Quais os sinais do vício de crianças em aparelhos eletrônicos? 

Psicólogo explica como a hiperconexão impacta a saúde mental dos jovens; ele aponta mudanças nos padrões comportamentais que devem ser observados pelos pais

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Menina olha para tela do celular em ambiente escuro
Dependência do mundo virtual pode ser sintoma da busca pelo pertencimento
Buscador de educadores parentais
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Cerca de 25 milhões de crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos eram usuários de internet em 2023, segundo dados da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2023, realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil. O uso de Internet e a posse de celular também cresceram entre crianças de até 8 anos, no período de 2015 a 2024, revela análise recém-divulgada, feita com dados das pesquisas TIC Domicílios e TIC Kids Online Brasil. 

Esses números servem de alerta para os impactos da tecnologia na saúde mental de crianças e adolescente. Um dos aspectos mais preocupantes diz respeito ao uso cada vez maior e mais cedo das redes sociais e dos chamados feeds infinitos, que consistem em uma série de publicações que formam um fluxo contínuo de conteúdos.  

“Os feeds infinitos são projetados para estimular a hiperconectividade e, no caso de jovens, devemos observar se a relação com o meio virtual dilui a experiência de privacidade e solitude, necessárias na formação da identidade”, afirma Marcos Torati, psicólogo e mestre em psicologia clínica pela PUC-SP. 

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Ele explica que postar e compartilhar conteúdos com grande frequência, visando ser reconhecido, pode ser um comportamento alarmante. Nesse caso, “a dependência do mundo digital não é a raiz do problema e sim um sintoma de uma busca emocional para pertencer”, destaca Marcos. 

Segundo o especialista, a ausência de pausas nos feeds infinitos pode reforçar a tendência à instantaneidade, dificultando o manejo da capacidade de espera, o que se conecta com o conceito de FOMO (sigla em inglês para Fear of Missing Out), que se refere ao medo de não conseguir acompanhar as atualizações dos eventos. Além disso, o excesso de estímulos e conteúdos apresentados em alta velocidade pode banalizar as experiências, reduzindo a capacidade de atenção e a qualidade do tempo na plataforma. 

“Redes sociais combinam conteúdos personalizados, reprodução automática e recompensas imprevisíveis para manter a atenção dos usuários, o que pode provocar no indivíduo um estado alterado de consciência, comparável à hipnose, pois o foco intenso, aliado ao relaxamento psicológico, favorece a alienação do mundo exterior. Essa desconexão resulta em procrastinação e perda de noção corporal e do tempo social”, comenta ele. 

Como pais e responsáveis podem identificar questões de saúde mental nos filhos? 

É preciso estar atento ao comportamento dos jovens para orientá-los sobre os riscos do uso excessivo de redes sociais e das interações com desconhecidos. Mas, para que a proibição e o diálogo sejam entendidos como expressões de cuidado, os pais devem primeiro avaliar a si próprios, se são presentes e representam figuras de confiança, ressalta. 

Sinais de vício nas crianças com o uso de eletrônicos 

Pais devem observar se o uso das redes agravou ou produziu mudanças nos padrões comportamentais dos filhos, tais como: 

  • novos vocabulários 
  • respostas agressivas diante das frustrações 
  • perturbações na concentração ou hiperfoco 
  • distúrbios no processo de aprendizagem 
  • procrastinação 
  • obesidade 
  • insônia 
  • tendinites 
  • dores posturais 
  • isolamento social  

Por vezes, a intoxicação eletrônica apresenta sintomas semelhantes aos do Transtorno do Espectro Autista (TEA), o que pode levar pais e profissionais a erros de diagnóstico e prejudicar o tratamento apropriado.”, exemplifica Torati. 

O psicólogo ainda aponta que as crianças se sentem seguras emocionalmente com a previsibilidade e estabilidade do ambiente, por isso a rotina é algo importante, como vemos no ato de assistir ao mesmo programa, ouvir as mesmas músicas e realizar as mesmas brincadeiras. No mais, é preciso avaliar se a hiperestimulação inerente ao mundo digital produz desconexões em relação ao prazer de brincar, de interagir com as pessoas físicas e de existir no mundo real. 

Segundo ele, desse modo, quando a criança encontra um aparelho eletrônico que repete infinitamente o que ela deseja, pode entrar em estado anestesiamento mental, o que a longo prazo traz prejuízos. 

“Quando toda essa hiperestimulação se torna habitual, a criança e o adolescente se distanciam de três experiências importantes para o desenvolvimento: o contato com a sensação de vazio, o tédio e surgimento do ócio criativo. Pois, é na ausência do outro e dos estímulos externos que a criança pode descobrir a importância da capacidade de estar só e o valor da solitude, explorando a capacidade de se entreter consigo e com a companhia dos próprios pensamentos”, reforça ele. 

Para Marcos, o tempo excessivo nas telas pode denunciar como as famílias modernas usam equivocadamente os aparelhos eletrônicos para aliviar tensões e substituir as funções dos cuidados parentais – pela dificuldade dos pais em dizer “não” e lidar com choros e frustrações, por exemplo – ou ainda porque “eles próprios são vítimas das intoxicações eletrônicas e não desejam perder e nem exigir esse direito”, finaliza o psicólogo. 

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