A psicóloga Isis Prisco, com Sofia e Julia: se elas fazem birra, não podem brincar
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Há algum tempo, psicólogos e educadores lutam para riscar do dicionário de pais e filhos o verbo castigar. Preferem usar corrigir. “A palavra castigo dá uma falsa conotação de que o processo de aprendizado está centrado na punição”, explica o psicólogo Jânio Carlos, diretor do Instituto Brasileiro de Referência da Família, no Santo Agostinho. “O que devemos buscar é o desenvolvimento de uma consciência saudável, de modo que a criança tenha de lidar com os efeitos de seus acertos e erros.” Mas na busca dessa “consciência saudável”, qual é a melhor forma de disciplinar os pequenos? Não há apenas uma resposta correta. Para Jânio Carlos, até os 5 anos, o método do cantinho do pensamento funciona. “Se a criança é colocada ali depois de, conscientemente, não obedecer às ordens estabelecidas, essa foi uma escolha sua e não dos pais”, afirma. Isso não quer dizer que a garotada vai realmente ficar matutando sobre o que fez. “Antes de pensar criticamente, a criança pequena é coordenada pela ação”, explica o psicólogo. “Por isso as repetições são importantes. As menorzinhas marcam território, fazem birra e, no cantinho, entendem que o mundo delas é limitado”. A partir dos 6, no entanto, Carlos acredita na privação de privilégios: restringir o uso do computador, de brinquedos, do smartphone ou proibir os pequenos de assistir ao programa predileto na TV. Para ele, esse processo possibilitará à garotada correlacionar os efeitos de sua atitude com o seu comportamento.
A palavra castigo dá uma falsa conotação de que o processo de aprendizado está centrado na punição
A terapeuta comportamental Erica Carvalho, que há quinze anos auxilia pais e mães a lidar com a meninada, concorda. Ela segue os ensinamentos do especialista americano Gary Ezzo, que serviram de inspiração para a criação do programa de televisão Supernanny, na Inglaterra, com versões em vários países, inclusive no Brasil. Erica garante que a disciplina deve começar desde os primeiros anos. Para cada ano de idade, um minuto para “pensar”. “Mas essa relação serve, principalmente, como orientação aos pais, para não dimensionarem errado o tempo da correção”, pondera Erica. É preciso deixar claro o que está ocorrendo, conversar olho no olho.
Sem diálogo, não
Mas o “adestramento” não é consenso entre os especialistas. A psicóloga e psicopedagoga Débora Galvani defende a tese de que antes dos 4 anos esse tipo de correção não produz resultados. “Até essa idade o ideal é repreender com firmeza e ensinar a atitude correta”, pondera. “A disciplina não pode ser uma forma de os pais exercerem um autoritarismo injustificado. O filho precisa aprender a respeitar limites e não simplesmente passar por uma privação como forma de punição, sem que haja uma conversa.” Para ela, a correção precisa fazer parte de um processo de aprendizagem e de aquisição de valores.
Encontrar a melhor forma de ensinar limites aos filhos é, quase sempre, um grande desafio para os pais. A dona de casa Flávia Silveira Ricardo Diniz, mãe do pequeno Estevão, de 1 ano e 10 meses, e de Melody, de 4 anos, recorreu a especialistas para pôr ordem em casa. “A Melody nunca me deu trabalho e eu considerava que era mérito meu, mas percebi que era por causa do temperamento dela”, conta. “O Estevão é completamente diferente, mais nervoso e mais birrento.” Até alguns meses atrás, Flávia tentou, junto com o marido, Mário Junior, impor regras ao pequeno. Em vão. Com as birras e os gritos em altíssimos decibéis, mãe e filho não conseguiam se entender. “Percebi que precisava de ajuda e voltei para a sala de aula”, lembra Flávia. Ela se matriculou no curso Primeiros Passos, voltado para pais de crianças de 0 a 3 anos, do Instituto Brasileiro da Família. Agora, a paz está aos poucos voltando. Estevão se mostra menos nervoso e reconhece que, se fizer birra, vai para o canto da disciplina. Já a psicóloga Isis Prisco, mãe de Sofia, de 6 anos, e de Julia, de 4, é adepta da restrição de privilégios desde cedo. Para ela, o melhor é a negociação. “Eu sempre respeito os combinados. Não cumpriu ou fez birra, não vai à aula de balé ou não pode brincar”, explica. “Acredito que dessa maneira, contribuo para a formação delas.”
O mais importante é que a forma de correção seja condizente com a realidade familiar. “Sempre digo que o diálogo é essencial”, afirma a psicóloga Isabel Christina do Carmo Gonçalves, com mestrado em psicologia do desenvolvimento. “Deve-se fazer com que o filho entenda por que certas atitudes não podem ser repetidas.” De acordo com Jânio Carlos, a correção é um processo pedagógico no qual a criança tem a oportunidade de livrar-se da culpa por comportamentos inadequados. “Funciona como um remédio que ajuda a curar e amadurecer e, assim, prepara a criança para uma vida adulta saudável”, diz. Um remédio muitas vezes amargo, mas necessário.