As redes sociais permitem grande interação entre as pessoas, levando-as a compartilhar cada vez mais detalhes da vida privada, como forma de preservar laços com parentes e amigos distantes ou, em alguns casos, buscar validação por meio de likes. Nesse contexto, tornou-se natural que os pais publiquem fotos dos filhos e permitam que as próprias crianças se expressem livremente pela internet. Mas essas atitudes, ainda que bem-intencionadas, trazem riscos muitas vezes impensados para as próprias crianças e suas famílias, alerta Fábio Diniz, presidente do Instituto Nacional de Combate ao Cibercrime (INCC).
“Crianças não têm o discernimento necessário para se esquivar de interações com adultos mal-intencionados, que podem ganhar sua confiança e envolvê-las em situações de assédio. Além disso, a publicação de fotos em redes sociais – por elas mesmas ou por seus pais – acarreta uma grande exposição. Uma vez que as fotos estão online, é impossível garantir o controle de cópias, downloads e compartilhamentos”, destaca o presidente do INCC.
Ele afirma que as fotos podem ser utilizadas por terceiros com intenções maliciosas, como a criação de perfis falsos ou a inclusão dessas imagens em sites de conteúdo inadequado. “Com o advento das deepfakes, bastam algumas fotos da criança para que seja possível montar um vídeo falso, por exemplo. Os danos podem ser sérios e profundos, como a criação de conteúdo de cunho erótico”, completa o especialista.
Atenção à localização e ao uniforme escolar
Quando as fotos revelam o ambiente em que a criança está inserida, essas informações facilitam o rastreamento de sua localização, aumentando o risco de sequestro ou assédio. Se ela estiver vestindo o uniforme da escola ou do clube, esse detalhe também é indicativo de hábitos e locais que frequenta, o que pode ser usado de forma perniciosa. E configurar o perfil da criança como privado não elimina completamente os riscos.
“Na internet, nada é totalmente privado. Uma vez que os conteúdos estão na internet, eles podem ser acessados e compartilhados. A conta pode ser hackeada ou invadida e, nesse momento, o que seria privado passa para o controle do invasor”, afirma Diniz. “Além disso, amigos ou familiares que têm acesso às fotos podem compartilhá-las, conscientemente ou não, com pessoas fora do seu círculo de confiança – e isso é muito mais comum do que pensamos”.
LEIA TAMBÉM:
Cuidados a tomar
O presidente do INCC ressalta quatro aspectos que visam garantir a segurança digital das crianças e, em alguns casos, presencial:
1. Não poste fotos de seus filhos:
Sabemos que é difícil, ou, talvez, quase impossível, mas se quer realmente se precaver, não poste, simples assim. Se não conseguir seguir esta recomendação, siga os passos de 2 a 4.
2. Não marque localização em fotos:
Uma forma de mitigar os perigos que as crianças correm no mundo virtual é deixar de marcar a localização nas fotos e cuidar para que elas não contenham detalhes que a denunciem, como uniforme de escola, nome da academia ou endereços. “Isso reduz o risco de alguém usar esses dados para localizar ou identificar a criança ou até mesmo os adultos, pois, identificando onde estão os adultos, muito provavelmente as crianças também estarão naqueles mesmos locais”, explica o especialista.
3. Configure as opções de privacidade da rede social:
Isso vai garantir que apenas pessoas próximas possam visualizar as fotos, inclusive bloqueando o acesso a terceiros, sem controle de compartilhamento. O ideal é partir sempre do acesso mínimo, com o máximo possível de restrições. E depois, se for o caso, liberar acessos mais amplos, gradativamente e de forma pontual.
4. Avalie o conteúdo das fotos das crianças:
Roupas, poses e situações que, à primeira vista, parecem engraçadas e inofensivas podem causar constrangimento no futuro. Por isso, fotos de crianças nuas ou mesmo com roupas íntimas são totalmente desaconselhadas, já que no futuro podem ser usadas fora de contexto e de forma comprometedora por criminosos.
“Esses cuidados podem parecer exagerados, mas, para um indivíduo mal-intencionado e com certa habilidade digital, uma única foto já é suficiente para promover uma devassa na vida de outra pessoa”, relata Diniz. Ele diz que em poucos minutos, é possível descobrir informações privativas e sensíveis sobre os filhos, pais, familiares e amigos, endereços da residência e da casa de veraneio, locais frequentados, veículos, documentos de identificação pessoal, telefones, e-mails, dados bancários e de cartão de crédito, senhas de acesso vazadas (e que geralmente são reutilizadas), entre outras.
Por isso, é importante que os pais mantenham a proximidade e o diálogo com os filhos, ajudando-os a descobrir e navegar com segurança no mundo cibernético, que contém riscos difíceis de identificar. Aplicativos de controle parental podem ajudar a monitorar o que as crianças acessam. Mudanças de humor, irritabilidade ou isolamento podem ser sinais indicativos de que há algo errado.
“No atual cenário de pouca privacidade e aumento de crimes cibernéticos, todo cuidado é pouco. Nossa responsabilidade como pais e mães é muito grande, já que as crianças não têm maturidade para lidar com os riscos do mundo de hoje, assim como muitos adultos”, finaliza o especialista.