Mudar as crianças de escola nunca foi fácil. Em tempos de pandemia, então, a situação fica ainda mais complexa, visto que há mais elementos a serem levados em consideração, principalmente o ensino remoto e a integração em um novo ambiente de forma virtual. Mas se a ideia existe, como levá-la adiante?
Ouvidas pelo Canguru News, três especialistas dão dicas sobre o que é importante levar em consideração antes da mudança, e ambas têm um ponto em comum: ir a fundo nos motivos e ponderar bem para não trocar “seis por meia dúzia”.
Segundo Cristina Nogueira Barelli, coordenadora do curso de Pedagogia do Instituto Singularidades, de São Paulo, a primeira coisa é se perguntar: qual o motivo da mudança? “A questão não é ser ou não uma boa ideia, e sim aprofundar os motivos que levam a pensar nessa possibilidade”, explica. “Se já era um projeto da família, ou da criança – caso ela esteja em uma faixa etária na qual possa opinar – antes mesmo do início da pandemia, pode sim acontecer. Mas é preciso levar em conta as limitações impostas pela pandemia em termos de integração à nova escola, já que nem todas retornaram às aulas presenciais”.
Nesse momento, as restrições sanitárias impedem, por exemplo, que os alunos aproveitem as instalações do prédio e conheçam pessoalmente colegas e professores. “Não se pode ter a expectativa de outra integração que não seja a virtual. Não haverá uma integração plena”, diz.
Se a causa da mudança for a insatisfação com o ensino remoto, porém, é necessário ainda mais cautela, segundo Cristina. “Cada escola está lidando com o ensino online de uma forma; todas foram pegas de surpresa e tiveram que adaptar seus conteúdos, de acordo com suas propostas pedagógicas. Não se deve esperar, portanto, um jeito perfeito de lidar com essa questão”, ressalta. “Se a mudança for motivada por isso, é necessário pensar com cuidado, conversando com coordenadores e professores da futura escola para não haver uma decepção”.
Para Sueli Conte, psicopedagoga e diretora do Colégio Renovação, em São Paulo, os pais devem ser cautelosos com esta questão, mas é necessário, também, analisar qual o tipo de educação remota que a criança está recebendo. “Se o ensino on-line não está atendendo as necessidades de aprendizagem do aluno e nem às expectativas da família, é necessário, sim, fazer uma mudança. É imprescindível que uma possível troca seja baseada em uma boa pesquisa da nova escola. Os pais devem se atentar sobre metodologias de ensino e da plataforma usada para as aulas online, avaliar se há acompanhamento psicopedagógico e se os professores realmente interagem com os alunos ou se apenas postam atividades”, aconselha. Mas, como sempre, há prós e contras. “Os ‘prós’ é que as famílias podem escolher uma escola que esteja à frente das inovações tecnológicas que o período exige. Já entre os ‘contras’ pode estar a dificuldade que a criança tenha para se adaptar em uma nova escola, o que é muito comum”, alerta.
Leia também: Retorno às aulas presenciais: 10 aspectos a analisar antes da decisão
Conversas com psicóloga e gestora da nova escola podem ajudar na decisão de mudar de escola
Miriam Hallake, psicóloga escolar e especializada em terapia de família, também ressalta a importância de não tomar a decisão de forma impulsiva. “A mudança, em si, não é ruim. Se já havia uma insatisfação da criança ou da família antes da pandemia, não há problema em dar prosseguimento ao projeto”, diz. Mas se a motivação for outra – financeira, com a dificuldade em pagar as mensalidades, ou desagrado com os resultados das aulas remotas – é preciso esgotar as possibilidades de negociação.
Na primeira situação – a dificuldade financeira – Miriam sugere que a escola seja contatada e os pais ou responsáveis conversem sobre o que pode ser feito. “Problemas financeiros atingiram a todos, e é possível tentar um acordo”, ressalta. Mas se a questão for mesmo educacional, é preciso ponderar. “Em um ano, já deu tempo da escola mostrar interesse e criatividade para ministrar aulas on-line. Se houve uma decepção com a performance nesse aspecto, a troca pode ser benéfica, desde que os pais conheçam bem essa nova escola”, diz. Uma opção é agendar uma entrevista com a psicóloga e a gestora pedagógica do colégio. “Outra dica é conversar com pais de alunos da mesma faixa etária e que estudem nesse novo local. “Não adianta conversar, por exemplo, com pais de alunos do Ensino Médio, se seu filho tem 8 anos. A escola pode ser boa em um determinado segmento e insatisfatória em outro”, afirma. Segundo ela é importante também, se for possível, ter um dia de convivência na futura escola, para conhecer as instalações, os colegas e a equipe.
Outras questões que levam ao desejo de mudança também têm que ser avaliadas. A falta de interesse da criança nos estudos, por exemplo, pode não ser culpa da escola, e sim das mudanças e do estresse pelo qual todos estão passando. “Todos nós tivemos perdas na pandemia: financeiras, de pessoas queridas, da liberdade, da convivência. Pode ser que o aluno esteja desmotivado em consequência desse cenário, e aí uma conversa com a escola, os professores, pode auxiliar nesse processo”, diz Miriam.
O melhor momento para a mudança
E será que existe algum momento mais indicado para fazer essa mudança? No meio do ano, por exemplo, ou melhor esperar até o fim do ano? Sueli Conte sugere que a família deve analisar se a escola está contemplando seus objetivos, mas uma mudança sempre será um recomeço. “Por isso ressalto a importância de avaliar a escola e o desenvolvimento da criança, além da interação que o aluno está conseguindo atingir com seus colegas e professores. Neste momento em que estamos nos relacionando através das redes sociais, as crianças podem continuar a encontrar os amigos, mas o que não pode faltar é uma educação de qualidade, seja no ensino presencial ou no ensino remoto”, diz a psicopedagoga que acaba de lançar o livro “Educando para a Vida no Pós-Pandemia”, pela Editora Novo Século. Segundo ela, estamos em uma nova era, em que a educação teve de se reinventar para atender uma pandemia inesperada. “As plataformas virtuais são mais uma maneira de provar que a educação se transforma e muda o mundo. Desejamos voltar de vez ao ensino presencial, mas a vida jamais será a mesma e a escola também não. Estamos preservando o que temos de melhor: a capacidade de superar qualquer desafio. Isto é educar”, conclui Sueli.
Leia também: Escolas particulares perdem um terço das matrículas na pandemia