Por Agência Bori – Os consultórios odontológicos do país tiveram a redução de 88% de seu volume de procedimentos em crianças durante o mês de abril, comparado ao mesmo mês de 2019. A redução média de atendimento odontológico de crianças foi de 66% entre os meses de janeiro a maio, ou seja, dois terços da demanda foi reprimida por conta da pandemia de Covid-19. Os dados são da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) em estudo publicado em 25 de outubro na revista “International Journal of Pediatric Dentistry”.
Foram coletados, inicialmente, os dados de todos os municípios brasileiros nos prontuários do DATASUS referente às extrações dentárias, restaurações e tratamentos endodônticos realizados de janeiro de 2019 a maio de 2020. A partir disto, os pesquisadores fizeram uma análise comparativa mês a mês dos casos tratados nos dois anos. A redução mais significativa foi observada no mês de abril de 2020, cerca de um mês após a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarar situação de pandemia de Covid-19.
“A redução se tornou mais expressiva em abril porque a pandemia passou a afetar mais diretamente os serviços. Houve diversas portarias e recomendações que restringiram as atividades de saúde, dentre elas as odontológicas. A recomendação foi que o atendimento odontológico ocorresse somente em caráter de urgência e emergência, com o adiamento dos atendimentos eletivos para momentos mais tranquilos e, assim, evitar um maior contágio da população”, observa o professor de odontologia Flávio Fernando Demarco, Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-graduação da Universidade Federal de Pelotas e autor do estudo.
Com a falta de atendimento odontológico, cáries tendem a progredir mais rapidamente nas crianças, diz o estudo
A demanda reprimida de diagnóstico e tratamento dentário reflete mais intensamente na saúde das crianças, explica Flávio Demarco. “O esmalte, que é um dos tecidos que compõe os dentes, é menos mineralizado do que o esmalte dental dos adultos. Assim, lesões de cárie em crianças tendem a progredir mais rapidamente no paciente pediátrico”, explica. Com o atraso nos atendimentos, uma lesão que poderia ser inativada com tratamentos não invasivos, pode evoluir de forma mais acentuada. “Dependendo do tempo da pandemia, talvez diversas lesões progridam tanto que necessitarão de tratamento de canal ou até mesmo da extração dental”, alerta.
O especialista acrescenta que, além da redução de volume de tratamentos, os procedimentos preventivos coletivos, como visitas a escolas e campanhas de prevenção de cáries nas comunidades, praticamente não foram realizados. Segundo ele, essas abordagens preventivas são estratégias mais efetivas e eficazes para controlar as principais doenças odontológicas. Flávio Demarco aponta que este cenário provavelmente afetará mais as pessoas já socialmente marginalizadas e excluídas, agravando ainda mais as discrepâncias observadas em relação à saúde bucal no país.
Flávio Demarco lembra que a odontologia é uma das profissões mais suscetíveis à contaminação pelo SARS-CoV-2. O risco está associado ao uso, por exemplo, de instrumentos que geram grande quantidade de aerossol. “A caneta de alta rotação e o ultrassom geram micropartículas de saliva que ficam por horas no ar”, explica. A recomendação, conclui, é que consultórios odontológicos adotem um espaçamento do agendamento de consultas e protocolos de descontaminação.