Por Cristina Moreno de Castro
Quando a primogênita Anabel estava prestes a nascer, Chaps Melo e Ivana de Souza fizeram o que todos os pais fazem: pensaram com carinho na decoração do quarto da bebê. Ela deu ideias, que ele transformou em desenhos e, em uma semana, o tema circense estava pronto, com direito a picadeiro, nuvens no céu e um apresentador de terno, cartola, sorriso bonachão e um imenso bigode laranja no rosto.
O casal não fazia ideia que estava dando vida ao que viria a se tornar um dos principais personagens infantis do país, exatos sete anos mais tarde. O bigodudo em questão foi depois batizado de Bita e seu “Mundo Bita” já possui quatro DVDs (com disco de ouro pela Sony Music), está na grade do Discovery Kids e da Netflix, tem espetáculos teatrais, shows e produtos licenciados, aplicativos e seu maior trunfo: mais de 700 milhões de visualizações no YouTube.
O carro-chefe da produtora Mr. Plot, sediada no Recife, se tornou concorrente de pesos-pesados do segmento 0 a 6 anos, como Galinha Pintadinha, Patati
Patatá e o veterano Palavra Cantada. Neste ano, vai alçar voos maiores: além do quinto DVD, “Bita e a Natureza”, que já vem sendo divulgado, com uma música inédita por mês no Youtube, a marca “Mundo Bita” também está em fase de pré-produção de uma série em dramaturgia, com episódios de 5 minutos, prepara novos aplicativos, e uma versão em espanhol dos clipes musicais, para tentar atingir o mercado externo.
Mas nada disso aconteceu de repente. “Estamos colhendo os primeiros resultados financeiros e atraindo atenção das grandes marcas só agora”, revela o diretor de criação Chaps Melo, 36, em entrevista à Canguru. A Mr. Plot nasceu, em 2011, para ser uma empresa de tecnologia, com a ideia de produzir aplicativos educativos para crianças. O bonachão Bita entrou como personagem de um desses apps, mas o negócio não dava lucro. Foi só quando a equipe resolveu inserir um clipe musical ao “Bita e os Animais”, em 2013, que o personagem descobriu a que veio. O clipe bombou no Youtube, e logo foi firmado contrato com a Discovery Kids e a Sony Music, que encomendou um primeiro DVD feito às pressas. “A Mr. Plot nasceu para ser de tecnologia, não de economia criativa, não de audiovisual. Nasceu de uma forma e nos descobrimos de outra por acaso”, resume Chaps.
Ele se tornou o sócio responsável pelas músicas. Filho de professora de piano, o empresário só tinha tocado em bandas por hobby, mas começou a compor letras e canções para o repertório do “Mundo Bita”, com arranjos de Walman Filho. É ele também quem faz o vocal de “s” puxado – em parte por sua origem carioca, em parte por seu sotaque já forte de Pernambuco, onde mora há 19 anos.
As letras são o ponto forte dos clipes de Bita. “Cozinheira de ideias, costureira de sonhos, onde se fabrica o pensamento. (…) E ela é rainha, comanda e desmanda e o corpo da gente obedece bem. Ouça e obedeça que a cabeça vai mandar” – diz a música “Onde é que se fabrica o pensamento”, do DVD “Bita e o Corpo Humano”. A canção “Ela e Ele” prega direitos iguais a meninos e meninas: “Garota, garoto, espelho do outro, somos diferentes demais. Menino, menina, respeito e estima, nós temos direitos iguais.” Os versos não se repetem exaustivamente, como em algumas canções infantis: as letras
são longas, com rimas não muito óbvias, e acompanhadas por ritmos que trafegam pelo rock, samba e country. “No começo recebíamos críticas de que as letras eram muito complexas para crianças, mas vinha dos pais, não dos pequenos. A gente não trata a criança como um bobinho. Comunicamos com a criança como uma pessoinha, que vai entender, vai processar aquilo e transformar em alguma coisa”, diz Chaps.
Os temas tratados pelas canções vão desde coisas corriqueiras, do dia a dia, como a escovação de dentes (“Xic, Xic, Xic”), até, na letra de “A Diferença É o que nos Une”, o respeito às outras crianças que têm necessidades especiais. A equipe da Mr. Plot tem mais liberdade ao criar os clipes com temas mais simples, mas tem que discutir mais a fundo os conteúdos que podem gerar alguma polêmica. A esposa de um dos sócios, que é pedagoga, é uma das
principais procuradas nessas horas. Para a canção “A Diferença é o que nos Une”, o grupo buscou consultoria da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente), que acompanhou não só a criação da letra, mas também da animação. “Queríamos que eles vissem se, na nossa ignorância, tínhamos feito algo que pudesse ferir sem intenção”, diz Chaps. “A gente procura ser bem caxias, para o conteúdo realmente engrandecer a criança, não
ser apenas um conteúdo vazio.”
Assim como as letras, os desenhos também são politicamente corretos e educativos. Bita ganhou a companhia das crianças Lila (loira), Dan (negro) e Tito (ruivo), que têm personalidades próprias. Os pequenos estão sempre alegres, são educados, se respeitam, brincam juntos tanto de boneca quanto de dragão. Mesmo assim, o conteúdo também é alvo de críticas: já teve gente questionando o Bita por abordar “esse negócio de gênero”, já teve corrente religiosa radical vendo mensagem subliminar nos clipes ou pais interpretando errado algum trecho de música. “Mas a gente nunca se atrita com o público. Se não agrada, pode agradar em outra canção. Só queremos passar nossa mensagem positiva.”
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