Por Luís Giffoni
Sabe aquela sensação de voar que a gente experimenta quando sonha? Aquela impressão de vencer a força da gravidade e criar asas invisíveis que nos levam pelo espaço? O peso desaparece, a leveza toma conta do corpo, o vento passa pelo rosto, os cabelos ficam em pé, a gente vence as distâncias sem perceber. Esse sonho é possível. Acordado. Como? Esquiando nas montanhas.
Disparar encosta abaixo com esquis nos pés é uma das melhores sensações do mundo. A gente só escuta o barulhinho da neve, não percebe os movimentos, tantos e tão rápidos que não tem tempo de pensar neles. No fim do dia, a cabeça está nova, novinha, como se nunca tivesse ficado quente com provas de matemática, português, ciências…
Até o tombo é gostoso. Cair na fofura dá medo na hora, mas deixa um alívio muito grande depois que passa. Todo mundo cai. Nosso avô, o vovô Luís aí em cima, levou o tombo mais feio. Deu uma cambalhota no ar, caiu de frente. Ploft! Chi, a gente pensou, quebrou algum osso. Mas ele se levantou e continuou descendo a montanha conosco. O Vitor também achou que era um campeão e beijou o chão. A Luiza caiu quando estava numa pista congelada. Aí doeu um pouco.
Esquiamos no Chile, em LA PARVA e no VALLE NEVADO (foto), perto de Santiago, a capital do país. Os dois lugares são muito bonitos, no meio dos Andes. Vale a pena ir lá. As pistas começam, às vezes, a 3 700 metros de altitude, quase 700 metros a mais que o Pico da Neblina, o ponto culminante do Brasil. Para chegar lá no alto, a gente sobe de cadeirinha, ou teleférico, que passa por cima de precipícios e pedras pontudas. É uma diversão a mais. Dá um frio na barriga… Também há gôndolas, uns bondinhos do Pão de Açúcar de tamanho bem menor. São mais quentinhas.
De cadeirinha ou de gôndola, a gente enxerga em todas as direções o livro aberto da história da Terra. Os Andes são uma enorme cordilheira que se ergueu do fundo do mar por causa do choque de duas placas tectônicas. Até hoje elas continuam se empurrando, uma levantando a outra, por isso acontecem muitos terremotos na região. Não tivemos a sorte de ver um.
Por tudo isso, o esqui é um dos esportes mais completos. Bom para a cabeça e bom para o corpo. As pernas da gente ficam duras, igual aço. O tórax fica livre e solto, como se óleo fosse passado nele inteiro. Até a parte chata, que é colocar as botas, a gente acostuma e faz sem perceber. E tem o alívio, no fim do dia, quando a gente as tira.
Esquiar seria um bom presente para o Dia das Crianças. Mas há um problema. A neve, em outubro, já derreteu todinha. Uma pena. Por isso, o presente pode ficar para o ano que vem, nas férias de julho. Vale, sim, a pena. A sensação de voar não tem preço. E, até julho, a gente curte a espera, voando na neve da imaginação.
LUÍS GIFFONI
é cronista, romancista e palestrante. Autor de 26 livros, tem nas viagens uma de suas paixões. Nelas aprende a diversidade do mundo e das pessoas, experiência que acaba traduzindo em suas obras. Neste espaço, dá dicas sobre como aproveitar o mundo com os pequenos. No Mês das Crianças ele escreve a seis mãos com os netos Luiza, 10, e Vitor, 6, alunos do Coleguium.
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