O profissional mais necessário na Ucrânia, hoje, na guerra iniciada pela Rússia, possivelmente seja um cirurgião médico. Da mesma maneira, precisamos urgentemente de educadores parentais no mundo abalado pela forte “omissão familiar”, afirmou Rossandro Klinjey. Psicólogo clínico, mestre em saúde coletiva, consultor de comportamento, educação e família, ele foi um dos palestrantes convidados a participar do 3º Congresso Internacional de Educação Parental, promovido e organizado pela Canguru News e pela Parent Brasil
“Vamos fazer coro à educação das famílias ou perderemos o projeto civilizatório”, pontuou o especialista. O psicólogo contou sua trajetória profissional e a imersão na educação parental. Ele brincou que, em determinado momento da vida, percebeu que estava “cansado de falar com adultos doentes”. Investir nas crianças e adolescentes seria um caminho mais frutífero.
A pandemia de covid-19, que assolou todo o mundo a partir de 2020, segundo Rossandro, evidenciou “a falência das famílias”, algo que já estava muito claro para os profissionais de educação e saúde mental. “Muitas famílias só descobriram que tinham filhos na pandemia.” A omissão profunda dos pais, a falta de um olhar cuidadoso aos filhos pode gerar um enorme prejuízo, salientou.
O fenômeno da omissão parental vem se acelerando desde a Segunda Guerra Mundial, afirmou. “Estamos vivendo um momento de profunda crise da humanidade.” O modelo de educação que temos hoje no mundo e a forma como pais estão educando seus filhos estão esgotados e não funcionam. Na busca por um outro modelo, sentimos uma angústia coletiva, definiu o psicólogo. As respostas ainda não existem, mas profissionais como os educadores parentais estão criando respostas para auxiliar as famílias a serem mais saudáveis, ainda que imperfeitas.
Rossandro pontua que a omissão parental está muito relacionada à falta de presença, de afeto cotidiano. “Os pais acreditam, infantilmente, que educar é satisfazer desejos. O abandono parental é maior em classes médias e altas, porque os pais substituem a presença por presentes.”
O educador abordou, ainda, a necessidade de intervenção dos pais, de uma certa hierarquização. “A independência e a autonomia de um filho são gradualmente construídas”, ressaltou. É preciso construir esses passos com as próprias crianças, e em casos de retrocessos, voltar algumas casas atrás, como nos jogos de tabuleiro. Os filhos devem entender, sinalizou o profissional, que a autonomia é uma conquista. “Independente é quem paga boleto”, brincou.
Ele alertou para um possível boom de ideação suicida infanto-juvenil. Como psicólogo, já foi procurado por pais que perderam filhos adolescentes que tiraram a própria vida. Rossandro relatou um encontro com uma mãe que perdeu o filho de 16 anos. Mergulhada na dor, ele lhe perguntou se ela havia percebido sinais da angústia do filho, de que ele tinha ideação suicida. Diante da negativa da mãe, o conselho do psicólogo foi que ela voltasse em casa, entrasse no quarto do filho, e procurasse tais sinais. Quais eram seus personagens favoritos em filmes? Que séries ele assistia? O que ele dizia em seus posts nas redes sociais? Qual era o teor das conversas recentes no WhatsApp? Dias depois, a mãe reconheceu que os sinais estavam todos lá.
A intervenção dos pais, o cuidado e o monitoramento na educação dos filhos é crucial, e dá trabalho, enfatizou Rossandro. Ele afirmou que o papel da educação parental é semear, mas muitas vezes não se enxerga, num primeiro momento, a germinação e a semeadura. “A planta, para dar certo, tem que estar muito bem enraizada.” Da mesma forma, a criança precisa crescer numa família afetiva.
“Uma das coisas mais incríveis da educação parental é a assertividade. É uma visão sistêmica, holística e interdisciplinar, e muito importante diante da falência familiar.”
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