Como os adultos alimentam os medos das crianças

O educador parental Mauricio Maruo fez uma pesquisa sobre os medos adultos e infantis e traz algumas reflexões que podem ajudar os pais a entender seus medos e o impacto deles sobre as crianças

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Criança com expressão de medo na parede que tem sombra assustadora
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Você já sentiu medo? É provável que sim. Segundo a pesquisa realizada pela Center for Addiction and Mental Health no Canadá, cerca de 99% da população mundial já sentiu algum medo na vida, mas você sabe dizer por que sentimos medo? Já se perguntou para que ele serve, de onde ele vem, se ele é bom ou ruim, e como podemos lidar com os medos das nossas relações?

Pois é, hoje o texto vai falar sobre um dos sentimentos mais antigos que existe entre nós seres humanos.

O medo tem muitas facetas, ele não é bom nem ruim, é necessário algumas vezes, desnecessário em outras, capaz de modificar o mundo e também atrasá-lo. Mas uma coisa precisamos admitir, ele existe e muitas vezes não sabemos lidar bem com ele, principalmente em nossa relação familiar.

  • Quem nunca sentiu medo da violência nas ruas quando o assunto são nossos filhos?
  • Quem nunca sentiu medo dos perigos das redes sociais para nossos filhos? 
  • Quem nunca sentiu medo de como o mundo pode engolir nossos filhos?
  • Quem nunca sentiu medo de não conseguir dar conta de cuidar da família? 
  • Quem nunca sentiu medo do desgaste de um relacionamento?
  • Quem nunca sentiu medo por dizer a verdade, pois às vezes a verdade dói?
  • Quem nunca se perguntou se o que estamos ensinando ao seu filho é respeito ou medo? 

Para responder a essas perguntas complexas, é importante entender melhor o que o medo significa. 

O medo está presente desde que o mundo é mundo. Os animais pré-históricos já sentiam medo, pois alguns eram os caçadores, mas muitos eram a caça, o que mostra que o medo está intimamente ligado à vida.

A humanidade só sobreviveu e evoluiu graças ao medo. Imaginem se todos os nossos ancestrais (homens das cavernas) não tivessem medo quando saiam para caçar um tigre dente de sabre? Ninguém sairia vivo dessa caça.  

Sim, o medo continua sendo um dos nossos mecanismos de defesa, eu digo “um dos”, pois evoluímos muito desde os nossos ancestrais homens das cavernas, e hoje desenvolvemos outros tipos de mecanismos que ajudam a entender melhor algumas necessidades, mas o medo continua muito presente em nosso dia a dia e nas nossas relações.

Como reage o nosso corpo quando sentimos medo?

Quando sentimos medo, todo nosso corpo reage, mas um órgão em específico reage mais.
Se você disse coração, está certo. O coração começa a bombear muito mais sangue, pois todos os músculos do seu corpo precisam trabalhar mais, ou você nunca percebeu que ficamos muito tensos quando estamos com medo?

Mas existe um outro órgão que trabalha tão igual ou um pouco mais que o coração, porém esse órgão é responsável pela maioria dos danos causados pelo medo, estou falando do nosso cérebro.

Uma pesquisa realizada pela revista médica JAMA Pediatrics apontou que entre os anos de 2016 até 2020 tivemos um aumento de 29% nos casos de ansiedade nas crianças e 27% nos casos de depressão infantil.

Os principais medos das crianças

A psiquiatra da Infância e Adolescência na Escola Paulista de Medicina da Unifesp e especialista pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria), Danielle H. Admoni listou os principais medos das crianças por faixa etária:

Até 03 anos – Nesta fase, especialmente entre 02 e 03 anos, as crianças estão aprendendo a lidar melhor com suas emoções, mas costumam se assustar com escuro, barulhos estranhos, luzes fortes e pessoas fantasiadas. “Como a fantasia começa a fazer parte da vida dos pequenos, eles acabam estranhando palhaços, Papai Noel e pessoas fantasiadas de personagens”.

Entre 03 e 04 anos – Quando a criança começa a aprender mais sobre o mundo, a lista de medos tende a crescer, sendo alguns reais e outros imaginários. Aos quatro anos, ela pode tanto ter medo da perda do seu cachorro como temer fantasmas, dragões e criaturas sobrenaturais. Também é uma fase de repetição dos pais. Quando ela vê a mãe ou o pai reagir com medo de alguma coisa, ela entende que também deve ter medo daquilo.

Entre 05 e 06 anos – Esta é a fase em que as crianças ainda não compreendem situações de causa e efeito, como vento, chuva e trovões. Também temem separação, morte e ferimentos.

Entre 07 e 10 anos – Os medos principais englobam ser castigado pelos pais e não ser aceito pelos amigos. Também há receio de enfrentar situações novas sem a presença dos pais. 

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Como podemos entender melhor nossos medos e minimizar alguns danos?

Acredito que a pergunta de ouro é de onde vem o medo? Pois se soubermos a origem talvez possamos entendê-lo melhor, correto?

Sim e não, como disse anteriormente o medo tem muitas facetas, mas um bom caminho para começar a entender melhor o medo é entendermos o que nos espera no futuro.

Sim o medo tem uma relação muito próxima com o futuro, a maioria dos medos que sentimos são medos de projeções futura, deixa eu explicar melhor com alguns exemplos:

  • Na fase crítica da pandemia, sentimos muito medo da morte, projetando o que poderia acontecer se pegássemos o Coronavírus.
  • A maioria das mães sentem muito medo de perder seus empregos na volta ao trabalho depois da licença maternidade, pois como ainda vivemos dentro de uma cultura patriarcal machista essa é a realidade. Muitas famílias sentem medo das violências que acontecem nas ruas, pois em um “futuro” algumas dessas violências podem acontecer com alguns dos nossos familiares.

Todos esses medos são legítimos, mas não deixam de ser medos de projeções futuras.

O que mais preocupa as crianças

Entendendo um pouco de onde supostamente possa nascer o medo, fiz uma pequena pesquisa com 60 crianças com faixa etária entre 04 até 07 anos e de convívios e criações diferentes, fiz uma única pergunta a elas:

“Você tem mais medo de acontecer algo ruim com você ou seus pais no futuro ou de vampiros?”

Acredito que nem preciso dizer que o vampiro ganhou disparado.

É assim de forma simples que nossas crianças convivem com seus medos, os quais, porém, vão mudando à medida que elas crescem por influencia dos adultos e seus temores sobre projeções do futuro.

Só mais um aspecto: o medo e o machismo

Como citei no texto, vivemos em um país onde a cultura patriarcal machista ainda é muito forte e essa cultura prejudica demais uma masculinidade saudável.

Existe uma porcentagem avassaladora de homens que ainda acreditam que devem ser fortes e protetores, para isso não podem sentir medo e replicam isso aos filhos (principalmente meninos) causando um imenso problema emocional nessas crianças.

O documentário The Mask You Live In mostra o retrato desse imenso problema.

A saída para esse gigantesco problema é começar a mostrar aos nossos filhos meninos que é normal homens chorarem e não há problemas em chorar, é mostrar que é normal homens falarem sobre suas emoções, sentimentos e medos, é mostrar que é normal homens abraçarem e beijarem outros homens, mostrar que isso é um correto exemplo de masculinidade saudável. 

*Este texto é de responsabilidade do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Canguru News.

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