‘Há uma revolução paterna ocorrendo’, aponta estudo

Cerca de 37% dos pais ouvidos participa da rotina dos filhos e das tarefas domésticas

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Pesquisa Pais em Casa mostra maior interesse dos pais em cuidar dos filhos e das tarefas domésticas. Na foto, pai segura filho ao alto com os dois braços e ambos se olham nos olhos sorridentes
O levantamento ouviu quase 1800 famílias e teve como objetivo analisar o impacto da pandemia na divisão das tarefas de cuidado
Buscador de educadores parentais
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É sabido que as mulheres gastam mais tempo que os homens em cuidados com os filhos e a casa. E na pandemia essa situação se agravou, deixando muitas mães ainda mais sobrecarregadas. Ainda assim, há um movimento de mudança de comportamento dos pais quanto à distribuição das funções parentais, segundo mostra o estudo Pais em Casa.

O levantamento ouviu quase 1800 famílias e teve como objetivo analisar o impacto da pandemia na divisão das tarefas de cuidado e revelou que a maioria dos pais ouvidos (70%) declara incluir no cotidiano atividades relacionadas ao cuidado e à educação das crianças. Um total de 37% dos homens disseram dedicar 3 horas ou mais do seu dia para essas atividades sendo a compra de alimentos a tarefa da casa na qual eles mais se envolvem e a lavagem de roupas a que eles menos fazem.

“Ainda que a participação dos homens seja pequena e desigual em comparação às mulheres, é interessante ver que existem pais que estão se apoderando das atividades de cuidado e de casa. Se compararmos com dados de pesquisas anteriores é um crescimento significativo”, afirma um dos coordenadores da pesquisa, Leandro Ziotto, fundador da 4Daddy, site que fala sobre a participação paterna na criação dos filhos.

Para se ter uma ideia, no período anterior à pandemia do coronavírus, dados mostraram que 48% dos homens declararam achar desagradável ou humilhante o homem cuidar da casa enquanto a mulher trabalha fora e 35% afirmaram que cabe aos homens no máximo “ajudar” a mulher a cuidar da casa e dos filhos.

Para a pesquisadora de gênero Camila Pires Garcia, o estudo possibilita mostrar outras realidades. “O Brasil é altamente desigual, partimos de um cenário em que há violência doméstica, abandono parental. Existe um cenário vasto lamentável, mas queremos mostrar que há uma parcela que já apresenta uma outra forma de fazer família”, afirma Camila, que é mestranda em antropologia com foco em paternidades pela Universidade de Paris e também coordenou o estudo, junto com Tayná Leite, mestranda em sociologia na Universidade Federal do Paraná e colunista da Revista AzMina.

É interessante ver que 37% dos homens que responderam declararam dedicar 3 horas ou mais do seu dia para atividades de cuidado e atividades domésticas.

Leandro Ziotto, da 4Daddy

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Mulheres trabalham quase o dobro dos homens por semana

Apesar dos avanços na participação dos pais, a pesquisa também comprovou que o envolvimento da mulher ainda é maior nos afazeres da casa e demandas com os filhos. Um total de 63% das mães disseram gastar por dia mais de 3 horas com trabalho não remunerado. Em média, elas trabalham cerca de 21 horas por semana (veja gráfico abaixo) com trabalhos domésticos e de cuidados, quase o dobro dos homens, que dedicam cerca de 11 horas a essas demandas.

“As brasileiras além de realizar o dobro de trabalhos não remunerados, serem as principais responsáveis em todas as atividades feitas dentro de casa, ainda realizam cargas de trabalho remunerado equivalentes à dos homens, o que na média as faz trabalharem mais”, afirma a pesquisa Pais em Casa

Não é falta de aptidão: homens que moram sós se viram muito bem

E o estudo mostra que não se trata de falta de habilidade dos homens. Ao analisar aqueles que moram sozinhos com os filhos, observou-se que eles fazem as tarefas domésticas quase na mesma proporção que as mulheres. Por exemplo, em relação ao preparo das refeições, cuidados de crianças e idosos e auxílio nas atividades educacionais. “O que comprova que a falta de aptidão masculina é um mito construído discursivamente”, aponta a pesquisa. 

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Trabalhar de casa é tumultuado, mostra pesquisa

Numa comparação entre famílias com e sem filhos, o estudo indicou que as que têm criança em casa são as mais prejudicadas com o trabalho remoto. Na etapa de sondagem da percepção das mães, um dos temas mais recorrentes referia-se às dificuldades do trabalho home office. Um dos dados mostra que 20% dos pais e 31% das mães conseguiram trabalhar sem interrupções apenas 1 hora ou menos

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O que ELES dizem x o que ELAS dizem

A falta de consenso quanto a quem faz mais em casa também foi constatada no estudo. Cerca de 24% dos pais dizem realizar mais do que as parceiras, mas apenas 6% destas confirmaram ser isso verdade.  

A discrepância se repete ao compararmos o percentual de mães (74%) que declaram realizar mais do que os parceiros, sendo que entre eles, apenas 45% confirmam este cenário. Como ponto positivo, o percentual de respondentes que relatam existir uma divisão igualitária varia entre 20% (mães) e 37% (pais), o que apesar da diferença, confirma a existência de pelo menos 1/5 das famílias respondentes com um cenário equilibrado.

Ainda assim, na pesquisa qualitativa feita com 21 pais e 6 mães, a questão da divisão das tarefas de casa não foi colocada como grande preocupação pelos pais nem pelas mães, deixando esse posto para questões na dificuldade de ter uma rotina e como conciliar trabalho com filhos. As mulheres entrevistadas disseram que seus parceiros colocam empenho igual ao delas na casa e os vêem como uma parte da equipe, com rotinas estabelecidas a partir das demandas do trabalho remunerado. 

“[Elas] relatam ter expectativas em relação à participação paterna e divisão do cuidado, e que estas têm sido em grande parte correspondidas. Reconhecem que no início foi preciso estimular, mas que atualmente eles exercem a função de forma espontânea e autônoma”, indica a pesquisa, sobre as respostas das parceiras. Além disso, a comunicação entre o casal foi colocada como essencial durante a rotina da família e divisão de tarefas. 

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Quem eram os participantes da pesquisa Pais em Casa

A pesquisa foi dividida em 3 etapas:

  • uma primeira sondagem com mães, que falaram suas percepções quanto ao tema;
  • uma pesquisa quantitativa, com opiniões de 1554 pessoas, entre 261 homens e 1293 mulheres; 
  • uma análise qualitativa, entrevistando 21 pais e 6 mães

No total, o estudou ouviu quase 1800 famílias que estiveram pelo menos dois meses em isolamento social, trabalhando de forma remota. Os pesquisadores afirmam que a maior parte das famílias ouvidas é das classes A e B – 35% e 22%, respectivamente – e são pessoas que têm, de certa forma, uma afinidade com o assunto da paternidade ativa.

“Entretanto, mais que um recorte de classe, é preciso falar sobre um recorte comportamental. Os participantes são de um público que já estava engajado nisso, mas os dados continuam importantes porque mostram que mesmo tendo esse interesse no assunto, não significa que ele é convertido de forma automática para o dia a dia”, afirma Tayná Leite.

“Existe uma imaginário que isso (a participação dos pais no cuidado dos filhos) é uma coisa da classe média, mas não é verdade. Nós temos afeto em todas as classes, assim como violência, o que muda é a forma como é olhado.(…) Não podemos afirmar que apenas os homens de classe mais alta têm interesse nisso”, complementa a pesquisadora.

De acordo com os pesquisadores, também é importante salientar que o cuidado não se resume ao ato direto, como dar banho, alimentar, trocar de roupa, mas também a toda as pré-condições do cuidado e a gestão mental de tudo o que é necessário. Por exemplo, antes de alimentar uma criança, é necessário fazer a comida e, antes disso, que alguém saiba quais alimentos estão faltando para fazer a lista de compras. 

“Quando alguém se torna adulto atuante no mercado não é só pelo esforço pessoal, tudo é fruto também de uma pessoa ou do grupo de pessoas que dedicaram décadas para o seu cuidado”, complementa Leandro, sobre a importância de discutir o tema. 

As pessoas precisam entender que o cuidado é o pilar central para a manutenção à vida.
Não existiria sociedade, e nem economia tradicional (comércio, indústria, agronegócio) se não existisse a economia do cuidado

Leandro Ziotto, fundador da 4Daddy

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Maior participação paterna depende de mudança cultural

Segundo os pesquisadores, o estudo mostrou um movimento de engajamento por parte dos pais na reelaboração do papel paterno na dinâmica doméstica. “Uma mudança comportamental progressiva que encontrou no isolamento social, do perfil estudado, oportunidade de se consolidar em famílias que já promoviam o diálogo baseado em igualdade de gênero”, aponta o documento. 

Além disso, os pesquisadores afirmam que o isolamento obrigou as famílias a incorporarem novos hábitos, mas que “a maior participação dos homens no cuidado requer uma mudança cultural na sociedade quanto à construção de novas referências paternas, sociais e midiáticas”. 

Para Leandro, os dados mostram que mudanças estão acontecendo. “Há uma revolução paterna ocorrendo, porém ela ainda é silenciosa e lenta, devido a muitos obstáculos, como machismo cultural, estrutural e institucional; falta de políticas públicas; falta de engajamento das empresas; e falta de referências paternas positivas no imaginário popular”, diz.

Ele destaca ainda a necessidade de lutar por políticas públicas que visem aumentar a participação paterna, como aumento da licença paternidade e programa pré-natal do parceiro, além de incentivos para a iniciativa privada colocar os temas como prioridade. 

Há uma revolução paterna ocorrendo, porém ela ainda é silenciosa e lenta, devido há muitos obstáculos, como machismo cultural, estrutural e institucional; falta de políticas públicas; falta de engajamento das empresas; e falta de referências paternas e homens positivas no imaginário popular

Leandro Ziotto, da 4Daddy

Para saber mais, acesse a pesquisa completa!

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