Hipnose em criança é possível, mas médicos e psicólogos fazem ressalvas

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Por Rafaela Matias

Na década de 80, um polêmico comercial de uma marca de chocolates circulava pelos canais de tevê aberta mostrando uma criança “hipnotizando” os espectadores para que comprassem o produto. O vídeo foi questionado pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária e deu o pontapé inicial para uma discussão sobre o uso de técnicas persuasivas e expressões de comando nos comerciais infantis no Brasil. A partir dali, uma série de propagandas foram proibidas e retiradas do ar. Porém, se na publicidade o acesso ao subconsciente foi vetado, na saúde ele é defendido por diversos profissionais e utilizado, inclusive, para fins terapêuticos.

A Convenção Brasileira de Hipnose, realizada em Belo Horizonte, reuniu vários especialistas para discutir assuntos relacionados à técnica. Um dos organizadores do evento, o hipnólogo e bacharel em psicologia Alberto Dell’Isola, defendeu a utilização da hipnoterapia em crianças e afirmou que ela pode tratar tudo o que está relacionado ao estresse. “Ansiedade, dificuldades de aprendizagem, problemas para dormir, fobias, xixi na cama. Tudo isso pode ser tratado com hipnose”, afirma. Segundo ele, a técnica usa a imaginação para alterar a percepção da realidade, e as crianças já fazem isso o tempo todo, haja vista os amigos imaginários. Por isso, para hipnotizar os pequenos, é preciso que o profissional entre no mundo deles. Um exemplo: se a criança tem medo de escuro porque acredita que monstros podem aparecer, o hipnotista vai entrar naquela fantasia e orientá-la a se imaginar segura mesmo na ausência da luz. “É uma visualização que vai alterar o estado emocional e gerar um ambiente mental mais tranquilo e adequado para o desenvolvimento”, explica Dell’Isola, afirmando ainda que a idade mínima para aplicação é aquela em que a criança já é capaz de se comunicar. Já a quantidade de sessões pode variar de uma a 20, de acordo com o tipo de problema a ser tratado.

A americana Kelley Woods trabalha com crianças há 15 anos e explica que a técnica funciona até melhor com elas do que com adultos, já que os pequenos são bem mais suscetíveis à hipnose e podem ser influenciados por qualquer pessoa próxima. “As crianças vivem em estado de transe, o mesmo que os adultos demoram a alcançar. O inconsciente é aberto e está disponível para tudo o que ela vê e ouve. Somente a partir dos 8 anos a mente cria uma espécie de parede que protege essa parte”, afirma. Segundo ela, os próprios pais têm uma influência hipnótica muito grande sobre os filhos e nem sempre por meio das palavras. Por isso, eles precisam aprender a focar aquilo que querem que os filhos façam, e não o que não querem. “Fazer xixi na cama, por exemplo, às vezes vira um problema tão grande que acaba estimulando a criança a fazer ainda mais. É melhor focar aquilo que queremos que aconteça ou os pontos positivos. Isso vai reduzir a pressão e facilitar que a criança se afaste do comportamento negativo”, defende.

Outra convidada do evento, a americana Melissa Tiers, ensinou como unir a psicoterapia e a neurociência no atendimento de crianças: “Podemos tratar raiva, foco, procrastinação, ansiedade, performance atlética, autoconfiança. Tudo isso ensinando a criança a controlar o próprio cérebro, dando um senso de autonomia e de poder a elas”. Melissa conta ainda que ensina alguns de seus pacientes mirins a hipnotizar outras pessoas, como os amiguinhos da escola ou algum colega que esteja praticando bullying. “As crianças não têm poder, não to- mam muitas decisões. Eu trabalho dando esse poder a elas e até ensino técnicas comportamentais e de programação neurolinguística. Quando elas estão sofrendo bullying, conseguem manipular quem está fazendo ou conseguem pregar as mãos dos coleguinhas na mesa, se quiserem”, conta.

A pediatra Ana Maria Lopes, do Departamento de Desenvolvimento e Comportamento da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), questiona. “Do ponto de vista ético, uma criança não pode exercer ação sobre a outra sem consentimento prévio desta e dos pais”, defende. Embora a SBP não tenha um posicionamento específico em relação à hipnose, a médica Ana Maria Lopes explica que todo sofrimento psíquico na infância e seus trata- mentos requerem uma avaliação ampla, com investigação de causas orgânicas e sobre- tudo do contexto familiar e social no qual a criança está inserida. “Qualquer tipo de tratamento de sintomas psíquicos deve ser realizado por profissionais habilitados. Os pais devem discutir com o pediatra a escolha de tratamentos alterna- tivos e de preferência solicitar a indicação de profissionais devidamente regulamen- tados por seus conselhos de classe”, orienta a pediatra.

De acordo com o mé- dico Emmanuel Fortes Silveira Cavalcanti, psiquiatra e terceiro vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), a hipnose é regulamentada pelo órgão e não há objeções para utilizá-la em crianças. “É uma técnica reconhecida e à qual muitas pessoas respondem bem. Algumas alterações podem ser tratadas com hipnose, inclusive em crianças”, defende. O especialista ressalta, porém, que, para um profissional ser considerado qualificado para exercer a técnica, é preciso um treinamen- to que garanta conhecimento profundo sobre hipnose, neurofisiologia, eficácia do tratamento, locais onde pode ser aplicado e também sobre os efeitos colaterais. Outro ponto importante é que é proibido que médicos utili- zem a hipnose para fazer exibições no Brasil – a cha- mada hipnose de palco. “Isso não é permitido. Não é uma técnica isenta, pode produzir sequelas psíquicas, por isso não deve ser tratada como uma brincadeira ou um show”, arremata Cavalcanti.

Abaixo veja uma pessoa sendo hipnotizada na prática:

 

 

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