Ler e escrever são habilidades básicas de qualquer ser humano. Neste 8 de setembro se comemora o Dia Mundial da Alfabetização, data criada pela Organização das Nações Unidas (ONU), por meio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em 1967. O objetivo de chamar a atenção para a alfabetização, em todo o mundo, é ressaltar a sua importância para o desenvolvimento social e econômico das nações.
De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua Educação, o Brasil ainda possui 11 milhões de analfabetos. No caso, adultos que não tiveram acesso à educação e sequer conseguem escrever um simples recado. Visando a expandir a alfabetização no país, o Plano Nacional de Educação prevê, entre as suas metas, “alfabetizar todas as crianças, no máximo, até o final do 3º (terceiro) ano do ensino fundamental”.
Segundo o documento, em 2010 15,2% das crianças brasileiras com 8 anos de idade, cursando o ensino fundamental, eram analfabetas. Em estados como Maranhão e Pará, esse índice era de aproximadamente 30% da população nessa mesma faixa etária. Por isso, estabeleceu-se que os três primeiros anos do ensino fundamental (6 anos até 9 anos) seriam dedicados à alfabetização e ao letramento, ao desenvolvimento de formas de expressão, bem como o aprendizado de outras disciplinas como matemática, ciência, história e geografia.
Mas por que a definição desse período para alfabetizar crianças? Algumas escolas iniciam o processo formal de alfabetização ainda na educação infantil, mas outras realizam esse trabalho somente nos primeiros anos do ensino fundamental.”Há diferentes bases teóricas que fundamentam o período ideal para a alfabetização das crianças, mas, no caso do Brasil, houve um período em que as crianças eram alfabetizadas na então primeira série por meio do uso de cartilhas que apresentavam conteúdos desconexos, e a alfabetização ocorria por meio do treino, da repetição e da memorização dos sons”, explica Renata Weffort, coordenadora pedagógica da educação infantil e do primeiro ano do Colégio Franciscano Pio XII em São Paulo (SP), também doutora em educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Segundo a especialista, o cenário se modificou conforme pesquisas na área de aprendizagem da língua escrita e da educação infantil demonstraram que o processo ia além da decodificação, em que a criança é ativa frente à aquisição do conhecimento.
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Afinal, o que é a alfabetização?
De acordo com a organização Waterford, dedicada à promoção da alfabetização, o letramento não é tão simples quanto decodificar frases. Desde os primeiros anos de vida, as crianças desenvolvem habilidades que irão ajudá-las a interpretar textos no futuro. Pesquisas recentes demonstram que famílias que introduzem a leitura às crianças e se engajam em práticas educativas tendem a fazer com que os filhos sejam alfabetizados mais rápido quando o processo formal de fato começar.
“A alfabetização se inicia no nascimento, desde que a criança se insere em uma comunidade e que a leitura e a escrita têm uma função social definida. O tempo inteiro estão expostas a textos e todas essas informações são assimiladas. A partir de associações entre elas, os pequenos percebem a função desses textos, suas características, que letras se repetem da mesma forma para escrever determinadas palavras (como seu nome, de marcas, nomes de histórias e etc) e outras característica do sistema de escrita”, explica Marina Pedrosa, coordenadora da educação infantil e do primeiro ano do Colégio Augusto Laranja em São Paulo (SP).
De acordo com Renata Weffort, quando falamos sobre alfabetização, existem duas dimensões. “A primeira é a do letramento, com foco nas práticas sociais de linguagem mediadas pela oralidade, leitura de imagens e contato com os diferentes textos que circulam socialmente. Podemos dizer que esse processo se inicia desde o nascimento”, elucida. A segunda dimensão consiste em decifrar a escrita como um código, aprender a ler e escrever.
“Esse processo se inicia, pensando na escola, na educação infantil, em que as crianças vão construindo suas hipóteses de escrita. Inicialmente, por meio de rabiscos e, gradativamente, vão conhecendo as letras e realizando escritas espontâneas, que indicam sua compreensão da escrita como sistema de representação da língua”, afirma a especialista.
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Existe uma idade certa para aprender a ler e a escrever?
Segundo educadores, isso depende do desenvolvimento de cada criança e do ambiente ao qual ela é exposta desde o nascimento. “A alfabetização é um processo, ou seja, antes de se pegar no lápis a criança deve ter passado pela manipulação de várias texturas e objetos afim de desenvolver esse tipo de apreensão e sensação (pegar no lápis). Anteriormente ao estágio de saber nomes e sons de letras, esse indivíduo tem que ter ouvido histórias, cantigas e parlendas, ter brincado com as rimas e sons. Esse conjunto de estímulos são ampliados ano a ano até que se chegue a alfabetização propriamente dita e quando o sistema neurológico dessa criança estará pronto para realizar tal habilidade”, explica a neuropsicopedagoga Christiane Gilberto.
Além disso, a criança tem que ter passado pelo desenvolvimento de habilidades de coordenação motora global e fina. “Primeiro, ela controla o próprio corpo como um todo e, posteriormente, controla sua mãozinha ao escrever”, especifica Christiane. Estima-se que, perto dos três anos de idade, os pequenos começam a construir o próprio vocabulário e desenvolvem algumas noções de gramática. Mesmo assim, a alfabetização formal depende, em parte, do tipo de escola em que a criança está matriculada.
A tradicional, mais disseminada no país, tem o objetivo de transmitir o conhecimento dos professores aos alunos. Por volta dos sete anos, as crianças costumam estar alfabetizadas. “Consideramos que a criança tem até o final do primeiro ano para efetivamente concluir seu processo de aquisição da leitura e escrita, ou seja, estar alfabetizada convencionalmente”, explica Marina Pedrosa.
Já a comportamentalista é similar, porém mais focada no aprendizado de técnicas, processos e contato com materiais. Por outro lado, as construtivistas colocam o aluno em evidência, como protagonista da construção do seu conhecimento, formulando hipóteses e trabalhando a autonomia.
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Escolas montessorianas, por exemplo, permitem que as crianças escolham o que querem aprender no dia, mas todas precisam cumprir os módulos obrigatórios. As salas de aula misturam crianças de diversas idades e os alunos são responsáveis pelo próprio aprendizado. Por volta dos cinco ou seis anos utilizam a linguagem escrita.
Já a escola Waldorf possui três ciclos e conta com tutores para acompanhar os alunos. A alfabetização só ocorre depois dos sete anos. Antes disso, a ênfase é dada aos trabalhos manuais e à arte.
Apesar de algumas vertentes salientarem que as crianças não desenvolvem habilidades motoras, como segurar um lápis, tão cedo, esses fatores não impactam drasticamente a alfabetização. Porém, determinadas atitudes de educadores e pais podem afetar o processo.
“O que pode comprometer o desenvolvimento da criança é o foco excessivo na alfabetização precoce em detrimentos de experiências que envolvam brincar, experimentar, criar e interagir. Do mesmo modo, o contato tardio com o universo letrado, com as histórias e com os textos que circulam socialmente, pode sim ocasionar uma perda, do ponto de vista da aquisição de vocabulário, repertório de escrita e interação”, pontua Renata.
Marina Pedrosa também destaca que muita exposição à escrita desde cedo provavelmente tira tempo de outros aprendizados fundamentais da infância, especialmente no que concerne às dimensões sociais, motoras, artísticas e afetivas.
“Portanto, O que afeta é a falta de equilíbrio entre essas dimensões ao longo do início da escolaridade”, afirma Marina Pedrosa.
A maneira correta de estimular a alfabetização
Segundo a organização Waterford, há algumas medidas que os pais podem adotar em casa para facilitar o processo, mas devem se lembrar de que a alfabetização depende do desenvolvimento de cada criança.
Vários fatores podem postergar o aprendizado, como dificuldades cognitivas e até mesmo condições socioeconômicas. No entanto, se desejam estimular as crianças dentro de casa, podem praticar algumas das atitudes a seguir:
- Visitar bibliotecas ou livrarias com regularidade para ajudar no reconhecimento das letras impressas e encorajar o interesse pela leitura.
- Ensinar as letras do alfabeto e sua pronúncia.
- Durante a leitura de um livro, apontar para as letras ou símbolos e perguntar à criança qual é o som.
- Não forçar leituras muito longas. Procure ler pequenos trechos diariamente, mas sem exagerar.
- Questionar situações das histórias a fim de promover pensamentos críticos. Por exemplo: o que você faria se fosse o personagem?
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