Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 50 mil crianças e adolescentes desaparecem todos os anos no Brasil e, desse total, a estimativa é de que 10% não retornam para suas famílias, devido a práticas como adoção ilegal, tráfico de órgãos, trabalho escravo e exploração sexual, entre outros motivos. Para proteger as crianças e ajudar no combate ao problema do desaparecimento no Brasil, uma das principais recomendações é incentivar pais e responsáveis a emitir a carteira de identidade (RG ou Passaporte) ainda na infância.
Esse documento oficial de identificação – que, diferentemente da certidão de nascimento, tem foto da criança, a impressão digital e o nome dos genitores ou responsáveis – pode dificultar a ação de criminosos e facilitar a busca, localização e identificação em caso de desaparecimento, alerta a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). A entidade, em parceria com o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), divulgou um documento com orientações para ajudar a reduzir essas estatísticas e evitar que outros casos ocorram.
Para Ivanise Espiridião, fundadora da ONG Mães da Sé, dedicada ao combate e à prevenção de desaparecimentos, quanto mais cedo os pais emitirem um RG para seus filhos, melhor. “O ideal seria que a criança já saísse da maternidade com o RG. Isso dificultaria, caso ela fosse sequestrada, na hora de tirar uma documentação falsa, pois a impressão digital seria identificada como já existente em outro documento, o original”, diz Ivanise, que fundou a ONG após o desaparecimento da filha Fabiana, então com 13 anos de idade, em 1995, e ainda não encontrada. Ela afirma que em caso de desaparecimento de adultos, o protocolo padrão das polícias já é bloquear o RG e que se uma criança desaparecida possuir essa documentação, ela também pode se beneficiar desse importante passo.
O advogado criminalista Marcelo Campelo explica que essa coleta de informações através do RG da criança permite que a investigação tenha dados para cruzar e um referencial para começar. “Se em algum momento a criança cruza a fronteira, seja qual for a cidade, e o agente da imigração, que está frequentemente consultando a lista de crianças desaparecidas, identifica uma atividade suspeita, ele consegue confirmar a suspeita ao cruzar os dados e nesse caso já retém a criança”, relata o advogado.
Campelo também reforça a confiabilidade do RG para esse fim de identificação. O criminalista afirma que embora os traços físicos apresentados nas fotos possam mudar, mesmo que mantenham alguns mais identificáveis, a impressão digital coletada não muda. “As fotografias evoluem com a idade, a impressão digital não”, diz Campelo.
Para a fundadora da Mães da Sé, apesar de todas essas ferramentas, muito trabalho ainda precisa ser feito para que a Lei da Busca Imediata, principal aliada nessa missão de localizar as crianças, seja uma realidade efetiva em todo território nacional. Mesmo com as alterações na lei 8.069, que agora exige autorização judicial dos pais para que menores de 16 anos viajem desacompanhados, Espiridião denuncia que é preciso uma fiscalização ainda mais ativa dos aeroportos. Ela alega que há muitas brechas para o uso das identidades e certidões falsas nos momentos de embarque e desembarque, o que reforça a importância de se fazer o primeiro RG da criança o quanto antes e a urgência de uma fiscalização maior.
Como tirar o RG do filho
Para tirar o RG de uma criança, é preciso ir a um Poupatempo, no caso de São Paulo, com um dos pais ou responsável legal, com documento de identificação com foto, e apresentar a Certidão de Nascimento original e cópia. Não há taxa para realização do serviço para o primeiro RG, apenas o custo opcional de envio pelos Correios no valor de R$ 9,09. Durante o atendimento, será feita a coleta de foto, assinatura ou digital, portanto não precisa levar foto ao posto. O CPF já consta das novas certidões de nascimento, mas se a criança não tem o documento, os pais devem solicitar que seja incluso junto com o RG. O agendamento no Poupatempo pode ser feito no site www.poupatempo.sp.gov.br ou no celular, por meio do aplicativo SP Serviços, disponível para as plataformas iOS e Android.
Para cada estado, é preciso averiguar as informações dos órgãos públicos responsáveis. Em Minas Gerais, por exemplo, as orientações estão na página do governo estadual. Já no Rio de Janeiro, o site do Detran orienta sobre o primeiro RG.
10 recomendações às famílias
- Faça a carteira de identidade (RG ou Passaporte) ainda na infância. Um documento com foto da criança e nome dos genitores ou responsáveis pode dificultar ações de subtração, facilitar a busca, a localização e a identificação;
- Quando a criança sair de casa, mesmo em companhia de pais ou responsáveis, procure sempre identificá-la com um cartão, pulseira ou crachá contendo dados como: nome completo, telefone do responsável, número de identidade.
- Mantenha as crianças sob supervisão constante de um adulto responsável. Jamais deixe-as se afastar, muito menos perder o contato visual com elas;
- Não atribua a outra criança ou adolescente a responsabilidade de olhar a criança. Esse cuidado e proteção devem sempre partir dos adultos;
- Não espere transcorrer 24 horas para comunicar o desaparecimento. A Lei assegura que as buscas por crianças se iniciem imediatamente após o recebimento da notícia, assegurando maior chance de encontrá-la;
- Ao verificar que uma criança está perdida, sozinha, ajude-a levando à presença da autoridade policial mais próxima, do Conselho Tutelar, de um agente da guarda municipal, ou mesmo do Corpo de Bombeiros;
- Ensine-as a não aceitar objetos, dinheiro, balas ou qualquer presente ou vantagem, bem como caronas de desconhecidos ou pessoas que se fizerem conhecidas apenas dela;
- Oriente seu filho ou sua filha a nunca colocar nomes, endereços ou telefones, dados pessoais, como escola que estuda, clubes que frequenta em páginas da internet, ou qualquer outra informação que se possível localizar os locais que frequenta;
- Oriente seus filhos e crianças sob sua responsabilidade a evitar jogos interativos com outras pessoas que não conheça no mundo real, na rede digital em qualquer idade, especialmente se não tiver idade ou maturidade para diferenciar as diversas situações de aliciamento;
- Toda vez que levar seu filho à escola, festas ou casa de amigos, espere ele entrar no local, e verifique se ele realmente chegou a seu destino e está em segurança.
*Fonte: Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)