho de dois lugares.

O estilo dessa nova geração de avós pode ser explicado pelo aumento da expectativa de vida da população brasileira. Em 1980, essa expectativa era de 62,5 anos e, segundo dados da última pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referentes a 2013, passou a 74,9 anos. Uma mudança radical em pouco mais de trinta anos. Assim, crianças nascidas nos últimos anos têm mais chances de conviver com avós saudáveis e ativos — o que, segundo o educador e palestrante Mario Sérgio Cortella, é benéfico para quem está descobrindo o mundo. “O idoso, em geral, não tem tanta pressa, é mais paciente. Quem tem mais anos de experiência e é inteligente costuma também ser mais desapegado, focar o essencial”, afirma. “Enquanto vivemos numa sociedade que busca o excesso, essa pessoa pode demonstrar que muitas coisas são inúteis e cultivar a simplicidade.”

Roberta se encaixa bem nessa definição. Apesar de estar trabalhando em um livro e no projeto de um novo programa de TV, ela garante que sua prioridade é o neto. E, nos planos em relação ao menino, ela não se difere das vovós de antigamente. “Quero ser uma realizadora de afeto, ler para ele, contar muitas histórias”, diz. Para a jornalista, os pais devem passar seus valores aos filhos e os avós podem reforçá-los, mas não têm a mesma obrigação. “Se a criança souber que o pai e a mãe são a autoridades dentro de casa, os avós podem chegar e fazer um mimo, sem problemas”, acredita. A psicóloga Sara Campos explica que a criança tem de conseguir distinguir quem são as figuras de autoridade à sua volta. Não necessariamente serão os pais, ou apenas eles. Isso depende de cada arranjo familiar. É importante, entretanto, que a criança saiba quem são os adultos responsáveis por ela. “A família é o primeiro núcleo de socialização”, afirma. “Mais tarde, todo mundo acaba identificando outras autoridades, como os professores e chefes, tendo de construir relacionamentos saudáveis também com eles.” O ideal são os adultos — pais e avós — entrarem em acordo sobre quais regras querem passar para a criança, de modo a não confundi-la com informações e ensinamentos contraditórios. 

Marise Rache e os gêmeos Noah e Matteo
Marise Rache e os gêmeos Noah e Matteo, que deixam os brinquedos espalhados e já comera na cama: “Com meus filhos não era assim, não”.

Aos 56 anos, a empresária Marise Rache mora a 50 metros do apartamento de sua filha Carol, mãe de Noah e Matteo, de 4. As duas estão afinadas quanto à educação da dupla, o que inclui o máximo de independência e o mínimo de exposição a eletroeletrônicos. “Eles tomam café com xícara de louça, não damos copo de plástico, porque faz parte do aprendizado”, conta Marise. As crianças nã usam tablets nem smartphones, tanto na casa deles quanto na da avó. “Em vez disso, levo sempre comigo lápis de colorir e muitas folhas em branco.” Dona do restaurante D’Artagnan, no Lourdes, ela ama cozinhar com os pequenos. Os dois são também sua companhia preferida para ir à fazenda, onde brincam com os bichos e até tentam tirar leite das vacas. Apesar de manter as diretrizes propostas pela mãe dos meninos, Marise confessa que relaxou um pouco no papel de avó quando pensa em como era no trato com os próprios filhos, Raquel, hoje com 34 anos, Gabriel, de 32, e Carol, de 29. “Eu nunca deixei nenhum deles comer no quarto”, lembra. “Mas Noah e Matteo, um dia desses, estavam deitados comigo e pediram uma banana. Não consegui negar.” Ela mantém um quarto para os gêmeos em seu apartamento, mas se podem ver vários brinquedos espalhados pela sala. “Eu deixo, mas com os meus filhos não era assim, não. É coisa de avó.”

Pais Educam e avós deseducam?

O questionamento, que faz parte da rotina de muitas famílias, virou filme publicitário da marca de achocolatados Toddynho, no qual pais de crianças reclamam que os avós são muito permissivos. Nele, uma das mães entrevistadas afirma que “a avó sempre dá uma estragadinha”. Postado no Facebook no fim de agosto, em vinte dias o comercial alcançou mais de 44.000 compartilhamentos e 36.000 curtidas* na rede social. A surpresa no roteiro é a aparição dos avós, ao final, justificando seu comportamento. Como têm mais tempo para ficar com os netos do que tinham para estar com os próprios filhos quando pequenos, eles querem aproveitar essa oportunidade com mais diversão e menos rigidez.

*dados coletados até o fechamento da edição impressa da Canguru.

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