Um dos principais estudos já feitos sobre o impacto do trauma infantil no cérebro, realizado pela Universidade de Essex, no Reino Unido, revelou como o abuso físico, abuso sexual e negligência na infância podem alterar o desenvolvimento cerebral, reconfigurando importantes vias neurais envolvidas em aspectos como foco em si mesmo e resolução de problemas. Tais alterações podem levar a dificuldades emocionais, de empatia e na autopercepção do corpo em crianças que sofreram abuso, aponta a psicóloga norte-americana Megan Klabunde que coordenou a pesquisa.
“Os resultados desse estudo são alarmantes, pois mostram que as crianças que passaram por experiências traumáticas não apenas enfrentam dificuldades emocionais, mas também lutam para compreender e processar as sensações dentro de seus corpos. Isso afeta profundamente a forma como elas se relacionam consigo mesmas e com os outros, principalmente na vida adulta, nos ambientes familiares e corporativos”, afirma a biomédica Telma Abrahão, especialista em neurociência, traumas e infância.
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Ela explica que identificar essas alterações nas redes neurais permite direcionar melhor os tratamentos para crianças que sofreram maus-tratos. “É fundamental que as terapias de trauma infantil não se concentrem apenas em evitar situações de medo e em abordar pensamentos traumáticos, mas também em tratar os impactos do trauma no corpo, na percepção de si mesmo, no processamento emocional e na empatia”, alerta Telma, autora dos best-sellers “Pais que evoluem” e “Educar é um ato de amor, mas também é ciência”.
O estudo revisou 14 pesquisas envolvendo mais de 580 crianças, destacando como o trauma infantil pode influenciar a atividade neurológica e a saúde mental ao longo da vida. “Compreender como o trauma impacta o desenvolvimento infantil é essencial para expandir intervenções eficazes que possam ajudar essas crianças a reconstruir seu senso de identidade e melhorar suas habilidades de relacionamento que reflete até na vida adulta”, ressalta a especialista.
Segundo Telma, pais e cuidadores desempenham um papel fundamental na formação ou prevenção de traumas na infância. “O abuso físico e emocional, bem como a negligência, são fatores que podem causar danos duradouros no desenvolvimento cerebral das crianças. A violência e a falta de cuidados básicos criam um ambiente de medo e insegurança, prejudicando a capacidade das crianças de confiar nos outros e desenvolver um senso saudável de identidade”, relata.
De acordo com a especialista, ambientes instáveis, marcados por conflitos constantes e insegurança financeira, também geram estresse crônico nas crianças, afetando seu desenvolvimento neurológico. A ausência de amor, carinho e validação emocional pode resultar em sentimentos de rejeição e solidão, fazendo com que as crianças internalizem uma visão negativa de si mesmas.
“A exposição a traumas secundários, como testemunhar violência doméstica ou abuso de substâncias tóxicas, também afeta profundamente o bem-estar emocional das crianças, mesmo que não sejam vítimas diretas. Por isso, pais e cuidadores devem promover ambientes seguros, amorosos e estáveis para garantir o desenvolvimento saudável dos filhos. A conscientização sobre o impacto de suas ações é essencial para prevenir traumas e fomentar um crescimento equilibrado e positivo”, finaliza Telma.