Pais reivindicam protagonismo na criação dos filhos

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    Antes apenas provedor da família, pais da nova geração desejam estar mais presentes nos cuidados com os filhos, em uma atitude que fortalece os vínculos com a criança

    Por Sabrina Abreu

     

    Bruno Santiago cuida de seu filho Samuel | Foto: Gustavo AndradeHá dois anos e dez meses, quando sua mulher, Tereza, descansava após dar à luz Samuel, o publicitário Bruno Santiago deu o primeiro banho no filho. Foi uma experiência da qual ele se orgulha até hoje e se lembra com carinho. Mas não foi fácil. “Com boa intenção, as mulheres da família queriam fazer isso por mim”, conta. Apesar de um pouco assustado com a fragilidade do bebê, Bruno teve coragem de realizar a tarefa para a qual havia se preparado durante o período de gestação da mulher, ou, como ele mesmo gosta de dizer, enquanto esteve “grávido”.

    É comum ouvir a frase “Quando um bebê nasce, nasce também uma mãe”. Mas e o pai? Como fica nessa história? Em nossa sociedade, o papel do homem em relação ao filho, a começar pelos primeiros dias da criança e por toda a primeira infância, é geralmente relegado a segundo plano. Complexos, os motivos refletem heranças de campos tão diversos quanto a religião, a psicologia e a economia. Mas uma nova geração de pais reivindica o protagonismo, ao lado das mães, na vida das crianças. E, para eles, isso significa também — ou principalmente — trocar a fralda, dar comida e colocar o filho para dormir.

    No catolicismo, por exemplo, a figura materna é sacralizada. A figura de Maria suplanta completamente a de José e o pai de Jesus tem papel coadjuvante. Já para Freud, o bebê acredita ser uno com a mãe, durante os primeiros meses de vida. Assim, ao pai só resta ser “o outro”. Mais fácil de relacionar ao nosso dia a dia, a economia também tem influência importante na equação. Quando as mulheres ainda não faziam parte do mercado de trabalho, especialmente até os anos 1930, elas eram as responsáveis por se relacionar com as crianças, enquanto os pais eram meros provedores. Os tempos mudaram, mas, embora os gêneros sejam representados de forma mais balanceada como mão de obra (elas são 47% da força de trabalho, segundo dados do IBGE), os homens continuam a ganhar melhor (30% a mais que as mulheres, segundo o instituto) e a ideia do pai como um distante provedor persiste.

    “O homem não pode se contentar em ser um pagador de contas”, dispara Santiago. Quando se preparava para a chegada do pequeno Samuel, ele buscava informações na internet e em outros canais, mas percebia que, em quase todas as vezes, o conteúdo era voltado para as mães. A partir dessa experiência, decidiu, ele mesmo, ser uma voz masculina para falar do tipo de paternidade em que acredita. Criou o blog Pai tem que fazer de tudo. Ele reúne mais de 70.000 pessoas em sua comunidade homônima, no Facebook, criada há um ano. “Explico que o cuidado com a criança e a proximidade com o filho são a verdadeira expressão de amor, algo que um presente ou bem material nunca vai ser”, afirma. 

    Fernando Dias com Gabi, de 2 anos, e Duda, de 5 | Foto: Gustavo Andrade

    Experiência compartilhada

    Pai de duas meninas, Gabi, de 2 anos, e Duda, de 5, o administrador Fernando Dias também se orgulha de ter dado o primeiro banho nas filhas. Ele compara a experiência que teve com a caçula e com a primogênita. Conclui que esteve mais presente no dia a dia da mais nova, já que a mãe dela viajava a trabalho e ele não tinha outra saída, a não ser se desdobrar em cuidados. “Acabou sendo algo ótimo, que recomendo hoje a outros pais”. Dias é preletor das palestras “Vou Ser Pai”, projeto idealizado por ele para dividir experiências e encorajar os homens a se disporem a participar de todas as tarefas relacionadas à criança. “Estar perto dos filhos faz criar um laço, e os frutos são colhidos enquanto eles crescem“, acredita.

    Dias faz questão de frisar que o conteúdo que compartilha é baseado em sua experiência pessoal, não profissional. “Não sou educador ou psicólogo”, ressalta. A psicóloga e terapeuta de família Claudia Puntel, entretanto, corrobora com a tese do palestrante. “Quando a criança é muito pequena, o pai precisa se esforçar para entrar no mundo criado entre ela e a mãe. Mais tarde, ele e o filho se beneficiam disso, com laços fortes”, explica. Segundo a psicóloga, é positivo o surgimento de exemplos de pais que se postam como afetuosos e próximos dos filhos. “A figura do machão, violento e solitário não faz bem para a sociedade nem para o homem”, diz. “Ao participar da vida do filho, o homem se coloca como alguém que não precisa ser um herói ou saber de todas as coisas.”

    Em 2008, quando começou a contar suas experiên cias no blog Diário Grávido, o escritor paulistano Renato Kaufmann foi um dos pioneiros a tratar do tema na internet. “Vejo com felicidade que há muito mais gente produzindo conteúdo sobre o assunto e, mais ainda, vivendo a paternidade no dia a dia”, diz. Pai de Gael (a quem se refere, nos posts, como Texugo), de 1 ano e meio e Lúcia, de 7 anos, ele faz questão de incluir, ao lado dos filhos, a enteada Maria, de um relacionamento encerrado há 5 anos, que hoje é adolescente.  

    Para ter a guarda compartilhada da primogênita, Kaufmann e a mãe dela fizeram um acordo, já que ele não se conformou em ficar com a menina apenas às quartas-feiras e em fins de semana alternados. “Esses são, geralmente, os dias estipulados pelo juiz”, afirma. “É muito pouco e não aceitei.” Ele transformou suas experiências em dois livros. O primeiro, de 2010, leva o nome do blog e o segundo, de 2011, Como Nascem os Pais.

    A psicóloga Claudia observa que, se uma criança tem pai e mãe interessados em fazer parte de sua rotina, sendo casados ou não, o ideal é que eles entrem em acordo sobre os afazeres, sempre pensando no melhor para o filho. “Isso é bom para a mulher, que não fica sobrecarregada, e para o homem, que não é excluído”, afirma. “Muitas vezes, a família dificulta o processo, com tias e avós querendo estar mais presentes do que o pai.” Nesses casos, o casal deve impor limites aos parentes. Kaufmann assegura que os pais conseguem, sim, cuidar dos filhos — embora possa haver alguns tropeços. “Às vezes a gente vai trocar a fralda da criança e descobre que esqueceu o lenço umedecido. Se vira um instante para pegar o tal lencinho e ao voltar vê que ela se sujou ainda mais, além de espalhar sujeira por todos os móveis ao seu redor”, diverte-se. “Mas dá certo, sim. Até porque os bichinhos são resistentes, e a gente vem de uma linhagem inquebrável de bebês que sobreviveram e tiveram filhos, que também sobreviveram.”

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