Equilíbrio entre trabalho e filhos não passa de um mito, diz especialista

Conflito entre papéis é um problema inerentemente humano, mas assumir ambas as funções pode ter vantagens, avalia a psicóloga norte-americana Yael Schonbrun; abaixo, ela fala sobre culpa, burnout parental, tecnologias e sobrecarga de tarefas

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Psicóloga Yael Schonbrun, professora assistente na Universidade Brown (EUA)
Psicóloga Yael Schonbrun, é mãe de três e apresentadora de um podcast sobre ciência e parentalidade | Foto: divulgação
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Equilibrar as demandas entre a criação dos filhos e a vida profissional é sempre uma questão desafiadora. A dedicação ao trabalho muitas vezes gera um sentimento de culpa nos pais, por não poderem participar da rotina das crianças tanto quanto gostariam. Porém, por mais conflituosas que sejam essas funções, as habilidades adquiridas na carreira podem ajudar no papel de ser mãe e pai, afirma a psicóloga Yael Schonbrun, professora assistente na Universidade Brown (EUA), mãe de três filhos e apresentadora do “Psychologists Off the Clock” (Psicólogos fora do horário, em português), podcast sobre ciência e parentalidade.

Em seu livro mais recente, “Work, Parent, Thrive” (Trabalhar, cuidar dos filhos, prosperar, em português), vencedor em 2023 do prêmio National Parenting Product, a autora traz 12 dicas baseadas na ciência para ajudar a lidar com a dupla jornada dos pais.

“Nossos papéis como pais e profissionais conflitam entre si, o que é uma realidade difícil. Muitas vezes, no entanto, negligenciamos as maneiras pelas quais eles se enriquecem quando associados um ao outro”, disse ela, em entrevista por e-mail à Folha de S. Paulo. Para Schonbrun, o equilíbrio entre as funções não passa de um mito. Destacamos a seguir os principais tópicos abordados na conversa, em que ela fala sobre conflito entre vida pessoal e profissional, como lidar com a culpa e o esgotamento que leva ao burnout parental. 

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Como lidar com a culpa de ter de dividir o tempo entre criação dos filhos e carreira:

Emoções como culpa existem para fins de proteção. Ela pode ser útil, por exemplo, em uma situação que indica dano potencial, como quando a criança está perto de uma piscina ou em um local movimentado com estranhos. O problema está na culpa que sugere um dano quando ele não existe. Como resultado, os pais agem de forma prejudicial, mais até do que seria o tal dano se não tivessem feito nada. Por exemplo, sentir-se culpado porque o filho fica triste quando é deixado na creche pode levar os pais a largarem o emprego e a nunca deixá-lo com ninguém. Mas, quando se faz isso, interfere-se na capacidade do filho de ser independente e de se apegar a outros cuidadores (o que é bom para o desenvolvimento deles). Meu conselho para os pais responderem à culpa quando ela aparecer (porque ela aparecerá!):

  • Faça uma pausa e observe a culpa quando ela surgir;
  • Considere se a culpa está oferecendo informações úteis sobre o verdadeiro dano;
  • Se estiver destacando um dano verdadeiro, considere agir para conter o maior perigo (e tente deixar outros papéis para trás);
  • Se a culpa não estiver fornecendo informações úteis, volte sua atenção para a função que está [exercendo].

Como manter a vida pessoal e profissional em equilíbrio:

Muitas vezes pensamos na relação entre trabalho e parentalidade como algo totalmente conflituoso. Mas quando se trata de aprimoramento mútuo, vale considerar como as habilidades de trabalho oferecem algo especial ao papel de pai ou mãe. Também podemos considerar como, nos momentos em que nosso filho se recusa a usar calças ou nosso adolescente se recusa a seguir o toque de recolher, ir para o trabalho pode oferecer uma oportunidade real de eliminar um pouco do nosso estresse. Da mesma forma, quando o trabalho parece incrivelmente solitário, você vai para casa e abraça seus filhos, o que nos livra da solidão que sentimos no ambiente profissional. Nossos papéis podem ajudar, tornando-nos mais habilidosos, amortecendo nosso estresse e até mesmo dando mais significado às nossas atividades diárias. Reconhecer essas possibilidades nos capacita a buscar esses benefícios e a saboreá-los quando ocorrem.

Como pais e mães podem lidar com a sobrecarga de demandas:

Estudos mostram que o burnout parental está aumentando por uma série de razões, desde a pressão cada vez maior sobre os pais até um mundo que é regularmente abalado pela política e economia. Há tantas mudanças que precisam acontecer para tornar nosso mundo um lugar mais saudável e sustentável. É o que chamo de abordagens “de fora para dentro” no problema do conflito trabalho-família. Mas também existem maneiras pelas quais a ciência psicológica pode ajudar os pais que trabalham. Chamo estas “de dentro para fora”.

Quando se trata de conflito trabalho-família, é importante ressaltar que o conflito entre papéis é um problema inerentemente humano. Ele vive não apenas no mundo fora de nós, mas também dentro de nossos corações e mentes. É humano querer fazer contribuições fora de casa e, ao mesmo tempo, participar de relacionamentos profundamente amorosos com sua família. Mas se envolver em vários papéis, o que a maioria dos adultos faz, significa que você será puxado em direções diferentes. Dado o quão desconfortável é a tensão entre os papéis, não é de se admirar que queiramos nos livrar dela. Mas existem maneiras pelas quais essa tensão pode nos ser útil.

É na aplicação de ambas as soluções – “de fora para dentro” e “de dentro para fora” – que podemos chegar a uma vida profissional mais feliz e saudável.

O que priorizar em uma agenda com tantos prazos:

É paradoxal, mas um passo importante a ser dado quando temos múltiplas demandas e múltiplos prazos é desacelerar, pausar, e pensar no que tirar da lista de tarefas. Pesquisas mostram que o cérebro humano é muito melhor em adicionar tarefas a uma agenda lotada do que em subtrair essas atividades. Além disso, quando nos sentimos sobrecarregados, essa tendência de ignorar a subtração fica ainda mais forte. Apreciar este conceito científico pode nos ajudar a desenvolver práticas mais efetivas para tirar coisas da nossa programação. A próxima dica é entender que o cérebro humano não executa bem várias tarefas. Toda vez que isso acontece, perdemos o foco e a energia. Então, para resumir: tire coisas da sua lista quando puder e, para o que restar, reserve espaços de tempo para progredir.

A tecnologia e a educação dos nossos filhos:

A tecnologia não é santa nem vilã. Tem vantagens e desvantagens. Em vez de se livrar da tecnologia, deve-se ajudar o filho a enxergá-la como um dos muitos lugares para reunir ideias e dados importantes. Da mesma forma, a tecnologia é uma ótima maneira para as crianças se conectarem com seus colegas. Mas você também pode ajudá-los a encontrar momentos para deixar a tecnologia de lado em face da interação em tempo real, na vida real, com os amigos.A tecnologia não deve ser difamada ou glorificada. Em vez disso, podemos enxergá-la pelo que ela pode oferecer, embora ainda existam limitações. E podemos ensinar nossos filhos sobre como usá-la com sabedoria.

Leia reportagem completa aqui.

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