A dificuldade de se comunicar verbalmente, em diferentes situações, com outras crianças, professores e mesmo pessoas da família pode ser sinal do mutismo seletivo. Trata-se de um transtorno relacionado à ansiedade que costuma ser diagnosticado normalmente entre os 3 e os 8 anos, mas pode acontecer em qualquer idade, inclusive, entre adultos.
As crianças com mutismo seletivo não conseguem falar em ambientes sociais em que não se sentem seguras, como na escola, viagens, festas ou outros lugares fora de casa. A recusa em falar busca amenizar uma grande ansiedade com a qual a criança não sabe lidar e por isso fica calada, o que causa sofrimento a ela mesma e aos que estão à sua volta, e traz vários prejuízos de ordem socioemocional e de aprendizado, em um período importante do desenvolvimento infantil. Nos casos mais graves, o diálogo se dá apenas com familiares diretos, com os pais e irmãos.
“A maioria das crianças com mutismo seletivo têm uma predisposição genética para a ansiedade. Em outras palavras, eles herdaram a tendência de ficar ansiosos de um ou mais membros da família. Muitas vezes, essas crianças apresentam sinais de ansiedade severa, como ansiedade de separação, acessos de raiva e choro frequentes, mau humor, inflexibilidade, problemas de sono e timidez extrema desde a infância”, explica a psicóloga e presidente da Associação Brasileira de Mutismo Seletivo e Ansiedade Infantil, Francilene Torraca.
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Como identificar
Algumas características que ajudam a identificar uma criança com mutismo seletivo são:
- Dificuldade para interagir com outras crianças;
- Falta de comunicação com professores;
- Dificuldade para se expressar, mesmo que através de gestos;
- Timidez excessiva;
- Isolamento social;
- Dificuldade em ir ao banheiro em ambiente não familiar, fazendo xixi nas calças, ou de comer na escola.
A psicóloga ressalta ser comum que as crianças com mutismo seletivo tenham uma expressão facial vazia e pareçam nunca sorrir. “A linguagem corporal é rígida ou estranha quando em um ambiente social e as crianças parecem muito desconfortáveis ou infelizes. Algumas virarão a cabeça, mastigarão ou enroscarão o cabelo, evitarão o contato visual, ou se retirarão para um canto ou para longe do grupo, aparentemente mais interessadas em brincar sozinhas. Outras são menos evitativas e não parecem tão desconfortáveis, podendo brincar com uma ou algumas crianças e ser mais participativas em grupos”, acrescenta Francilene.
Mutismo seletivo x timidez
Crianças tímidas também tendem a ser mais caladas e por isso pode acontecer de confundirem a timidez com o mutismo seletivo, prejudicando a identificação do diagnóstico e tratamento corretos. “A timidez é um fenômeno bastante comum e nem sempre causador de grandes inconvenientes ou problemas – por vezes, é até uma forma de proteção e um tempo necessário para cada um se adaptar a uma situação, ambiente ou pessoa nova”, destaca Franciele. Ela diz que os pais devem ficar atentos para quadros de timidez onde a criança apresenta fenômenos de sofrimento e começa a se isolar cada vez mais de eventos e situações de troca relacional ou exposição.
Como promover mudanças de comportamento nos filhos
Segundo Franciele, entre as intervenções realizadas com crianças com mutismo seletivo estão técnicas da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), como as de exposição gradual e dessensibilização sistemática. Em alguns casos, pode ser recomendado pelo psicólogo que a criança também tenha o acompanhamento de um psiquiatra infantil ou que sejam realizadas sessões com a família.
“Partindo de um entendimento de que é um transtorno infantil, a participação dos pais durante o processo terapêutico assume importância fundamental para o andamento da terapia. Para auxiliarem no progresso da criança, os pais precisam passar por treinamento com a finalidade de aprender procedimentos e habilidades que favoreçam a mudança comportamental dos filhos através da interação”, completa Franciele.
Entre algumas medidas que podem ser utilizadas pelos pais estão:
- Não forçar a criança a falar;
- Evitar responder pela criança;
- Elogiar quando a criança demonstra progresso em sua capacidade de comunicação;
- Estimular a criança a fazer coisas que são mais difíceis para ela mas possíveis de fazer, como por exemplo comprar pão;
- Deixar a criança confortável nos ambientes, de modo a evitar que sinta que é o centro das atenções.
Quando não existe resposta ao tratamento nem melhoras evidentes, o psiquiatra pode indicar o uso de inibidores seletivos da recaptação de serotonina, os ISRS, que atuam a nível cerebral. Estes medicamentos só devem ser usados com orientação do médico e em casos muito bem avaliados, já que não existem muitos estudos que comprovam seu efeito no tratamento de crianças com este transtorno, ressalta a especialista.
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