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A mãe que se perdeu de si
A mãe que se perdeu de si, tem no vocabulário muitos depois.
Depois que o filho dormir, eu como.
Depois que ela melhorar dessa dor de ouvido eu volto para atividade física.
Depois que eles crescerem eu terei mais tempo.
Depois que ela dormir eu faço as minhas coisas.
Depois eu cuido de mim.
Depois que não precisarem tanto de mim eu volto a sonhar.
Depois, depois, depois…
Quando um filho nasce, ele se torna uma prioridade na nossa vida, né? Mas qual a dosagem certa? Onde está o equilíbrio?
Quando eu penso no meu puerpério, eu sempre me lembro de uma coisa: minha xícara de chá passava o dia no micro-ondas. Um chá que eu esquentava mil vezes, pois sempre esfriava e eu nunca tomava.
Não tomava, pois sempre tinha algo que virava prioridade: uma fralda para trocar, um choro para ser atendido, um banho para dar, uma bebê com fome, um neném querendo um colinho… e junto sempre vinha um “Depois eu tomo!”.
E o chá ficava lá esfriando…
Aconteceu comigo e com certeza, também aconteceu com você.
E acredite, isso tem uma explicação, me acompanha nesse raciocínio:
Toda criança nasce completamente dependente. Se ela não for cuidada por alguém, ela morre. Sabemos disso! Quando um bebê chora, gera em nós um sentimento de urgência, uma inquietude, um desassossego que só passa quando vamos lá e fazemos o que for preciso para cuidar dessa criança.
Brinco que a natureza é tão perfeita, que o choro do nosso bebê dói em nós. Isso é pura preservação da espécie! Ignorar o choro do bebê é ir contra a natureza materna.
Então, desde que o bebe chega, seguimos, cuidando, suprindo as necessidades, atendendo aos chamados, sendo amparo, colo, apego seguro para aquela criança e tudo mais o que ela precisa.
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Nos acostumamos a estar nesse lugar de cuidar, suprir, doar. Fazemos isso mesmo quando estamos cansadas, exaustas, com fome, com sono.
E qual é o maior desafio disso? Atender as necessidades dos filhos sem esquecer as nossas necessidades. Conseguir se conectar com eles sem se desconectar de nós mesmas. Manter o nosso olhar nas crianças sem nos perder de vista.
Sei que o tempo passa depressa, e que parece que foi ontem que você chegou em casa da maternidade com aquele pacotinho de amor. Eu sei que um dia eles vão crescer, e não vão precisar tanto de nós. Sei que é uma fase.
Mas quem será você, quando essa fase passar?
Outro dia, atendendo uma mãe online, ouvi algo que me fez ter vontade de entrar pela tela do computador e abraçá-la.
“Ficar 50 minutos me vendo nessa tela é muito estranho. Eu não lembro mais o que é olhar para mim”.
Depois da sessão fiquei pensando quantas mães me diriam isso? Quantas já se sentiram ou se sentem assim? Muitas!
E se você é uma delas, vou te dizer o que eu disse para minha paciente:
Querida, queria estar aí para poder te dar um abraço. Eu entendo o que você está me dizendo, entendo o que você está sentindo agora. E eu sei o que aconteceu: você se perdeu pelo caminho! E isso acontece, sabe? Todo mundo já se perdeu pelo caminho alguma vez. Mas quero te dizer que você pode fazer o caminho de volta e encontrar o que ficou esquecido pelo percurso.
Contei para ela das minhas xícaras de chá, sempre frias, esquecidas em algum lugar pela casa. Combinei que na próxima sessão vamos começar em silêncio, por 5 minutos. Eu com a minha xícara de chá aqui e ela lá, com a dela. Ela se olhando na tela do computador, se vendo e tomando um chá quentinho.
Afinal, fazer o caminho de volta começa por um passo, nem que seja uma xícara de chá.
*Este texto é de responsabilidade do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Canguru News.
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Patricia Nolêto
Patrícia Nolêto de Campos, é mãe da Clara, 5 anos. Psicóloga, palestrante, especialista em Terapia Cognitivo Comportamental, trabalha há mais de 19 anos com psicologia clínica com atendimento a adultos crianças, adolescentes e pais. Desenvolveu workshop de Treinamento de pais e Treinamento de Educadores e ferramentas terapêuticas que facilitam a regulação emocional das crianças. Saiba mais em http://www.patnoleto.com.br
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