Caso Sophia: especialistas da infância destacam importância de ações preventivas

Há muitas crianças vítimas de violência, sofrendo diariamente e esperando por socorro, alerta a psicóloga Leiliane Rocha; termo #JustiçaporSophia reúne milhares de postagens

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O pai biológico Jean Carlos Ocampo, seu companheiro, Igor de Andrade, e a filha de Jean, Sophia
O pai biológico Jean Carlos Ocampo e seu companheiro, Igor de Andrade, se queixam de uma "omissão sistêmica" por parte das autoridades
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“Quantas Sofias e Henrys vamos perder ainda? Até quando vamos aceitar piadinhas, memes, figurinhas subestimando a gravidade da violência contra a criança? Até quando vamos naturalizar a palmada, a grosseria, o desrespeito à infância?”, escreveu a pediatra Luiza Menezes, autora do perfil infancia_fora_da_caixa, no Instagram.

Sophia Jesus Ocampo, 2 anos, morreu na quinta-feira, 26 de janeiro, vítima de violência sexual e maus tratos. O laudo do corpo da garota, que vivia em Campo Grande (MS), apontou que ela sofreu traumatismo na coluna cervical e estupro. A mãe da menina, Stephanie de Jesus Da Silva, e o padrasto, Christian Campoçano Leitheim estão presos preventivamente pelos crimes de homicídio qualificado e estupro de vulnerável. 

O caso de Sophia causou comoção nacional e ganhou repercussão nas redes sociais, levando educadores, advogados, médicos, psicólogos, atores e influenciadores digitais a manifestarem sua revolta contra a violência e morte da menina. Muitos usaram o termo #JustiçaporSophia, que já reúne milhares de postagens nas plataformas.

Sophia chegou a ser atendida em postos de saúde de Campo Grande por 30 vezes antes de morrer, uma delas, por fraturar a tíbia, segundo dados da Polícia Civil. O pai biológico Jean Carlos Ocampo e seu companheiro, Igor de Andrade, dizem haver ocorrido uma “omissão sistêmica” por parte das autoridades na condução do caso. Técnico de enfermagem, Jean registrou boletins de ocorrência por maus tratos e fez inúmeras denúncias no Conselho Tutelar, tentando ainda conseguir a guarda da filha nos últimos 13 meses – o que não lhe foi concedido. Além da dor do luto, ele e o companheiro declararam estar indignados com as autoridades, que receberam diversos pedidos de socorro e poderiam ter evitado a morte da criança. 

Entre 2017 e 2020, 180 mil crianças e adolescentes sofreram violência sexual – uma média de 45 mil por ano e a maioria dos crimes ocorre na casa das próprias vítimas. É o que revela o Panorama da Violência Letal e Sexual contra Crianças e Adolescentes no Brasil, lançado no ano passado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).  

“Somos a base dessa pirâmide, sustentando a recorrência desses infanticídios”, afirma a pediatra Luiza Menezes.

Para evitar tragédias como essa, a pediatra diz ser essencial estudarmos os sinais de alarme para entender o que podemos fazer para reconhecer e ajudar essas vítimas. “Aprender a denunciar. Cobrar mais agilidade dos órgãos responsáveis. Todos nós! Pediatras, professores, familiares, amigos, vizinhos, eleitores. É urgente essa mudança”.

A psicóloga Leiliane Rocha, especialista em sexualidade, também se pronuinciou sobre o tema. Ela publicou um vídeo em que destaca a urgência de agir para a prevenção e proteção das crianças. Emocionada, não conteve o choro ao falar de Sophia e lembrou que há crianças sofrendo todos os dias, e que muitas sequer chegam ao nosso conhecimento.

“Muitas crianças estão esperando alguém perceber que elas estão sendo abusadas. Elas esperam a nossa proteção, acreditam que podemos fazê-lo. Por favor, não fique parado, não se cale, faça alguma coisa, busque informação, conhecimento”, alertou.

Leiliane disse que indignação sem ação não salva nem uma criança. “O que falta à sociedade, família, profissionais é o conhecimento da realidade da violência contra crianças. Conhecimento sobre o que cada um pode e deve fazer. Conhecimento sobre como lutar de verdade por esta causa”, complementou.

Para Leiliane Rocha “indignação sem ação não salva crianças” | Foto: @leilianerochapsicologa

O pesquisador e professor de educação Hugo Monteiro Ferreira, autor do livro A geração do quarto – quando crianças e adolescentes nos ensinam a amar, chamou a atenção para as denúncias feitas pelo pai de Sophia, que tentou, de toda forma, proteger a filha, mas não conseguiu. “O Estado falhou feio!!! Falharam todos. A negligência foi terrível. Mais uma criança morta diante dos nossos olhos atônitos!”

A advogada Luciana Temer, diretora do Instituto Liberta, que atua no combate à violência contra crianças e adolescentes, também lamentou a morte de Sophia. “O pior dessa história é que a Sophia, de 2 anos, teve 10 chances de ser salva. Porque o pai de Sophia e o companheiro dele denunciaram agressões que viram e o Estado não fez nada, assim como o sistema de saúde e o de justiça não fizeram nada. Falhamos com Sophia enquanto sociedade. Não podemos falhar com mais nenhuma menina. A lente da violência sexual contra crianças e adolescentes precisa ser colocada no Brasil já!”

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Fique atento a estes comportamentos

A Sociedade Brasileira de Pediatria produziu um Manual de atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência em que destaca aspectos como:

• Comportamento agressivo: a criança pode apresentar–se temerosa, arredia, agressiva e, com frequência, adotar posições de defesa, isto é, encolher-se e proteger o rosto, já que é uma região em que é agredida com frequência.

• Comportamento apático: pode, por outro lado, apresentar-se apática, sonolenta e triste, não esboçando qualquer defesa.

• Aspecto desnutrido: não raramente a desnutrição acompanha essas situações, algumas vezes com atraso importante do desenvolvimento neuromotor.

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