Janeiro branco: ‘por uma parentalidade mais equilibrada e com a ‘saúde mental em dia’’

Em depoimento ao criador de conteúdo digital Niltinho Ricardo, a gestora de projetos Laurisse Bizarro fala sobre sobrecarga materna, a importância do pai e da rede de apoio para a criação dos filhos

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Laurisse Bizarro, mãe ativista fala sobre janeiro Branco
"Dar conta de tudo não existe", diz Laurisse Bizarro
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Você já percebeu que alguns meses do ano são associados a cores? Setembro Amarelo, Outubro Rosa e Novembro Azul são exemplos de meses que remetem à conscientização e prevenção ao suicídio, conscientização e combate ao câncer de mama, e conscientização e combate ao câncer de próstata, respectivamente.

O mês de janeiro também faz parte desse calendário. Criado em 2014 por psicólogos, o Janeiro Branco busca discutir a importância do cuidado na busca pela qualidade de vida, promovendo ações preventivas contra as doenças mentais. A campanha tem o objetivo de fazer um alerta para os cuidados consigo e com os outros. Daí a importância da pergunta: quem cuida de quem cuida?

Pensando nisso, conversei sobre o tema com Laurisse Bizzarro, mulher que ao se tornar mãe, se viu inconformada com a maternidade real, não conseguiu ‘dar conta de tudo’, fez ano sabático, transição de carreira e hoje é mãe ativista e gestora de projetos na Filhos no Currículo, consultoria para criação de programas corporativos de parentalidade.

Ela deu um relato pessoal incrível acerca da importância da saúde mental materna na qual irei compartilhar abaixo:

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“Olá, eu sou a Lau, mãe da Alícia de 5 aninhos. Como você pode imaginar, minha vida se transformou com a maternidade (nenhuma novidade, né?), aliás, se a vida de alguém não se transformar com a chegada de um filho, desconfio que alguma coisa não está certa. E quando falo em ‘transformar’, quero dizer que, com a parentalidade, surgem coisas maravilhosas, mas assustadoras também. 

Logo que veio a surpresa e a alegria com a descoberta da gestação também se instalou o medo. Medo de não ser capaz de gestar, do morfológico não estar bem, de contar sobre a gestação no trabalho e ter a carreira e a saúde financeira impactadas, de ser enganada por profissionais da saúde em relação às minhas preferências de conduta, de não ser capaz de parir, amamentar, educar, proteger e etc. Desconfio que a lista de medo cresce junto com os filhos.

Esses medos muitas vezes são invalidados, coisa de ‘mãezinha’, sabe? – aqui destaco o ranço que tenho desse título! 

Dizem que nós, mulheres, amadurecemos mais rápido (e a gente acredita), dizem que temos o instinto materno (e a gente acredita), tanto que não costumamos nos preparar durante a gestação para a demanda que está por vir. No máximo, a gente se prepara um pouquinho para o parto, mas de repente já estamos com um mini ser humaninho totalmente dependente no colo e demandante de toda nossa capacidade vital, e você, que achava que seria tranquilo, se vê sem conseguir suprir a demanda do bebê e nem a própria demanda, como banho, sono, cocô, xixi, tomar água, se alimentar, interagir com adultos. E a casa, as roupas, a comida, consultas médicas, vacinas? Socorro, peraí, quem decidiu que essas coisas eram responsabilidade minha?

Só de lembrar da angústia dessa constatação, até os ossos se arrepiam. E o mais maluco disso tudo é que você começa a acreditar que essa é sua nova vida sem controle e tudo será assim, sem autonomia, para sempre. Mas é difícil mesmo raciocinar quando não se consegue mais ter as próprias necessidades básicas supridas, junto com um neném que precisa de você para sobreviver, não acha?

E aí,você ouve frases como: “Ei! Por que você está reclamando com um bebê abençoado nos braços?”, “Lembre-se de ser grata, não queria ter filhos?”, “Na hora de fazer, não reclamou, né?”, “Ué, achou que seria um mar de rosas?”, “Ser mãe é padecer no paraíso, nunca ouviu falar?”, “Quem pariu, que carregue…” E é assim que a ‘aldeia’ que você idealizou desencanta. Caramba, mas o que eu fiz de errado? Porque as pessoas que antes sorriam de graça ao ver minha barrigona, agora me atravessam com palpites invasivos, cobranças infinitas e julgamentos?

Sem mais ‘delongas’: 4 em cada 10 mulheres-mães têm depressão. A sobrecarga do cuidado recai sobre os mesmos corpos que gestam, que dão à luz e nutrem as crianças. Se esse corpo adoece, as consequências virão para si, para as crianças sob os cuidados dela e para toda a sociedade, atual e futura.

Alguma vez você já refletiu como seria a sua vida se sua mãe não tivesse cuidado de você? Será que você já conhecia a dimensão da importância desse papel para as famílias e para a continuação da humanidade? Mãe é estrutura, e se a estrutura de uma obra fica instável, o que acontece?

A rede de apoio é uma das soluções mais potentes para proteger a saúde mental materna. É importante ressaltar que a rede de apoio é para a nova família, sendo que o pai é parte da família, não parte da rede de apoio, portanto não ‘ajuda’, participa exercendo a sua função paterna, que também é fundamental. A função da rede de apoio é assumir tarefas que possibilitem que os responsáveis pela criança consigam se dedicar também à própria recuperação física, emocional e social.

Há muito para evoluirmos em direção a uma parentalidade mais equilibrada e com ‘saúde mental em dia’ e um dos pontos cruciais para evitar o adoecimento de puérperas pela sobrecarga mental é que a responsabilidade seja equilibrada por ambos cuidadores, que os homens entendam a importância de seu papel no cuidado com os filhos e com o lar e que, inclusive, a licença paternidade seja equiparada à licença maternidade o quanto antes, como forma de permitir à família que se apoie e se adapte à nova realidade, sem ônus para apenas um dos lados, na vida e no mercado de trabalho.

Mulheres-mães, não abram mão daquilo que lhes faz bem, levantem a mão, busquem ajuda profissional e saibam que ‘dar conta de tudo’ não existe, é preciso uma aldeia para criar uma criança, lembram? Formem as suas aldeias possíveis e recordem sempre que essa fase vai passar sim, mas enquanto não passa, permitam-se sentir, pedir ajuda e serem apoiadas.”

*Este texto é de responsabilidade do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Canguru News.

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