Por Isabella Grossi
Os gêmeos Gael e Arthur, de 6 anos: relação de “amor e ódio”, segundo a mãe da dupla, Débora Guimarães. |
Primeiro, vem o choro. Depois, infalivelmente, o grito: mãaaaaaaaae! A essa altura, qualquer um que tenha mais de um filho já sabe que a brincadeira acabou em briga. Irmãos competem, e isso não é raro. Muito pelo contrário. “É algo natural entre os seres humanos, e as desavenças surgem por vários motivos, dos mais irrelevantes aos importantes, mesmo. Todos têm diferenças”, explica a psicóloga e psicoterapeuta Maria Luíza Rocha de Andrade. Para ela, no entanto, é preciso entender o que os pequenos estão buscando com aquele comportamento. “Além da personalidade, e da vontade de querer irritar o outro, pode ser ciúme, disputa por atenção ou medo de perder o lugar para o irmão que veio depois, por exemplo.” E não adianta achar que é possível passar ao largo dos confrontos. De acordo com a jornalista americana Ashley Merryman, coautora do best-seller Os 10 Erros Mais Comuns na Educação de Crianças, uma das estrelas do II Seminário Internacional de Mães, realizado no dia 4 de junho (veja reportagem na pág. 38), a média de conflitos entre irmãos de 3 a 7 anos é de 3,5 vezes por hora. Isso mesmo: por hora! “Em muitos relacionamentos fraternos, a frequência dos conflitos pode ser grande, mas os momentos de diversão no quintal e no quarto servem de compensação. Esse saldo positivo é que leva a um bom relacionamento quando adultos”, diz Ashley.
Pôr limites é dever dos pais, principalmente quando existe uma ameaça real à integridade física ou psicológica de uma das partes. Mas qual a melhor maneira de fazer isso? “O ideal é construir uma família democrática, baseada no diálogo”, afirma Maria Luíza. “Tentar, desde sempre, compreender os motivos e fornecer subsídios para que as crianças resolvam os confrontos entre si.” Pare, pergunte e ouça com atenção. Dessa forma, é possível captar a mensagem e evitar — ou, pelo menos, amenizar — confrontos futuros. De acordo com a psicóloga, se essa atitude for adotada desde cedo, a punição, inclusive, será cada dia menos necessária. “E quando não houver jeito, o melhor é punir todos os que estão envolvidos. Se a briga é por causa do game, ele fica suspenso até que cheguem a um acordo.” Nesta e nas próximas páginas, leia casos de irmãos que adoram uma confusão — e como seus pais lidam com isso.
Bernardo, Rafael e Henrique, de 7 anos: provocações constantes |
Espelho, espelho meu
Foi só os gêmeos Gael e Arthur completarem 5 anos que a vida da dona de casa Débora Caram Guimarães, de 38 anos, virou do avesso. As triviais brigas deram lugar a confrontos violentos, motivados, geralmente, pela disputa por brinquedos. “Dia desses, o Arthur deu um soco na boca do Gael e começou a sair sangue. Depois, jogou uma caixinha de bala no olho dele e deixou um roxo e um galo”, lembra a mãe. A confusão entre os pequenos, hoje com 6 anos, é tão grande que até a caçulinha, Analu, de 1 ano, já entrou no meio. “A cadeirinha dela fica entre eles no banco de trás do carro e, quando eles começam a brigar, ela vai para cima, grita e puxa o cabelo.” Débora e o marido, o engenheiro Gustavo Yamagata, de 37 anos, já tentaram de tudo. Cortar videogame, dar chinelada e fazer a duplinha ficar abraçada, pedindo desculpas. O que eles mais odeiam, no entanto, é o tal do castigo. “Eles detestam ficar separados. É engraçado porque eles brigam o tempo todo, mas são gêmeos, não conseguem ficar longe um do outro”, diz. “É uma relação de amor e ódio”, interpreta a mãe, cuja única preocupação é que os filhos comecem a brigar fora de casa, com os amigos. “Tirando isso, sei que eles ainda vão se engalfinhar, igual filhote de cachorro, por muito tempo.”
Trio maravilha
Mesmo quando a administradora de empresas Tatiana Cantagalli de Oliveira, de 40 anos, compra três bolas iguais para os filhos trigêmeos, Bernardo, Henrique e Rafael, de 7 anos, ela sabe que vai ter briga. “Chega a ser engraçado, eles disputam tudo, brinquedo, atenção, quem é o melhor, de quem é a vez, tudo”, conta. A provocação é constante, embora a mãe e o pai, o fisioterapeuta Douglas José da Silva Michel, de 39 anos, façam vista grossa quando acham conveniente. “Sempre damos a chance de tentarem resolver os conflitos por conta própria, intervimos apenas quando não há acordo ou se passa para a briga física ou ofensas”, diz Tatiana. O objetivo é fazer com que os filhos encarem as divergências e saibam lidar com sentimentos como ciúme, rivalidade, inveja e frustração. “Eles precisam aprender a se defender, a dividir, a esperar e, principalmente, a praticar o autocontrole.
Rafael, de 7 anos, e Giovanna, de 3: “Ela atiça e ele não gosta”, conta a mãe, Vanessa Rayol |
Acho que a briga entre irmãos ajuda nisso.” Quando a baderna passa dos limites, todavia, é hora é dar um basta. Na maioria das vezes, os pais fazem cada um deles perder a vez nas brincadeiras para pensar no ocorrido. “A atitude mais extrema, eu acho, foi colocar pimenta na boca. Nem preciso dizer que não funcionou, e ainda acabou virando piada”, lembra a administradora de empresas.
Toma lá dá cá
Rafael, de 7 anos, nunca foi de dar muito trabalho aos pais, a publicitária Vanessa Carneiro Rayol e o administrador Alexandre Gatti Lages, ambos de 40. Até que nasceu sua irmãzinha, a pequena Giovanna, hoje com 3. “Ele implica com ela o dia inteiro”, relata a mãe. A culpa, na maioria das vezes, não é só do primogênito. “Eles têm quarto separado, mas ela não sai do quarto dele, mexe nos brinquedos, entra na frente da TV, quer brincar junto”, esclarece. “Ela atiça e ele não gosta.” O resultado, quase sempre, é uma briga tremenda, que só chega ao fim quando o casal promete cortar (e corta!) as regalias, caso da TV e do iPad — embora a caçula ainda não tenha entendido muito bem como funciona o castigo, e continue espezinhando. Vanessa, que largou o trabalho para dedicar 100% do tempo aos filhos, sofre com a falta de afinidade dos irmãos, e já até pensou em consultar um especialista. “Eu fico o dia inteiro com eles, e acabo perdendo um pouco a paciência”, revela. “Hoje consigo lidar melhor com a situação, mas eu me estressava muito, brigava em vez de conversar e, com isso, achava que quem precisava de ajuda era eu.”
Theo, de 2 anos, e Lara, de 4: apesar das brigas, se a mãe dá bronca em um, o outro sai na defesa. |
Um é pouco, dois é bom
Toda vez que Lara, de 7 anos, e Theo, de 2, começam uma peleja na frente da mãe, a psicóloga Christiane Abras Bampi, de 38 anos, ela é enfática. “Vocês são irmãos, têm de encontrar uma solução”, repete. “Se não encontrarem, eu entro. E, se eu entrar, vocês dois vão perder.” O conselho parece surtir efeito. Apesar de, vira e mexe, promoverem suas desavenças, geralmente para chamar a atenção ou porque desejam o mesmo brinquedo, os pequenos nunca entraram numa briga feia. “É sempre uma implicância boba”, diz. “A Lara não come feijão, por exemplo, aí o Theo senta ao lado, pega uma colher e põe o feijão no prato dela.” Quando o confronto passa dos limites, e a mãe ou o pai, o corretor de seguros Guilherme Villas, de 42 anos, precisam colocar um ponto-final na marra, a duplinha mesmo se encarrega do mea-culpa. “Não rende muito, eles saem de cena. O que se sente prejudicado vai para o quarto e fica lá”, afirma. “Eu mesma nunca tive que colocar nenhum deles de castigo”, reconhece. Tirando os momentos de rixa, os irmãos passam a maior parte do tempo em harmonia. “Se eu chamo a atenção do Theo, a Lara já corre para o acolher. Ela sente dó e quer ajudar. Com ela, é a mesma coisa”, revela. “Posso estar errada, mas acho que, no futuro, a tendência é brigarem menos”, prenuncia a mãe.
7 dicas para amenizar os conflitos dentro de casa#1 ESTIMULE A AMIZADE ENTRE OS FILHOS >> Ensine o caminho ético o mais cedo possível. A empatia, a aceitação, o respeito às diferenças e a solidariedade. Para isso, é claro, é preciso acreditar no que se diz, porque a melhor maneira de educar é por meio do exemplo, e não do discurso.
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