‘Eu apanhei quando era criança e ainda estou vivo’

Muitos pais de hoje sofreram violência física de seus genitores quando criança, mas isso não significa que devam reproduzir essa prática: além de ser considerada crime, bater na criança impactará negativamente em sua formação

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Menino sentado no chão de pernas cruzadas tem cabeça abaixada apoiada nas mãos
Segundo pesquisa, 62% dos brasileiros toleram a prática de bater em crianças como forma de correção
Buscador de educadores parentais
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Provavelmente, você já deve ter ouvido a frase do título de alguém que você conhece, não? O texto de hoje não é para apontar o dedo para essa pessoa e criticá-la sobre seus métodos de educação com os filhos, mas é um convite para entendermos juntos as diferentes percepções sobre nossa vida e dos nossos filhos.

Já disse em outros posts que a comunicação não violenta entrou em minha vida e se tornou um divisor de águas na minha compreensão sobre todos os relacionamentos que desenvolvi e irei desenvolver.

Essa proposta de comunicação tem como base o desenvolvimento da empatia para dissolver conflitos, consequentemente evitando gerar violência. Por essa razão vou usar a empatia para entender melhor as diferentes percepções sobre bater nos filhos.

Quando você ouve uma pessoa dizer: “Mas qual é o problema, eu também apanhei quando era pequeno e estou vivo até hoje”, qual é a sua reação?

Muitas pessoas vão achar isso horrível, outras vão achar normal, outras vão até dar risadas, mas existe um fato muito importante por trás dessa frase.

Como era o relacionamento na infância dessa pessoa com seus cuidadores?

É comprovado que a primeira infância, fase que vai até os 6 anos de idade, é a base da formação de personalidade de um indivíduo adulto, ou seja, a forma como entendemos o mundo e nossa vida tem início na primeira infância.

E como entendemos o que é o mundo e nossa vida?

Através da nossa capacidade de percepção, como distinguimos o que é de um jeito ou de outro.

Imagine então uma criança que cresceu em uma família onde o pai ou a mãe utilizavam a violência física (palmadas, cinta, etc) como forma de correção ou educação, como você acha que será a percepção desta criança no futuro?

Essa situação é mais comum do que imaginamos, recentemente (ano de 2021) foi realizada uma pesquisa pelo instituto IPSOS que demonstrou que 62% dos brasileiros ainda toleram a prática de bater em crianças como forma de correção. Lembrando que, desde 2014 foi sancionado a Lei Menino Bernardo “Lei da Palmada” que protege crianças e adolescentes de serem educados sem o uso de castigos físicos.

Se em pleno 2022 temos 62% de brasileiros que ainda acreditam que uma “palmada” pode ser uma boa ferramenta de educação, temos um cenário bem interessante, pois o que é “normal” para a maioria da população é basicamente um crime, já que está na Lei.

Então chegamos ao ponto que a conversa vira um questionamento para reflexões.

  • O que é “normal” para você?
  • Qual é a sua percepção sobre esses dados?
  • Você conhece alguém que utiliza ou já utilizou violência física com crianças ou adolescentes como forma de educação?

Lembram que no começo do texto falei que utilizaria a empatia com forma de conexão com as diferentes percepções?

Então, existe sim dentro de muitos adultos uma criança que só quer um abraço, um carinho, um acolhimento, uma criança que também tem medo, uma criança que talvez não tenha tido a oportunidade de vivenciar outras percepções.

Eu empatizo com essa criança, pois senti isso também algumas vezes na minha infância, de formas diferentes, sei como é o sentimento de revolta, de impotência, de pavor, de indignação. 

Por essa criança eu consigo empatizar, porém, aprendi que não sou mais criança, hoje eu sou um adulto e crio duas crianças. Não quero que meus filhos cresçam com a percepção de que o “normal” é usar a violência (qualquer que seja, física ou verbal) como forma de educação.


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Mauricio Maruo
É pai da Jasmim e do Kaleo, e companheiro da Thais. Formado como artista plástico, atua como educador parental desde 2016. É fundador do "Paternidade Criativa", uma empresa de impacto social que cria ferramentas de transformação masculina através do gatilho da paternidade. Criador do primeiro jogo de Comunicação Não Violenta direcionado para pais e crianças do Brasil.

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