Você sabia que a culpa materna pode influenciar a forma como seus filhos lidarão com a autocompaixão no futuro? Foi o que constatou a pesquisadora Adriana Drulla Rossi, brasileira que concluiu um mestrado em Psicologia Positiva na Universidade da Pennsylvania (UPenn), na Filadélfia, nos Estados Unidos. Ela elaborou um estudo em parceria com um dos maiores nomes na pesquisa sobre autocompaixão e mindfulness, a americana Karen Bluth, e apresentou seus resultados durante o Parenting Brasil – 1º Congresso Internacional de Educação Parental.
“A culpa pode ser definida como uma emoção desconfortável, que surge quando percebemos que nosso comportamento causou prejuízo a outra pessoa”, explica Adriana. Geralmente, o sentimento se faz mais presente em relações próximas, em que nos importamos com a outra pessoa. Por isso, nada mais natural que a culpa apareça no relacionamento entre mães e filhos. A pesquisadora revela que tal emoção tem uma função importante no desenvolvimento humano: “a culpa nos leva a escolher melhores comportamentos da próxima vez, comportamentos mais alinhados com as nossas expectativas e valores”.
Segundo Adriana, sabemos que a culpa acontece para motivar uma maior coerência entre nossas ações. Mas no caso da culpa materna, as expectativas são inatingíveis e os valores incoerentes, logo é impossível se adequar. Existe um paradigma que reforça a ideia de que a mãe ideal é aquela que se dedica 100% aos filhos, destinando toda a energia física, mental e psicológica para a criação da criança. No entanto, quando esse padrão não é alcançado – na maioria das vezes não é –, sentimentos como frustração, raiva, incômodo e culpa afetam o bem-estar da mãe.
“Autocompaixão é sobre entender que nossos defeitos fazem parte de nós, mas não nos definem”
Segundo Adriana, o ato de ter compaixão consigo mesma enquanto mãe é benéfico não somente para sua saúde mental, mas também para a saúde emocional dos seus filhos. Por meio de dados, a pesquisa demonstrou que adolescentes com mães autocompassivas se tornam mais resilientes e também praticam a autocompaixão, característica indispensável em uma sociedade em que somos expostos diariamente a comparações.
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A pesquisa
O estudo Transmissão Intergeracional da Autocompaixão, realizado por Adriana Drulla Rossi e Karen Bluth, foi feito com 246 pares de mães e filhos adolescentes (com idades entre 12 e 15 anos), todos residentes dos Estados Unidos. A metodologia adotada foi a aplicação de questionários que identificassem determinados critérios, como: autocompaixão materna, autoeficácia parental, apego do adolescente à mãe, autocompaixão adolescente e percepção do adolescente sobre o controle psicológico materno.
A partir das respostas, constatou-se que a autocompaixão materna foi diretamente relacionada à autocompaixão dos adolescentes. Ou seja, mães que aceitam melhor suas imperfeições influenciam seus filhos para que façam o mesmo. Além disso, ao se aceitar, as mães se sentem mais eficazes no papel parental e isso pode favorecer uma relação de apego positivo do adolescente com a mãe. .
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Como lidar com a culpa materna?
A autocompaixão é fundamental para lidarmos com a culpa materna, segundo a pesquisadora, e ela pode entendida por meio de três elementos:
1) Mindfulness: visão realista sobre as dificuldades em vez de superidentificação ou negação;
2) Humanidade comum: é o entendimento que erros e imperfeições são comuns a todos os seres humanos, ou seja, erros não indicam inferioridade mas igualdade;
3) Auto-bondade: envolve acalmar e cuidar de si mesmo durante uma dificuldade, é sobre ter um diálogo interno mais gentil e solidário em vez de punitivo e crítico.
“A autocompaixão é a capacidade de fornecer suporte emocional a si mesmo, enfrentando desafios e adversidades com maior perspectiva e com a compreensão de que as dificuldades são comuns a todas as pessoas”, relata a pesquisadora brasileira. Outro ponto discutido no trabalho foi o fato de que mães autocompassivas se sentem mais competentes na função parental, isso porque não encaram as dificuldades da maternidade como uma indicação de incompetência.
Também foi apresentado à discussão o tópico de que filhos de mães autocompassivas se sentem mais ligados afetivamente às progenitoras, reportando mais confiança e comunicação mais aberta e amorosa entre os dois. Ao abrir mão da ideia de ser tornar uma mãe perfeita, as mulheres conseguem aceitar que os filhos também têm defeitos. Deixando de premiar a criança apenas quando ela acerta e ensinando a não se culpar ou se diminuir quando ela erra. Sendo que, quando a criança se sente aceita por quem ela é, não precisa achar que para receber amor tem que mudar, desenvolvendo um autoconceito mais positivo e maior autocompaixão.
Adriana elenca os benefícios que a autocompassividade pode oferecer para os adolescentes: ser menos vulnerável à avaliação do outro, sofrer menos com a comparação social, ter um relacionamento saudável com o próprio corpo, ter melhor desempenho acadêmico e ter menos problemas emocionais.
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