Os estímulos dados às crianças durante a infância ditam diversos comportamentos futuros. De acordo com especialistas, é nesse momento da vida que muitas habilidades cognitivas e sociais são formadas. E uma das formas que isso acontece é a partir de brincadeiras. Pensando nisso, pesquisadores da Universidade de Cardiff, na Grã-Bretanha, resolveram observar como o cérebro reagia a uma atividade específica: brincar de boneca.
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Entenda a pesquisa
Professores do Centro de Ciências do Desenvolvimento Humano da Universidade de Cardiff, conceituada instituição da Grã-Bretanha, utilizaram a neurociência e imagens para entender a resposta cerebral das crianças em determinadas atividades.
Foram escolhidas 42 crianças, sendo 20 meninos e 22 meninas, com idade entre 4 e 8 anos. Desses, apenas 33 tiveram os dados completos coletados. A atividade cerebral era monitorada por meio de chapéus que permitiam o livre movimento da criança, não limitando assim suas brincadeiras.
As atividades foram divididas em sessões:
- brincar de boneca por conta própria;
- brincar de boneca junto com outra pessoa (assistente);
- jogar no tablet sozinho;
- jogar no tablet com outra pessoa.
Em todas as partes, houve a preocupação dos pesquisadores em fornecerem brincadeira que permitissem o “livre brincar”, ou seja, que a criança não fosse guiada a resolver um problema ou completar um desafio. Dessa forma, os jogos no tablet também permitiam que a criança “montasse” sua própria diversão, sem seguir regras.
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O que os resultados mostraram
A pesquisa revelou que durante os dois tipos de brincadeira – com o tablet e com a boneca –, o sulco temporal superior posterior (PSTS), uma região do cérebro associada ao processamento de informações sociais como a empatia, era ativada, mesmo quando a criança estava sozinha – e isso vale tanto para meninas quanto para meninos.
Entretanto, mesmo que brincar de boneca e jogar no tablet (considerando jogos criativos) ativem a mesma região do cérebro, foi possível notar uma diferença nessa reação: quando as crianças jogavam sozinhas com o tablet, mesmo com atividades livres, essa área foi muito menos ativada.
A professora Dra. Sarah Gerson, que comandou a pesquisa, explica que usamos essa área do cérebro quando pensamos em outras pessoas, especialmente sobre seus sentimentos. As bonecas estimulam as crianças a criarem seus próprios mundos imaginários, ao contrário dos jogos de construção ou de resolução de problemas. Elas são incentivadas a pensar sobre outras pessoas e como elas podem interagir umas com as outras.”
O estudo mostra, segundo ela, que brincar de boneca ajuda as crianças a treinarem habilidades sociais importantes para sua vivência em sociedade para o resto da vida.
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91% dos pais veem a empatia como uma habilidade social chave
Existe uma preocupação dos pais em momento de isolamento: será que as crianças vão conseguir desenvolver habilidades sociais mesmo estando com o contato limitado pela pandemia de coronavírus?
De acordo com uma outra pesquisa sobre as percepções dos pais quanto às habilidades desenvolvidas pelas crianças durante a brincadeira, 70% dos pais disseram estar preocupados em como o isolamento social pode afetar seu filho na forma de interação com outros. Além disso, 91% deles afirmam considerar a empatia uma habilidade emocional importante que eles gostariam que seus filhos desenvolvessem.
Mas, como dito antes, é possível estimular essas habilidades mesmo quando a criança não tem companhia, já que a área do cérebro relacionada a interações sociais e empatia é ativada também quando a criança está brincando sozinha de boneca.
Para aqueles que querem saber mais detalhes do estudo da Universidade de Cardiff, feito em parceria com a Mattel, fabricante de brinquedos e bonecas como a Barbie, os resultados foram publicados na Frontiers in Human Neuroscience com o título ‘Explorando os benefícios da brincadeira de boneca através da neurociência‘ (em inglês).
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A importância da empatia
O desenvolvimento emocional das crianças é considerado, cada vez mais, tão importante quanto o cognitivo. Tanto que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabelece 10 competências gerais que devem ser desenvolvidas durante o Ensino Básico e que envolvem, entre outras habilidades sociais, a empatia e a cooperação.
Isso porque a ideia de que é necessário desenvolver apenas a “parte” cognitiva do cérebro está ultrapassada. Em entrevista para a Canguru News, a socióloga e professora Maria Helena Guimarães de Castro, que presidiu o comitê da pasta responsável pela finalização da BNCC, diz que não deve existir essa separação. “São habilidades gerais, não tem como separar uma da outra, a criança precisa aprender a ser solidária, respeitar o outro, ter responsabilidade, a saber conviver. Ela precisa aprender a ler e resolver problemas, a ser cidadã do mundo, a respeitar a diversidade e a se comunicar”, disse a socióloga.
Ou seja, a partir do desenvolvimento da empatia, a criança se torna uma adulto mais propenso a ser solidário, respeitar o próximo e lidar com as diferenças, habilidades importantes para a vida em sociedade.
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