Você já passou pela situação de ter de sair para resolver alguma coisa rápida e cogitou deixar a criança sozinha em casa? Antes de mais nada, lembramos que segundo o artigo 133 do Código Penal, nenhuma criança ou adolescente pode ser deixado sozinho antes dos 16 anos de idade, pois o ato pode ser encaixado como crime de abandono de incapaz, visto que a criança é incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono.
Porém, na prática, sabemos que pode acontecer da mãe, pai ou responsável pela criança, precisar sair por alguns minutos e deixar a criança sozinha em casa. Mas para fazer isso, é fundamental que, independentemente do período de tempo, os pais devem levar em conta o nível de autonomia e responsabilidade dos filhos.
De acordo com a psicóloga Luciana Deutscher, é preciso observar a maturidade da criança ou adolescente. “Existem muitos jovens que com 14 anos ainda são imaturos demais emocionalmente e não têm senso de responsabilidade para discernir o certo do errado e o perigo real”. Por isso, a decisão de deixar a criança em casa sem supervisão de um adulto deve ser tomada em conjunto entre pais e filhos, prestando atenção, principalmente, em alguns pontos que indicam a autonomia e a independência do pequeno, para ações como pedir ajuda, caso seja necessário.
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Autonomia e independência
Como muitas coisas do desenvolvimento infantil, no processo de desenvolvimento de autonomia, cada criança tem o seu ritmo. “A hora certa para cada criança depende do que veio antes disso. Imagine como se fosse uma escada, antes de alcançar o último degrau, a criança precisa passar por todos os outros”, exemplifica a psicóloga Patrícia Nolêto.
Ainda segundo Patrícia, a criança precisa ter independência em outras pequenas atividades do dia a dia. Por exemplo:
“Sou a favor sempre da educação para autonomia, de educarmos nossas crianças para serem responsáveis e independentes tanto nas tarefas cotidianas como emocionalmente”, defende Luciana. Mas, como ajudar o pequeno a desenvolver essa autonomia desde cedo? A psicóloga aconselha os pais a irem atribuindo pequenas responsabilidades gradualmente aos pequenos, como guardar os brinquedos nos lugares destinados. Essa simples ação irá educar a criança e trará para ela o senso de dever e responsabilidade.
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Para tanto, é muito importante deixar que desde pequenas as crianças possam fazer coisas próprias da sua idade, “como pendurar as roupas no cabide, colocar os brinquedos no lugar, comer sozinha, experimentar as sensações táteis como frio, áspero, duro etc.”, lista a psicóloga Luciana. Ela também recomenda que os pais sempre alertem as crianças do que podem e do que não podem fazer, que é perigoso. “Não se trata de colocar medo, brigar e proibir tudo, é conversar e explicar em uma linguagem adequada a cada idade o porque daquilo ser perigoso ou proibido tanto para ela como para os outros, assim também ensinamos algo muito importante, que é a empatia”, explica a profissional.
Observe se a criança:
- sabe ligar e desligar o fogão
- consegue pedir ajuda a um vizinho se precisar de algo
- tem noções de perigo e riscos
- é capaz de resolver pequenos problemas que possam acontecer, como o que fazer se quebrar um copo
- pendure as roupas no cabide
- coloque os brinquedos no lugar
- coma sozinha
- experimente as sensações táteis como frio, áspero, duro
Sinais de maturidade
Segundo as profissionais, para os pais começarem a entender se é hora de deixar a criança sozinha em casa, eles podem observar o comportamento e as reações das crianças com relação a cumprir e aceitar regras. Além disso, prestar atenção se elas conseguem executar tarefas que exigem passos a serem seguidos para obter êxito e completá-las. Assim, será possível perceber habilidades como paciência, persistência e responsabilidade – todas muito importantes para o processo de autonomia do pequeno.
É essencial também conversar com a criança para saber se ela se sente segura para ficar sozinha em casa, já que, às vezes, ela própria pode se sentir despreparada e desconfortável com isso. Além disso, é importante que os pais também estejam à vontade com a situação.
A empreendedora Anamaria Matsunaga, por exemplo, que tem dois filhos, um de 8 anos e outro de 6 anos, diz ainda não estar preparada para deixá-los sozinhos em casa nem um minuto. “Eu nunca tive coragem de deixá-los sozinhos e vou continuar não deixando. Vou esperar mais alguns anos, tenho medo que aconteça alguma coisa e não tenha um adulto para cuidar e protegê-los”, relata Anamaria.
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E o melhor caminho para que esse processo seja proveitoso e efetivo para as duas partes é o diálogo. Por isso, ensine a criança a pedir ajuda sempre que precisar, tenha contatos de emergência, como parentes ou vizinhos próximos disponíveis, e oriente seu filho sobre como ligar para eles. Também, converse com as crianças desde pequenas e convide-as para participar das atividades da casa. Assim, poderá alertar sobre os perigos existentes no ambiente, como tomadas, fogão, escadas e janelas com rede de proteção. Explique para elas o motivo das proibições e recomendações e, principalmente, o que pode acontecer se elas desobedecerem.
“Adultos têm o hábito de apenas dizer ‘não pode’ e não explicar o motivo. Isso é terrível para o aprendizado da criança! Elas são curiosas, lógicas e concretas até uma certa idade, por isso, precisam de explicações e exemplos que podem ser dados até por meio da prática de jogos de tabuleiro”, reforça Luciana Deutscher.
“Sou a favor sempre da educação para autonomia, de educarmos nossas crianças para serem responsáveis e independentes tanto nas tarefas cotidianas como emocionalmente.”
Luciana Deutscher, psicóloga
Lembre-se que mais importante que definir um tempo máximo para a criança ficar sozinha, é fazer que esse tempo aumente gradualmente. Comece, por exemplo, deixando ela sozinha por alguns minutos, enquanto você vai à padaria na esquina de casa, depois quando for fazer um sacolão, depois ao supermercado e assim sucessivamente.
“É importante também perceber se a criança está segura para esse aumento de tempo. Às vezes, ela já tem autonomia para ficar sozinha, mas se for por um tempo um pouco maior, ela fica ansiosa, começa ligar, perguntar se você já está chegando”, aconselha Patrícia. Sendo assim, sempre pergunte para seu filho como foi a experiência para ele e avalie o que ele sentiu. Mantenham um diálogo aberto quanto ao progresso de independência dele. Além disso, lembre-se que é tudo isso é um processo e que cada família e criança tem o seu próprio ritmo.
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