Por Gabriela Willer
Escrever é expressar o sentimento do que foi vivido, imaginado e que transbordou em palavras. É também superação, força e compreensão. A carta é uma das práticas mais antigas de se comunicar, assumindo tom confessional, genuíno e carinhoso. Quando são mães que escrevem aos seus filhos, destinam relatos sensíveis e emocionantes, carregados de amor, afeto e um gigantesco sentimento de bem-querer. Os textos não só ficarão de legado e aprendizado aos rebentos, mas também dizem muito sobre as dores, as dificuldades, os anseios, os medos, as alegrias e a incrível transformação dessas mulheres como mães.
São inúmeras as necessidades afetivas que fazem das cartas um instrumento de apoio e até de superação. Uma das pioneiras na arte de transbordar suas emoções em relatos endereçados ao filho é a mineira, publicitária e escritora Cris Guerra. Ela perdeu o companheiro Guilherme dois meses antes do nascimento de Francisco, fruto do amor do casal. Ao mesmo tempo em que vivia a imensa tristeza da viuvez, sentia o pulsar de uma nova vida dentro dela. Precisou escrever para entender emoções tão díspares e simultâneas. E foi assim, em 2007, que criou o blog Para Francisco, que, no ano seguinte, virou livro e agora está sendo adaptado para o cinema.
No blog dedicado ao filho, que completou 10 anos, Cris fala sobre o pai de Francisco, discorre sobre episódios prosaicos e saborosos, como o primeiro café da manhã junto com Guilherme, além de trazer o lado carinhoso e cuidadoso do companheiro e suas emoções diante da paternidade. Claro, não faltam belíssimas declarações de amor, como esta dedicada ao filho: “Ainda não acredito no milagre de haver você na minha vida. Agradeço como quem acaba de parir. Você nasce todos os dias quando o vejo acordar. E a dor de ser mãe me desperta cada músculo na busca de um dia melhor”.
A nova edição do livro Para Francisco, de Cris
Guerra, será lançada neste mês pela Editora
BestSeller. Comemorando o aniversário, Para
Francisco (Edição Especial – 10 Anos Depois)
acrescenta cartas escritas após o lançamento
do primeiro livro, além de outras surpresas.
“Trouxemos um olhar de alegria para o tempo
que transforma as nossas dores e sempre nos
surpreende”, diz Cris Guerra.
Crise existencial
A gravidez não planejada e toda a mudança que ela traria na vida de Carynne Oliveira, de 20 anos, foram decisivas para que a estudante de jornalismo carioca começasse a escrever cartas ao filho Renato Augusto. Nelas, estão relatos íntimos sobre como enfrentou o momento da gestação, assim como as dificuldades e os prazeres que viveu e vive com o bebê, de 8 meses. “Passei por uma crise existencial, não sabia se seria uma boa mãe, como me adaptar à nova realidade, e aí me veio a ideia de escrever”, conta Carynne, que já tem pelo menos 15 cartas concluídas. Ela diz que pretende continuar registrando cada momento vivido e deixar sua experiência para as diferentes gerações da família. “A memória no futuro tende a falhar, e essas cartas também ajudarão a contar a nossa história”, diz.
Para a paulista Paola Rodrigues, redatora e roteirista de 24 anos, a escrita para a filha surgiu como uma tentativa de compensar a falta de diálogo que ela própria vivia, quando era criança, com sua mãe. No final de 2013, começou a escrever para a filha Helena, que hoje já tem 4 anos. “Escrevo para que minha filha conheça uma mulher que, talvez, daqui a 20 anos, nem exista, para que saiba um pouco dessa história, das coisas que aprendi e vivi e, quem sabe, tire algum conselho dali”, explica Paola, que possui um blog chamado Cartas para Helena, com mais de 100 mil visualizações e quase 6.000 seguidores em sua página no Facebook.
Através das cartas, Cris, Carynne, Paola e tantas outras mães decidiram se conectar e passar mensagens de amor e cuidado para os pequenos que, ao longo do tempo, vão entender que a utopia da perfeição das mães, sem erros ou falhas, abre espaço para outras definições.
Em vez de cartas, e-mails
Desde 2002, o site FutureMe ajuda aquelas pessoas que querem enviar e-mails para o futuro. É uma maneira de mães e pais do presente conversarem com eles próprios (ou com os filhos, companheiros, amigos etc.) no futuro. Acesse www.futureme.org e faça o teste!