Pais precisam se conectar consigo mesmos e com a sua infância para uma melhor parentalidade

O psiquiatra infantil Daniel Siegel falou por videoconferência no 3° Congresso Internacional de Educação Parental; a comunicação não violenta e a importância do contato com a natureza também foram temas abordados no segundo dia de evento

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Daniel Siegel durante 3o Congresso de Educação Parental
Daniel Siegel durante conferência online
Buscador de educadores parentais
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Buscador de educadores parentais

“Obviamente, não existe a parentalidade perfeita, é preciso estar presente e encontrar maneiras de reparação quando houver rupturas por necessidades não atendidas”, disse o educador e psiquiatra infantil americano Daniel Siegel, convidado de destaque do 3° Congresso Internacional de Educação Parental. No painel de encerramento desta sexta-feira, ele falou por meio de videoconferência, moderada pela terapeuta e colunista da Canguru News, Adriana Drulla, durante mais de uma hora, sobre como exercer o papel de mãe e pai com base no apego seguro e também comentou sobre reconhecer erros e pedir desculpas aos filhos quando necessário.

Siegel, que é professor e pesquisador da Escola de Medicina da Universidade da Califórnia (UCLA) e autor de quase 30 livros, entre eles, O cérebro da criança e O cérebro adolescente, explicou os aspectos básicos do apego seguro – como a proteção, compreensão da mente da criança, capacidade de acalmá-la e segurança – e deu exemplos de situações que viveu com os dois filhos, que hoje já não são mais crianças, para falar da importância dos adultos entenderem e refletirem sobre a sua própria história de vida e assim serem capazes de se reparar em situações que pedem isso.  

“O melhor indicador de que seu filho vai ter um apego seguro a você é como você entendeu sobre o que aconteceu com você na sua infância. Então, se você tem interesse, para que a criança possa se desenvolver de modo seguro, você deveria tentar tirar um tempo para refletir sobre a sua própria história de vida ou narrativa em relação às suas experiências de criança, para que possa trabalhá-las. Talvez, algumas sejam de trauma, terror ou perdas não resolvidas, e é preciso encontrar maneiras de dar sentido a essas vivências.”

Bete P. Rodrigues e Lis Leão durante Congresso Internacional de Educação Parental
Bete P. Rodrigues (esquerda) e Lis Leão durante o evento

A comunicação não violenta (CNV) também foi tema de uma das palestras do segundo dia de congresso. A fonoaudióloga e consultora de CNV do Instituto Tiê, Juliana Portas falou sobre esse tipo de comunicação que busca favorecer as relações familiares por meio do desenvolvimento de habilidades que aumentam a confiança e conexão entre as pessoas.

Ela chamou a atenção para a maneira violenta que muitas vezes falamos com os filhos até em situações cotidianas, como quando dizemos que eles têm de comer tudo o que está no prato. “O que a gente não percebe é que a gente naturaliza a violência, fala de forma agressiva. Só que a criança tem a bagagem dela, o corpinho dela, os sentimentos dela, existe um saber intuitivo, não é um saber de livro, e a gente não respeita isso”. 

Se conectar consigo mesmo é o primeiro passo para o êxito na conexão com os filhos. Só assim o adulto será capaz de se respeitar e assumir para os filhos quando não quer brincar porque está muito cansado, por exemplo. “A gente não fala essas coisas porque acha que tem sempre que dar conta de tudo. Mas é importante mostrar que não estamos disponíveis o tempo inteiro, para que a criança possa fazer o mesmo por ela”.

A consultora educacional Bete P. Rodrigues falou das semelhanças entre a CNV e a disciplina positiva, que ela definiu não como um método ou um passo a passo, mas sim uma abordagem socioemocional. Segundo Bete, a disciplina positiva assim como a CNV incentiva os adultos a olhar para si, valorizando o autocontrole, a autorregulação e autoconsciência. “A mãe deve comunicar suas necessidades emocionais incentivando assim os filhos a fazer o mesmo”. Para a consultora, o principal não é ensinar aos filhos o que pensar, mas como pensar, preparando-os para a vida de forma encorajadora e respeitosa – e isso, às vezes, exige dizer não. Bete também falou sobre autoritarismo e punições. “É uma pena que os pais ainda acreditam em castigos físicos, prêmios e recompensas, por isso levanto a bandeira não punitiva, não permissiva. Para que a criança se sinta aceita não é preciso a obediência cega. A gente quer um filho crítico, responsável, compassivo, autônomo, empoderado, a lista é grande”, concluiu ela.

Mais verde nas relações familiares

Aline Cestaroli, Lis Leão e Juliana Gatti durante congresso de educação parental
Aline Cestaroli, Lis Leão e Juliana Gatti durante congresso de educação parental

A conexão das famílias também passa pela conexão com a natureza. Em painel sobre o assunto, a consultora em sustentabilidade e pesquisadora de saúde e natureza, Juliana Gatti, e a pesquisadora senior do Centro de Ensino e Pesquisa Albert Einstein, Lis Leão, falaram da relação intrínseca do ser humano com a natureza e dos benefícios comprovados por estudos que o contato com áreas verdes proporciona – principalmente, quanto rotineiro e iniciado na infância. Melhora no sistema imunológico e no estado de ânimo positivo, e redução de estresse e depressão são apenas alguns dos resultados positivos que a relação com o verde permite. 

Juliana lembrou da importância dos primeiros mil dias no desenvolvimento das crianças, moldado pelas experiências que ela terá nessa fase da vida. “São essas experiências diversas que criam repertório e a base que sustenta a existência do adulto no futuro. Se a criança é privada de ter oportunidades plenas, mais dificuldades ela terá lá na frente”.

Ela citou como exemplos, expedições a florestas, visitas a parques e bosques, cuidar de plantas, mexer com terra, morar ou trabalhar em área arborizada. São todas atividades que ampliam a diversidade de experiências, contribuindo também para a resiliência, relatou.  

E para os pais que dizem não ver interesse dos filhos em ir a parques e outras áreas verdes, Juliana sugere que os adultos olhem para si primeiro. “O filho é uma esponja das nossas atitudes, dos nossos exemplos. É preciso ter uma coerência das nossas falas com nossos comportamentos. Então, tem que virar a chave e entender a importância desses atos para a saúde deles, tem que fazer esse resgate, senão, eles não vão conseguir convencer a criança a ter uma vida afetiva, de encantamento com a natureza.” 

Como a criança vai conservar aquilo que ela não conhece?”, questionou Lis. Ela falou do advento da TV em 1950, aparelho que nos fez ficar em frente a uma tela pela primeira vez, seguindo depois com os videogames em 1970 e o boom da internet em 2000. Agora, está chegando a vez do metaverso, cuja proposta é que vivamos dentro dele. “Bebês hoje já mexem com smartphones e à medida que crescem passam a usar cada vez mais as telas. Para ter uma criança conectada com a natureza, o melhor preditor é o adulto. Precisamos conectar os adultos”, ressaltou. Lis recordou que o Brasil é o 5o país em um ranking mundial em número de smartphones. “Cada criança tem que ter direito a um computador, mas tem que ter direito a uma árvore também, senão, vai dar ruim lá na frente”, alertou. 

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