Crônica da Cris Guerra em Novembro: ‘Roupa de mãe’

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    Por Cris Guerra

    Foto: Reprodução / Instagram @HojeVouAssimEu me lembro de ter sido convidada para uma festinha de amigos 15 dias depois do parto. A amamentação ia de vento em popa, mas quem tinha muita sede era eu — de ver os amigos e respirar outros ares por uma noite. Usei um vestido de malha de cintura baixa, solto na barriga e nos quadris, mas curto o suficiente para evidenciar as pernas — estas, sim, em boa forma. Assim me senti bonita e sexy em pleno pós-parto. E como foi importante.

    A vida nos oferece maravilhosas oportunidades para transformar nossa forma de vestir. A maternidade é uma das grandes. Na gravidez, as mudanças que se iniciam no corpo prenunciam as da rotina — nunca mais seremos as mesmas. É uma espécie de metáfora do que virá pela frente.

    Curti cada milímetro da minha gravidez e até sinto saudade desse tempo em que era desnecessário murchar a barriga — minha alegria era proporcional ao tamanho dela. Ver o corpo se transformar, na mesma medida em que a cabeça tenta compreender e se adaptar à vinda de uma vida nova, é presente e é desafio. Podemos fazer nossa parte com alimentação saudável e exercícios, mas não temos total controle sobre os rumos de nossas formas, o que por si só já é um teste: de altruísmo e autoestima, os dois ao mesmo tempo. Serei capaz de cuidar do bebê sem descuidar de mim? Saberei aceitar as mudanças definitivas nesse corpo que empresto ao meu filho?

    Como minha gestação foi muito esperada, não me deixei abater nem pelo gigantesco imprevisto que a atravessou. Depois da morte repentina do pai do Francisco, dois meses antes do nascimento dele, passei a me vestir com ainda mais capricho. Eu ainda teria dois meses pela frente, exercitando a alegria rara de ser mais de um. E toda caixa de jóias merece um belo embrulho.

    Até que um dia o bebê nasce — e é outro o aprendizado. Aquele serzinho mínimo nos afeta a rotina por completo, e é preciso colocar como meta a lógica da máscara de oxigênio para não se abandonar por completo. “Primeiro coloque a máscara em você, e só depois na criança”.

    É verdade, a gente começa a buscar mais conforto. Tecidos mais flexíveis, comprimentos mais generosos, sapatos que nos permitam correr (atrás do menino ou de um lugar para outro). Está certo, a bolsa precisa ser prática. Mas a vinda de um filho não pode esconder a mulher — que a maternidade sublinha, e não oculta.

    Tive trechos de céu cinza e chuva forte. Tive noites que pareciam sem fim. Depois amanheceu. A maternidade me transformou, sim: botou mais roda em meus vestidos.

    Lembro de uma cena em casa, enquanto eu me vestia para o trabalho. Quando eu ia saindo, Francisco, que não tinha completado 4 anos, apontou para um salto alto, sugerindo que eu substituísse a sapatilha que havia escolhido. Entendi o recado e levei comigo.

    A forma como nos enxergamos muda muito quando vêm os filhos. Mas em que momento da vida permanecemos as mesmas? Não se entregue tanto a ponto de sentir falta de si mesma. Seu filho merece uma mãe feliz por inteiro.

     

    Cris Guerra e o filho Francisco


    Cris Guerra é publicitária, escritora e palestrante. Fala sobre moda e comportamento em uma coluna diária na rádio Band News FM e a respeito de muitos outros assuntos em seu site www.crisguerra.com.br. Na Canguru, escreve sobre a arte da maternidade. É mãe de Francisco, de 9 anos, que fez a ilustração da coluna especial do mês das crianças. 

    contato   [email protected]

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