‘As coisas boas que eu levei 45 anos para descobrir’

Ao olhar para dentro de mim, descobri que gosto de cozinhar e cuidar de plantas, entre outras pequenas coisas que a rotina antes engolia

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O autoconhecimento nos faz entender o valor das pequenas coisas, entre elas, cozinhar, como mostro nessa foto em que eu, Bebel, estou com meu filho Felipe preparando alguma receita
Todo mundo precisa se alimentar e já que eu faço questão de ter uma alimentação saudável, por que não me arriscar na cozinha?
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Eu fui daquelas mães que achava totalmente viável trabalhar o dia inteiro, deixar o filho na escola em período integral, ser boa profissional, boa mãe, boa esposa, boa amiga. De fato, eu acreditava que era fácil fazer essa conta fechar.

Em 2015 completei 40 anos, resolvi fechar meu escritório e trabalhar em casa, terminando os projetos que ainda precisava entregar. Tirei o Felipe do horário integral e comecei a passar todas as manhãs com ele, tentando me equilibrar entre o homeoffice e a maternidade. Nessa época eu tinha a Simei que cuidava da casa, da nossa comida, das roupas. Mesmo assim foi uma loucura! Nunca tinha imaginado que eu e meu filho precisaríamos passar por um longo período de adaptação. Adaptação mãe e filho. Adaptação com uma nova rotina, uma criança ficando metade do dia em casa, a gente não sabia o que era isso. Um processo de autoconhecimento. E de reconexão mãe e filho.

2020 chega e todo mundo é obrigado a passar por isso, trabalhar em casa, cuidando dos filhos, e com o bônus de cuidar da casa, da comida, da roupa e tudo mais. Não é nada fácil, nadinha! Quando a gente passou por isso, anos antes, precisamos fazer terapia, nós dois! Foi muito difícil achar o equilíbrio. E olha que naquela época não tinha esse vírus louco matando pessoas do lado de fora, não tinha isolamento social, tinha meio período na escola, tinha festas, tinha encontros com amigos, ninguém precisava usar máscaras ou ter medo do invisível.

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Agora o peso é muito maior, e tudo bem se estiver difícil para você, não tem nada de errado em não dar conta. Eu estou fazendo terapia online, eu sigo medicada para não ter mais uma crise de depressão, eu não dou conta de tudo. Nós três dividimos as tarefas da casa e, tudo bem se não ficar tudo impecável, hoje mesmo aqui está um caos. Eu trouxe minha mesa de trabalho para o quarto do meu filho para conseguir trabalhar e ficar de olho nas aulas online ou nos vídeos que ele assiste no YouTube. Tem uma pilha de roupas para lavar, tem almoço para fazer, a poeira está se acumulando em cima dos móveis e eu vou passado um paninho na hora que dá e a gente vai levando.

Cozinhar se tornou uma terapia

E apesar de todas as dificuldades de passar tanto tempo trancados em casa e de nunca ter sido fã de cozinha, hoje eu me pego amando cozinhar, inventando receitas, pegando dicas com amigas e fazendo as coisas que eu fico com vontade de comer. Se antes tínhamos o hábito de comer em restaurantes todos os fins de semana, hoje eu faço em casa os pratos que sempre gostei, e cozinhar se tornou mais uma terapia.

E o motivo de estar sendo prazeroso é que, nesse processo de autoconhecimento, eu escolhi fazer com prazer, porque não tem nada pior do que fazer as coisas odiando fazer.

Todo mundo precisa se alimentar e já que eu faço questão de ter uma alimentação saudável, por que não me arriscar na cozinha? É verdade que já deixei o arroz queimar dezenas de vezes, mas também já fiz um camarão na moranga divino, já fiz vários caldos e moquecas e frango com quiabo (meu prato favorito como boa mineira).

Já coloquei meu filho para fazer bolo e até postamos um vídeo dele ensinando a receita do bolo de banana no meu IGTV. Ele ficou craque nos bolos, segue as receitas direitinho. Já eu, sempre mudo as orientações mas fica bom também. Brinco que aqui é a cozinha experimental da Bebel, nenhuma receita é seguida, é tudo no “feeling”. E tenho a impressão que esse conhecimento na culinária é uma herança de família e está nos meus genes.

É muito bom olhar para dentro de mim e descobrir que existem muitas coisas boas que eu levei 45 anos para descobrir. Esse processo de autoconhecimento me fez entender o valor de cozinhar, de cuidar de plantas e de ter carinho e zelo com pequenas coisas que a rotina antes engolia. Eu ainda tenho insônia. Eu ainda me sinto angustiada quando vejo a situação do país e que as pessoas não estão se importando com as outras nem respeitando o isolamento. E que tem gente passando fome. Mas eu já entendi que não tem como dar conta de tudo. Eu posso dar conta de pequenas coisas, ajudar uma pessoa, divulgar um projeto que apoia quem precisa, doar uma cesta básica. Um passo de cada vez, um dia de cada vez. A gente tem pressa, mas é preciso ter paciência e saber esperar. Tudo tem seu tempo.

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