Em 1982 eu tinha sete anos e estudava em escola pública, a Escola Estadual Professor Leon Renault, em Belo Horizonte. Foi meu único ano naquela escola. Próximo ao encerramento do ano letivo minha professora falou com minha mãe que, se ela pudesse, deveria me matricular em uma escola particular porque o ensino público estava piorando muito. Eu era da turma que podia pagar para estudar em escola particular, mas e aqueles outros, meus amigos que não tinham a mesma oportunidade?
Aquela escola era um modelo e sinto muitas saudades daquele ano. As salas de aula eram grandes e cada uma delas tinha uma pequena biblioteca e banheiros. O pátio era enorme, muito espaço para correr. Meus colegas não eram todos brancos como na escola particular.
Todas essas lembranças me dão uma tristeza ao pensar no descaso com o ensino público. Descaso que só aumentou nas últimas décadas. O certo não seria que a sociedade exigisse do Estado que a educação fosse prioridade? Ao invés disso, quem pode, paga, quem não pode, se vira com o que tem.
Me tornei aluna de escola privada, estudei em faculdade privada e hoje meu filho também é aluno do ensino privado. A educação no Brasil não é uma prioridade do Estado. Quem pode pagar opta pela matrícula dos filhos na escola particular.
E em tempos de pandemia e crianças afastadas da escola, quem pode faz aula on-line, quem não pode, fica sem. A desigualdade segue aumentando.
E em tempos de pandemia e crianças afastadas da escola, quem pode faz aula on-line, quem não pode, fica sem. A desigualdade segue aumentando.
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Acontece que agora o problema atingiu a escola particular. Pais e alunos privilegiados agora sentem o que os outros pais e alunos sempre sentiram: o descaso do poder público. Depois de tantos meses com as escolas fechadas as crianças estão adoecendo, não de covid-19, mas de doenças como depressão, ansiedade… Além disso, as crianças estão sofrendo mais com abusos sexuais e violência doméstica. E tem criança se matando.
Precisamos ver a educação como um bem para a nação, parar de pensar só nas escolas privadas e exigir investimentos nas instituições públicas para que todas as escolas possam reabrir com segurança! Não podemos fazer manifestos pela reabertura das escolas sem nos conectarmos com a realidade das escolas públicas.
Alunos de escola pública estão acostumados a ficar sem aula, sem professor em sala, sem material escolar, em greve. A escola tem um papel social importante, que extrapola o ensino. A escola é um ambiente de proteção. É também o lugar onde muitas crianças fazem suas refeições.
A pandemia de coronavirus se estende e nossas escolas permanecem fechadas, na contramão do que vem sendo feito em todos os países que têm a educação como prioridade. Na contramão da nossa própria constituição que diz:
O Art. 227 da Constituição Federal: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Precisamos parar de olhar do para os nossos problemas, dentro das nossas bolhas, e fazer um esforço coletivo para olhar além da nossa realidade.
A pandemia mostrou para a classe média, pais de alunos da escola particular, o que já acontece nas escolas públicas há anos.
A pandemia mostrou para a classe média, pais de alunos da escola particular, o que já acontece nas escolas públicas há anos. Precisamos aproveitar esse momento para pensar no coletivo. Na necessidade de investimentos para que todas as crianças, não apenas as crianças privilegiadas, possam voltar para a escola em segurança, com todos os protocolos. Vamos valorizar os professores e o ensino.
Um país que pensa no seu futuro tem as infâncias como prioridade. Quando os casos de covid-19 aumentam, fechem tudo, mas deixem a escola aberta!
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Canguru News.
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Bateu saudade aqui de bons e não tão bons momentos vividos no Leon Renault. Escola modelo a época, a média para passar de ano era 75%.
Estudei lá do primeiro ano a oitava serie, mtas aventuras.
Tenho uma foto desta em algum lugar. kkkkk
Bebel, vc sempre me surpreende! Mudar de opinião é das formas mais corajosas de viver. Eu também comecei com o fique em casa, mas ficar em casa em um país onde o poder público coloca a política acima do povo não funciona. O Brasil não vê as mulheres e crianças como cidadãos. Meus aplausos de pé por ser uma voz tão forte para nós.
Nossa, Bebel, obrigada por dar voz às mães e às crianças. Tudo voltar, menos a escola, e o cúmulo do descaso com a educação. Claro que o isolamento inicial foi necessário. Mas a primeira coisa a voltar tinha quer ter sido a escola. Super concordo com vc!
Tbm não entendi!!! A opinião dela era totalmente oposta!!! Mas fico feliz que tenha enxergado. Antes tarde que nunca!
Que mudança da autora! Deixou de ser o fique em casa gourmet, pra ser volta as aulas. Pimenta nos olhos dos outros é refresco não é? Agora está ardendo nos olhos de muitos. E da autora tbm né? Só que nos olhos da grande maioria arde desde de maio. A empatia custou a chegar pra essa colunista!
Engraçado, até pouco tempo atrás, a própria autora do texto tinha uma opinião contrária à abertura das escolas e ai da mãe que discordasse dela nesse sentido!