Por Cris Guerra
Era um dia triste, desses em que amanhece, mas continua escuro aqui dentro. Eu viajava a trabalho, a solidão que já é de praxe. Aquela angústia de avião que não decola, motor ligado e um som de espera que não cessa. Alcancei na bolsa o meu caderno pautado e comecei a buscar assunto, como quem vasculha geladeira vazia desvendando o que fazer pro almoço. Talvez fosse só pelo prazer de escrever à mão, que sempre me fez companhia.
Sob o título “Lista de Alegrias Cotidianas”, elenquei o primeiro item:
» Escrever à mão com caneta nova.
Tão bom que eu não quis parar.
» Levar Francisco à escola (momento em que ele fala naturalmente, sem que eu precise fazer perguntas, e assim tenho uma noção de como vão as coisas).
» Dar bom-dia na rua, ganhar um sorriso. Eu já escrevia sem pensar. A mão autônoma, como se tivesse a coreografia na cabeça.
» O primeiro café expresso do dia.
» Sentar no sofá da sala e deixar o corpo esquentar sob o sol da manhã que invade a casa.
» Observar a preguiça dos gatos.
» Três episódios seguidos de Friends.
» Encontrar um ouvinte, ganhar um abraço.
» Conhecer um leitor, abraçar forte.
» Abraçar o Fran, apertar o Fran.
» Imitar a dublagem do extinto Emergência 911.
» Francisco jogando basquete.
» Cozinhar degustando uma Stella Artois geladinha.
» Livro novo chegando da gráfica.
» Playlist da Fe Fadel na caixa de mensagem.
» Aquele insight incrível na terapia.
» Pão de queijo quentinho na esquina de casa.
» Aquela frase no livro que a gente quer grifar.
» O gato no meu colo enquanto trabalho.
» Exercício bem feito no treino de TRX.
» O sono das seis da manhã.
» O último episódio editado do 50 Crises chegando numa mensagem de WhatsApp da Ju Sodré.
» Geladeira lotada de frutas.
» Assistir a um filme com o Fran dormindo no meu colo.
» Lavar os pés depois de passar o dia todo andando descalça pela casa.
» Massagem da Marina.
» Massagem da Letícia.
» Avião que pousa.
» Celular com 4G.
» Cama gigante num bom hotel.
» Banho quente.
» A Suzi me mandando mais um meme.
» Descobrir que a gente precisa de muito pouco para ser feliz.