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Solidão materna, o peso da sobrecarga
O tempo todo ouvimos falar em “culpa materna”, mas alguém já ouviu falar em culpa paterna? A culpa é sempre da mãe. A mãe se culpa, a sociedade culpa a mãe. E fim.
Aí chega o “Dia das Mães” e todo mundo quer dar de presente, vender presente…
Há mais de uma década entendi que não devo julgar uma mãe, nem devo me julgar. Me perdoo pelas vezes que errei tentando acertar. Por ter entendido que a maternidade precisa de doses cavalares de autocompaixão.
A mãe se julga, o filho absolve? Não é assim que funciona. A absolvição tem que ser nossa, nosso não julgamento. Nenhuma mãe é culpada por não ter apoio, por precisar trabalhar muito e ter pouco tempo para os filhos. O sistema não nos oferece as melhores condições para criar filhos. A sociedade não cuida das mães nem das crianças.
As questões da maternidade não devem ser tratadas de forma individual, elas são coletivas. É preciso ver o todo.
Amamentar é uma questão de saúde pública. Mas existe uma pressão social, um incentivo ao uso de fórmulas e mamadeiras, mesmo quando a amamentação está indo bem. E se não vai bem, tudo bem também. Não conseguir amamentar não é um crime, nem é sobre amor. Nenhuma mãe é culpada de nada.
A solidão da maternidade, a pressão externa, a falta de apoio, nada disso é culpa da mãe.
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Foi-se o tempo em que eu me condenava, e que julgava outras mães por estarem fazendo o que davam conta. Muitas vezes sozinhas, muitas vezes invisíveis. Sobrecarregadas, exaustas e sem ninguém com quem dividir todo esse peso.
Eu não espero que sejamos absolvidas por nossos filhos, nem pela sociedade. Na maternidade não há espaço para júri nem juiz. Nossas questões são muito mais profundas do que a culpa por dar mamadeira ou chupeta, por ter que trabalhar demais, por ter de deixar o filho na creche o dia inteiro ou na frente da tela para conseguir dar conta de tudo. Ou ainda por não conseguir sentar-se para brincar. Somos a consequência – a causa, o culpado é o sistema.
No Brasil, mais de 11 milhões de mulheres são chefes de família e precisam cuidar dos filhos, trabalhar para sustentar a todos e ainda lidar com a falta de dinheiro. A mãe tem que controlar o que os filhos fazem na escola, em casa, na rua, na internet. A mãe não tem tempo de pensar em cuidar da saúde mental. Isso se chama sobrecarga materna. E o pai? Tem pai que ajuda, tem pai que divide, mas geralmente o pai está torturando essa mulher, atrasando pagamento de pensão alimentícia, ou sumido no mundo como se nunca tivesse feito filho nenhum. Essa é a realidade de uma parcela enorme das famílias brasileiras. Famílias chefiadas por mães solo.
Um sistema que não nos dá escolhas, que explora, tira nosso sangue e não permite que a gente consiga se dedicar aos nossos filhos como nós gostaríamos e como toda criança merece. Nos adoece, física e emocionalmente. Não enxerga que milhares de mães vêm passando por um adoecimento psíquico, um esgotamento emocional. A mãe, por mais que precise de ajuda, não para, não pede ajuda. Tenta dar conta de tudo. Quando uma mãe está em desespero, não aparece uma alma para apoiar. Quem cuida de quem cuida?
*Este texto é de responsabilidade do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Canguru News.
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Bebel Soares
Bebel Soares é arquiteta urbanista, psicanalista, escritora, mãe do Felipe e fundadora da comunidade materna Padecendo no Paraíso, onde informa e dá suporte a mães desde 2011.
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